Há alguns dias postei a coluna Devolvam meu São João onde externava minha tristeza ao
constatar que o São João de Campina Grande, que já foi o melhor do mundo, não existe
mais. Afirmei que o Parque não mais pertence ao povo e critiquei a administração
municipal por ter permitido “que uma empresa montasse uma casa de shows fechada
no lugar do arraial que tínhamos”. Falei, indignado, que o São João é nosso patrimônio
imaterial e “que ninguém pode adulterá-lo dessa forma arrogante visando atender
interesses particulares”.
Como no Brasil nada é tão ruim que não possa piorar, o prefeito Romero
Rodrigues anunciou que vai “buscar solução para o São João de 2018”. Mas, qual
seria o problema que estaria enfrentando o São João? Segundo o prefeito, o “Parque
do Povo não comporta mais o evento”. Mas, o Parque do Povo não vem comportando o
São João a 34 anos? Porque de um ano para o outro deixou de comportar? O que
ocorreu em 2017 que não mais permitiria que nossa festa maior coubesse em seu
palco tradicional? Segundo o prefeito, o “Parque do Povo se tornou pequeno,
congestionou as ruas. Se a gente conseguisse uma área central maior que o Parque,
seria ideal, porque a festa tem que crescer ainda mais”.
O prefeito não disse a quem interessam as soluções. Se a prefeitura, sua
administração e seu partido, se ao povo, se aos comerciantes e empresários da
cidade ou se a empresa que gerenciou a festa através de uma parceria
público-privada, eufemismo para o termo privatização. O modelo de evento promovido
pela tal empresa, que “comprou” nossa tradição e direitos culturais, não cabe
no Parque do Povo porque ali ela não terá o lucro exorbitante que almeja.
Simples assim!
Existe uma questão legal
que é o fato do Parque do Povo ser um BEM PÚBLICO e não poder ser
temporária ou definitivamente privatizado. Infelizmente, muitos campinenses
ainda não se deram conta disso! A prefeitura parece querer se antecipar às questões
jurídicas, que por certo enfrentará, caso leve a frente essa sandice de
privatizar totalmente o São João. É por isso que busca “soluções” para os
supostos problemas aventados. Além disso, que destino se dará ao Parque do Povo
no caso do São João ser levado para outra área da cidade? Fosse eu do ramo da
especulação imobiliária responderia essa pergunta? Claro, que não!
O prefeito falou em
congestionamento das ruas, citando que ele mesmo demorou mais de uma hora para
chegar ao Parque do Povo, e que portões (da casa de shows erguida no lugar do “Forródromo”)
tiveram que ser fechados. Ora, congestionamentos temos todos os dias – é uma
realidade nossa. Os portões foram fechados porque houve uma limitação da livre
circulação da população no Parque do Povo, já que o espaço público foi
delimitado para o uso de camarotes, cercas e o equipamento, utilizado por
patrocinadores, estranho a festa popular.
Temos que fazer mudanças em nosso São João. Por isso me juntei ao
movimento “#Devolvam meu São João”, pois o que temos no Parque do Povo não é
mais uma festa junina. Assim, transcrevo abaixo o texto do arquiteto e
urbanista campinense Marcus Vinícius Dantas que sempre nos traz bons argumentos para nossas
polêmicas municipais, a exemplo de quando a Prefeitura ergueu o monstrengo dos “150
anos de Campina Grande”. A propósito, Marcus Vinícius lançou o livro “Quem te
vê não te conhece mais – Arquitetura e transformação na cidade de Campina
Grande, 1930-1950” pela Editora da Universidade Federal de Campina Grande. A obra
trata das mudanças sofridas pela cidade e como “investidas do poder público e
da iniciativa privada romperam com formas anteriores de produção e uso da cidade
instaurando novas estéticas...”.
"Tudo tão previsível! Faz anos que estão
criando dificuldades para vender facilidades. E é óbvio que já têm a solução.
Só precisam melhorar os argumentos para a remoção. Esse do congestionamento,
usado para tudo, não se sustenta. Perguntas:
1) Será que o São João de Campina Grande precisa “crescer ainda mais”?
2) Caso sim, esse crescimento precisa ocorrer em que aspectos? Incentivo
a quadrilhas, trios de forró, artistas da região, culinária, artesanato,
arraiais de bairro e demais manifestações culturais locais? Ou incentivos a
mega shows, CAMAROTIZAÇÃO do espaço público e atrações vinculadas às grandes
empresas do show business nacional? Não foi exatamente a adesão a essa
segunda opção que gerou o dito “estrangulamento” do parque? Porque, para
isso, só o infinito resolve a “falta” de espaço.
3) Qual a dimensão pública que a prefeitura imagina para a festa, como
manifestação cultural que se tornou um dos traços da identidade local?
4) Vale a pena abrir mão de um lugar que, por anos, recebeu
investimentos públicos justamente para a realização desse evento? Com a
privatização da festa ocorrida este ano, quem faria os investimentos para a
construção de um novo espaço? E o que fariam do Parque do Povo caso deixe de
receber o São João? Quais outros interesses existem para aquela região da
cidade?
5) Campina Grande não teria outras prioridades para receber a atenção e
os recursos públicos?
6) Vale a pena abrir mão da história e das memórias
construídas ao longo do tempo no Parque do Povo? O Parque do Povo não é um
dos elementos constituintes da identidade do Maior São João do Mundo? Talvez,
esteja errado. E o tempo pode me mostrar o contrário. Mas, a partir de hoje,
acho que tirar o São João do Parque do Povo é um tiro no pé. Senhor Prefeito,
não é só uma questão de “congestionamentos” e quantidade$. Muitas outras
questões estão vinculadas”.
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