sexta-feira, 21 de agosto de 2009

Em um passado, já um tanto quanto distante, fui um militante de esquerda. Atuei no movimento estudantil e em uma Organização Não Governamental, sempre representando as organizações de esquerda onde atuava. Na metade da década de 90, cansado de dar "murros em ponta de facas", deixei a militância sendo, claro, acusado de "traidor da causa". Entendo bem o sentimento de "sentir vergonha" que alguns petistas têm, tardiamente diga-se de passagem, manifestado. Sentia, sim, vergonha de ter feito parte de organizações que repetiam enfaticamente os erros dos que elas diziam combater. Clóvis Rossi define bem essa questão em seu artigo de hoje (21 de agosto de 2009) na Folha de São Paulo.

Do orgulho à vergonha - CLÓVIS ROSSI

SÃO PAULO - Durante a campanha eleitoral de 1989, esta Folha recebeu em almoço todos os principais candidatos. Menos, salvo erro de memória, Fernando Collor, no que se revelaria uma profilática premonição do jornal.

Quando já terminava o almoço com Luiz Inácio Lula da Silva, o candidato do PT pousou o braço sobre os ombros de Octavio Frias de Oliveira, o "publisher", morto em 2007, e disse: "Frias, você ainda vai se orgulhar desse petezinho", como se o anfitrião fosse PT desde criancinha. Não era, claro, mas nunca escondeu seu respeito pelo que considerava padrão ético do partido.

Vinte anos depois, a profecia de Lula revela-se tão falsa como era equivocada a crença do "publisher" desta Folha. Hoje, até um petista como o senador Flávio Arns diz sentir "vergonha", não orgulho, desse "petezinho".

Aliás, "petezinho" é expressão adequada, pelo nanismo ético e moral de sua camada dirigente, que deve ter contaminado boa parte da militância, talvez toda ela, a julgar pelo silêncio ensurdecedor a respeito do espetáculo de pouca vergonha que marca o PT. De quebra, ainda há o nanismo intelectual dos acadêmicos petistas, incapazes de abrir a boca, embora um deles tenha escrito, na esteira do "mensalão", que não mais admitiria nem sequer o sumiço de um alfinete do Palácio do Planalto.

Nada disso, no entanto, surpreende. Os intelectuais petistas se masturbaram com a debiloide teoria da conspiração para explicar os pecados do partido, mesmo ante a contundente evidência de que a única conspiração era a dos fatos. O que na verdade surpreende é a surpresa do senador Arns. Deveria ter sentido "vergonha" quando a direção do seu PT foi chamada de "organização criminosa" pelo então procurador-geral da República. Tudo o que veio depois é até café com leite.

quarta-feira, 19 de agosto de 2009

O BRASIL EXPLICADO EM GALINHAS

Veríssimo, sempre ele, consegue explicar o Brasil de forma bem mais eficiente que muito intelectual. É bem engraçado, mas, infelizmente, este é o Brasil. Qualquer ladrão de galinha consegue virar uma pessoa influente. Note, que chega um momento do texto que não mais sabemos quem é o delegado e quem é o ladrão.

O BRASIL EXPLICADO EM GALINHAS!! Luis Fernando Veríssimo.

Pegaram o cara em flagrante roubando galinhas de um galinheiro e o levaram para a delegacia.

Delegado: Que vida mansa, heim, vagabundo? Roubando galinha para ter o que comer sem precisar trabalhar. Vai para a cadeia!

Ladrão: Não era para mim não. Era para vender.

Delegado: Pior, venda de artigo roubado. Concorrência desleal com o comércio estabelecido. Sem-vergonha!

Ladrão: Mas eu vendia mais caro.

Delegado: Mais caro?

Ladrão: Espalhei o boato que as galinhas do galinheiro eram bichadas e as minhas galinhas não. E que as do galinheiro botavam ovos brancos enquanto as minhas botavam ovos marrons.

DelegadoNegrito: Mas eram as mesmas galinhas, safado.

Ladrão: Os ovos das minhas eu pintava.

Delegado: Que grande pilantra... (mas já havia um certo respeito no tom do delegado). Ainda bem que tu vai preso. Se o dono do galinheiro te pega...

Ladrão: Já me pegou. Fiz um acerto com ele. Me comprometi a não espalhar mais boato sobre as galinhas dele, e ele se comprometeu a aumentar os preços dos produtos dele para ficarem iguais aos meus. Convidamos outros donos de galinheiros a entrar no nosso esquema. Formamos um oligopólio. Ou, no caso, um ovigopólio.

Delegado: E o que você faz com o lucro do seu negócio?

Ladrão: Especulo com dólar. Invisto alguma coisa no tráfico de drogas. Comprei alguns deputados. Dois ou três ministros. Consegui exclusividade no suprimento de galinhas e ovos para programas de alimentação do governo e superfaturo os preços.

O delegado mandou pedir um cafezinho para o preso e perguntou se a cadeira estava confortável, se ele não queria uma almofada. Depois perguntou:

Delegado: Doutor, não me leve a mal, mas com tudo isso, o senhor não está milionário?

Ladrão: Trilionário. Sem contar o que eu sonego de Imposto de Renda e o que tenho depositado ilegalmente no exterior.

Delegado: E, com tudo isso, o senhor continua roubando galinhas?

Ladrão: Às vezes. Sabe como é.

Delegado: Não sei não, excelência. Me explique.

Ladrão: É que, em todas essas minhas atividades, eu sinto falta de uma coisa. O risco, entende? Daquela sensação de perigo, de estar fazendo uma coisa proibida, da iminência do castigo. Só roubando galinhas eu me sinto realmente um ladrão, e isso é excitante. Como agora fui preso, finalmente vou para a cadeia. É uma experiência nova.

Delegado: O que é isso, excelência? O senhor não vai ser preso não.

Ladrão: Mas fui pego em flagrante pulando a cerca do galinheiro!

Delegado: Sim. Mas, primário, e com esses antecedentes.....

quarta-feira, 5 de agosto de 2009

Paradoxalmente, surgiu uma vantagem, para a sociedade, desse processo autofágico que os senadores iniciaram desde que Sarney, com a firme contribuição de Lula e do PT, enfiou de goela abaixo sua candidatura a presidência do senado. Nessa luta para destruirem uns aos outros vão surgindo algumas verdades enterradas nos porões do Congresso Nacional.
Pedro Simon revelou, sem meias verdades, como se deu o processo (ilegal e ilegítimo) que levou Sarney tornar-se Presidente da República. A entrevista deixa bem claro que quem deveria assumir a presidência, devida a morte de Tancredo, era Ulysses Guimarães e não José Sarney. Isso só aconteceu porque os militares, sempre eles, interviram.


JORNAL O ESTADO DE SÃO PAULO - Quarta-Feira, 05 de Agosto de 2009.

http://www.estadao.com.br/estadaodehoje/20090805/not_imp413697,0.php

Leandro Colon, BRASÍLIA

Depois do embate com Fernando Collor (PTB-AL) em plenário anteontem, o senador Pedro Simon (PMDB-RS) afirmou que não reagiu porque ficou preocupado com o olhar do colega fixo nele o tempo todo. Collor disse a Simon para "engolir" as palavras.
Em entrevista ao Estado, Simon voltou a criticar o presidente José Sarney (PMDB-AP). Afirmou ainda que ele deu um "golpe" para assumir a Presidência da República em 1985. E provocou Renan Calheiros (PMDB-AL). "Renan é a faixa mais negra da história deste Congresso."

O senhor não reagiu aos ataques do Collor. Por que o silêncio?
Eu fiquei preocupado, com medo do olhar dele, da tensão que ele estava na primeira fila. Eu não tinha falado nada dele, mas do Renan, que já foi líder dele. Mas o Collor já entrou com aqueles olhos esbugalhados. E eu pensei: não vou entrar nessa. Mas ele disse que tem coisas em relação a mim, e que vai dizer quando quiser. Vou cobrá-lo.

Por que o senhor não fez o discurso na presença de Sarney?
Eu pensei que ele ia ficar em plenário, mas ele saiu antes de eu me manifestar.

Então por que não aproveita quando ele estiver em plenário e pede novamente sua saída?
Já fiz isso. E já tenho a resposta de que ele não vai sair. Ele tem o apoio do Lula. O Lula é o homem da intimidade de Renan, Sarney e Jader Barbalho. Dois renunciaram à presidência do Senado e outro (Sarney) está nesta situação.

O senhor se sentiu humilhado em plenário?
Como vou me sentir humilhado por esses cidadãos? Quem são eles? O que eles representam? O que passou e que não tinha que voltar. Um passado triste. Renan é a faixa mais negra da história deste Congresso. Collor é uma pessoa que sofreu uma cassação.

O Renan fez a ligação do senhor com uma empresa chamada Porto do Sol. O que é Porto do Sol?
É uma empresa cópia do Banco do Povo de Bangladesh, é uma grande entidade no Rio Grande do Sul. Num período, um filho meu, em nome do governo, foi diretor do banco, que dá dinheiro pequeno para microempresa. Mas não há irregularidade.

Onde começou sua desavença com o presidente Sarney?
Quando fui contra a candidatura dele à Vice-Presidência da República. O Tancredo Neves estava no quarto do hospital de Base, em 14 de março de 1985 (um dia antes da posse), perguntamos o que fazer ao dr. Ulysses Guimarães. E chegou o general Leônidas (ministro do Exército, levado por Sarney). O general disse que Sarney deveria assumir. Eu comecei a falar e dr. Ulysses não deixou eu falar e confirmou o Sarney. Aí foram embora Sarney e o general. Nós ficamos no quarto, e dr. Ulysses disse que estava tudo preparado há meses e que o general Leônidas estava comandando tudo. E o Sarney assumiu.

O senhor disse que foi um golpe?
Sim, um golpe, claro que foi. Deu golpe e virou presidente. E nós calamos a boca. O Tancredo não tinha assumido, não era presidente. Quem tinha de assumir era o presidente Congresso.

terça-feira, 4 de agosto de 2009

Este artigo ficou muito bom. No entanto, é preciso atentar para os perigos de se fazer afirmações como: “Atos e palavras mostrando o quanto o Senado se torna inútil” e “todos afundando juntos”. Tão ruim quanto ter um Congresso como o nosso é não ter Congresso algum. Diria mesmo que é pior, pois a pretensão é evoluir a partir do que temos e não retroceder para um tempo de autoritarismo. Se o Congresso é inútil, só resta fechá-lo – eis o problema: vamos fechá-lo? E o que vamos colocar no lugar dele? Um ditador incorruptível?

São Paulo, terça-feira, 04 de agosto de 2009

ELIANE CANTANHÊDE

"Firmíssimo"

BRASÍLIA -
Como estava escrito nas estrelas, o fim do recesso e o reinício dos trabalhos do Senado providenciaram um triste espetáculo para a opinião pública. Mais um.
Antes, atos secretos. Agora, palavras explícitas. Atos e palavras mostrando o quanto o Senado se torna inútil, inchado de funcionários, caríssimo na sua distribuição de favores e agora palco de agressões e de revisão da história.

Sentado solenemente na presidência, José Sarney assistiu a parte da sessão, enquanto sua tropa de choque recuperava velhas histórias para distribuir agressões e insinuações aos que insistem na renúncia. Em vez de presidir uma instituição, preside uma guerra que tende a se transformar numa guerra de pizzas.

Renan Calheiros, que não tem muito a perder depois de meses de pressão, da renúncia melancólica e da volta pelas urnas, é não apenas o líder da reação para manter Sarney na presidência que já foi sua e lhe escapou pelas mãos. É também o autor do script "bateu, levou".

Aliás, ao lado de Fernando Collor, outro que também já passou por tudo isso e aproveitou a confusão para apresentar ao vivo e em cores a sua versão de que tudo o que gerou CPI, renúncia e caras-pintadas, 15 anos atrás, foi uma farsa "urdida nos subterrâneos".

Renan luta para sobreviver e se agarrar à importância que, em simbiose com Sarney, ainda tem no PMDB e nos caminhos do partido em 2010. Collor luta para renascer de fato e lavar sua biografia para além dos limites de Alagoas.

A novidade no quebra-quebra de ontem é que Pedro Simon, que sempre jogou a pá de cal em cargos e mandatos moribundos, desta vez não pôde brilhar sozinho. Enfrentou duras reações, atrapalhou-se mais de uma vez, cansou.

Cristovam Buarque no seu novo papel de acusador, Wellington Salgado se destacando como defensor, Mão Santa com ar de sono presidindo o final da sessão. Tudo surreal. E todos afundando juntos.