sexta-feira, 18 de dezembro de 2015

Heróis de uma Revolução Anunciada ou Aventureiros de um Tempo Perdido?


Muito em breve lançarei “Heróis de uma Revolução Anunciada ou Aventureiros de um Tempo Perdido? A atuação das organizações de esquerda em Campina Grande – 1968/1972”, pela Editora da Universidade Estadual da Paraíba (EDUEPB). O lançamento será após o carnaval para seguir a tradição de que o ano só se inicia, de fato, após aqueles dias em que levamos tão a sério a arte de ser brasileiro. Este é meu primeiro livro, fruto das pesquisas que desenvolvo desde 1997, sobre o comportamento politico das organizações de esquerda que lutaram contra a ditadura militar e a relação delas com a democracia politica. Abaixo um pequeno trecho do livro, a título de aperitivo:



“Mas, será mesmo que os militantes das organizações revolucionárias, que reagiram armados à opressão imposta pela ditadura militar, foram tão impulsivos assim? Podemos aceitar passivamente que uma pessoa tenha deixado sua vida “legal”, para reagir às infâmias, unicamente pelo ímpeto revolucionário, ou pelos estímulos e incitamentos que a década de 1960 oferecia? Satisfaz chamar esses atores políticos de “aventureiros”? Será que não poderemos ter uma explicação política racional para as atitudes da época? Será que só poderemos tratá-los como aventureiros de um tempo perdido, “apenas no grau superlativo” como nos diria Charles Dickens? Ou então, para sermos condescendentes com a boa vontade deles, vamos chama-los de heróis de uma revolução anunciada, bem ao estilo das ideias de Lênin e Che Guevara que diziam caber ao comunista apressar o que é inexorável e inevitável? Aceitaremos a racionalização de que os tais atos heroicos eram irremissíveis, que a revolução iria acontecer de qualquer maneira? Ou seja, ela estava posta, era enunciada por algum tipo de força superior. Dessa forma, uma vez anunciada, caberia ao militante coloca-la em prática com seu heroísmo?”.


quarta-feira, 16 de dezembro de 2015

Quando eles cruzam o Rubicão – Parte III



É já é hora de explicar porque trato o processo de impeachment como golpe, considerando que ele é previsto e regulamentado na Constituição Federal. É que o impeachment só se justifica se houver o chamado crime de responsabilidade, i.e., as violações do dever legal cometidas por agentes políticos. Até aqui não se pode apontar, a oposição assume isso, crimes de responsabilidades no atual mandato de Dilma Rousseff. E é sempre bom lembrar que as tais pedaladas fiscais deixaram de existir quando o Congresso Nacional aprovou a nova meta fiscal. Se não há crime de responsabilidade, não pode haver impeachment, portanto as tentativas de se apear Dilma do seu cargo não passam de golpes com uma carapaça constitucional.


Para o jornalista Mário Magalhães, num artigo publicado no site UOL/Folha em 03 de dezembro, as alegações pró-impeachment desprezam a soberania popular ao negligenciarem o resultado das urnas de 2014. Gosto sempre de lembrar que o Senador Aécio Neves perdeu a eleição por uma exata diferença de 3.459.963 votos e que ele deixou de ser eleito presidente da República por ter perdido em seu próprio estado onde governou por dois mandatos consecutivos. Magalhães afirma claramente: “A Carta exige crime de responsabilidade para expulsar um presidente. Foi o que aconteceu com Collor. Inexiste prova ou indício de que Dilma seja ladra. Quem tem conta secreta na Suíça é o deputado que deu sinal verde para o impeachment. Com crime de responsabilidade, impeachment é legal. Sem, é golpe”.


A lamentar temos o fato que estamos sofrendo de uma paralisia institucional como a muito não se via. Não se governa e não se legisla, só se pensa em estratégias para se ganhar esse FLA X FLU cuja troféu é a faixa presidencial. Partidos e atores políticos mandaram às favas suas consciências e seus, poucos é bem verdade, escrúpulos. Agora se trata de ver quem leva a cadeira presidencial como troféu mesmo que as próximas eleições estejam logo ali, daqui a três anos. Mas, louvemos iniciativas em prol da manutenção da ordem politica e social. 


Dezesseis governadores assinaram a "Carta pela Legalidade" onde se colocam contra o processo de impeachment. O documento foi escrito pelo governador de Sergipe, Jackson Barreto, que é do mesmo PMDB que trama o fim do mandato de Dilma. Nele pode-se ler: "A história brasileira ressente-se das diversas rupturas autoritárias e golpes de estado que impediram a consolidação da nossa democracia". O governador da Paraíba, Ricardo Coutinho, um dos signatários da “Carta pela legalidade”, afirmou que “não está configurado atos da Presidente que possam ser tipificados como crime de responsabilidade”.


Tudo isso deve nos ensinar que nosso sistema politico democrático é ainda frágil e pouco republicano. Enquanto insistirmos em saídas de força para nossas crises e dilemas institucionais não seremos uma democracia consolidada. De uma vez por todas precisamos aprender a lidar com as incertezas do jogo democrático. Enquanto partidos e atores políticos agirem para reverter o resultado das urnas em “terceiros turnos”, abaixo de toda e qualquer suspeita, seguiremos sendo essa república bananeira que vive de formalismos democráticos, mas que só se sustenta mesmo com um conteúdo dos mais autoritários.

 

Quebrar a legalidade democrática para privilegiar projetos político-partidários não nos levará ao melhor termo. Estamos mesmo dispostos a pagar o preço alto pela quebra da legalidade democrática? Se esse impeachment vingar retroagiremos ao nosso passado ditatorial e nos distanciaremos do processo democrático que pensávamos próximo, quando as instituições politicas não sofreriam com os desvãos soturnos de personagens como esse Eduardo Cunha que bem poderia ter inspirado Chico Buarque em o “Hino de Duran” da Opera do Malandro: “Se tu falas muitas palavras sutis/ Se gostas de senhas sussurros ardis/ A lei tem ouvidos pra te delatar/ Nas pedras do teu próprio lar/ Se trazes no bolso a contravenção/ Muambas, baganas e nem um tostão/ A lei te vigia, bandido infeliz/ Com seus olhos de raios X”.

terça-feira, 15 de dezembro de 2015

Quando eles cruzam o Rubicão – Parte II

A presidente, contrariando os que a tomam como estulta, fez a leitura correta da situação. Pode parecer um paradoxo, mas Dilma viu algo de positivo no desvario oportunista de Cunha quando afirmou que “foi melhor assim, pois a indefinição que imobilizava o governo acabou”. É que finalmente ficou claro que não se pode esperar nada de bom de alguém que só tem a chantagem, a barganha e a voracidade por cargos como arma politica. O governo entendeu que se os deputados petistas votassem a favor de Cunha no Conselho de Ética num dia, ele se voltaria contra o governo no dia seguinte. Foi por isso que Rui Falcão pediu pela admissibilidade do processo. Afinal, o que esperar de quem acatou o pedido de impeachment apenas para retaliar o governo?


Cunha não é republicano. Ele vive num mundo pré-medieval, onde a “coisa pública” ainda não era utilizada. Cunha é um golpista cínico que só pensa em salvar seu mandato, seu status e o dinheiro que esbulhou dos cofres públicos. Ele não passa de um joguete nas mãos dos que jamais cruzariam o rubicão para se jactarem como heróis. Cunha será manuseado por seus pares e cúmplices, para fustigar Dilma e o PT, e quando não mais for útil será cuspido do Congresso Nacional como foi Severino Cavalcanti, por exemplo.


Dilma quer apressar o andamento do impeachment para ver se governa em águas menos revoltas e para estancar as articulações golpistas, revestidas de alguma legalidade e/ou legitimidade, que permeiam o ambiente contaminado pelo inconformismo antidemocrático dos que perderam a eleição de 2014. Mas, a imobilidade segue, pois o espírito cívico republicano sumiu de Brasília. A situação é a pior possível e só confirma a tese de Luis Fernando Veríssimo de que “no Brasil, o fundo do poço é tão somente uma etapa”.


Vejamos que se estabeleceu um dilema institucional. É que o governo não tem maioria no Congresso para governar e a oposição não possui maioria qualificada para dar célere prosseguimento ao golpe disfarçado de impeachment. No episódio da formação da Comissão, na Câmara dos Deputados, que analisará o pedido de impeachment se viu isso. A oposição teve 272 votos, mas precisa de 342 para aprovar o impedimento. A situação teve 199 votos quando precisa ter 172 para barrar o processo. Essa vantagem de 27 votos se esvai rapidamente num Congresso onde se parlamenta à base de chantagens, cinismos, ameaças, barganhas e toda sorte de comportamentos nada republicanos.

Como farsa não como tragédia, o vice-presidente Michel Temer também cruzou o rubicão ao criar o fato que declarou seu rompimento com a presidente Dilma. Ele a enviou uma carta lamuriada pelos interesses do PMDB que só enxerga cargos. O estadista, expert em constitucionalismo, que acreditávamos ser o vice-presidente sucumbiu a uma cantilena onde se regateia a atenção da presidente e se cita atos comezinhos da vida palaciana. Temer vem manobrando, pelos braços de Eduardo Cunha, a defenestração de Dilma seja pelo impeachment, seja pela renúncia forçada. A carta, instrumento de chacota nas redes sociais, queria provar uma fragilidade do vice-presidente que jamais foi real.


Temer está para Dilma assim como muitos dos que cercavam João Goulart em 1964- faziam parte do seu governo, eram seus mais diletos aliados, mas tramavam sua derrubada junto aos militares. O bloco civil golpista de 1964 tinha um pé na oposição e outro na situação tal qual o PMDB que governa e é oposição tudo ao mesmo tempo agora. Temer diz na tal carta que a "desconfiança (de Dilma em relação a ele e ao PMDB) é incompatível com o que fizemos para manter apoio ao seu governo". Como se Eduardo Cunha, Renan Calheiros e o baixo clero medicante de verbas e cargos fossem de outro mundo.


A Carta de Michel Temer é pateticamente mesquinha na direção do rompimento com Dilma. Temer não temeu a ridicularizarão a que se expôs, pois confessa na carta que tudo gira em torno de cargos, favores, homenagens e status. Subliminar ficou que Temer parece disposto a embarcar nas aventuras golpistas que se tramam no Congresso Nacional. Quem melhor definiu essa situação foi o jornalista Xico Sá em sua coluna semanal no site do Jornal El País: “O vice que versa em latim — de velha missa — quer reza. Ego inflamado na paquera com as sinhazinhas da Casa Grande e federações das indústrias, tentou inverter a cabeça da chapa mais de um ano depois das eleições. Tomou a pílula azul do golpismo”.

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segunda-feira, 14 de dezembro de 2015

Quando eles cruzam o Rubicão – Parte I


Por volta de 50 a.C., Júlio César cruzou o rio Rubicão atrás de Pompeu descumprindo leis de Roma que proibiam que seus generais fizessem a travessia para que a sede do Império não fosse desguarnecida. A atitude foi heroica, mas temerária, pois ele pôs Roma em risco. Júlio César até marcou o fato com a frase “Alea jacta est” (a sorte está lançada). “Cruzar o Rubicão" passou a significar a tomada de uma decisão, que envolve riscos, sem que se possa voltar atrás.  Quando políticos cruzam o rubicão estam dando um grande salto.


O presidente da Câmara Federal, Eduardo Cunha, cruzou o rubicão. Ele acolheu um dos pedidos de impeachment da Presidente Dilma, protocolados na Câmara por partidos: o PSDB à frente, o PMDB por trás. O ato “rubinesco” de Cunha não teve nada de heroico, não foi uma decisão cerebral, baseada em um cálculo considerando a relação custo/benefício de um ato de tal envergadura. Cunha, e seu exército de Brancaleones, atravessou o rubicão brasiliense devido a cavalares doses de cinismo e uma mórbida estultice que moldam essa figura que a politica do Brasil tão bem reproduz.



O poeta e dramaturgo Oscar Wilde afirmou que “o cínico sabe o preço de tudo, mas o valor de nada”. Assim é Eduardo Cunha despido de valores republicanos, falso moralista hipócrita (que vê no caduco Estatuto da Família a obra de uma vida), arrecadador de propinas que deposita em faraônicas contas bancárias. Num artigo de 04 de dezembro o colunista da Folha de São Paulo, Marcos Gonçalves, chamou Cunha de “jihadista da direita corrupta, um patife entrincheirado no comando da Câmara”. Para permanecer na Presidente da Câmara dos Deputados Cunha terá ainda que cruzar um rubicão amazônico. Quando suas chantagens não mais surtiam efeito se atirou nas águas de um rio que ele não sabe onde, e se, tem pé suficiente para deixar sua cabeça acima do nível da água.


Eduardo Cunha acolheu o pedido de impeachment motivado (1) pela mensagem que o presidente nacional do PT, Rui Falcão, postou no Twitter: “Confio em que nossos deputados votem pela admissibilidade do processo”; (2) pelo anuncio dos deputados do PT, com assento no Conselho de Ética, de que votariam pela continuidade do processo contra ele; (3) pelo palpite de que o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, pedirá ao Supremo Tribunal Federal seu afastamento da presidência da Câmara. Cunha usava o impeachment contra a presidente como clara chantagem para preservar seu mandato depois que até a Ordem dos Congregados Marianos já sabiam de suas contas na Suíça e das peraltices de sua esposa na Europa e nos EUA.


Eduardo Cunha finge não saber que foi o PSOL e o Rede Sustentabilidade que entraram com uma representação contra ele no Conselho de Ética. Prefere achar que é tudo uma (SIC) “perseguição sórdida vinda do Palácio do Planalto”. Sim, interessa ao governo ver Cunha cada vez mais enredada na teia de embustes, veleidades, empáfias e estupidez por ele próprio tecida. Sim, o governo barganhou com Cunha ao propor que ele não acolhesse pedidos de impeachment em troca de sua defesa no Conselho de Ética. Mas, Cunha, chantagista de quatro costados, formado nos bastidores putrefatos do parlamento brasileiro, não aceitou o toma-lá-dá-cá porque deve favores a uma oposição pró-impeachment que contribuiu para que ele deixasse o baixo clero e se tornasse presidente da Câmara dos Deputados.


Mas, como já se disse, (SIC) “a chantagem é a arma dos fracassados”. O chantagista pensa ser forte pelo temor que causaria no chantageado. Mas, este pode ser o dono das ações se resolver revelar as verdades que dão lastro à chantagem. Cunha, ignorante contumaz, não entendeu isso. Deveria ouvir mais e melhor os que manuseiam os humores e quereres do governo, Lula, Michel Temer, Renan Calheiros, et reliqua. Já o PT, finalmente, tomou uma atitude consequente e resolveu medir forças com Cunha mesmo que tenha que entregar a cabeça da presidente Dilma.


O PT entendeu que precisa sobreviver, pois aí vêm 2016 trazendo as eleições municipais. Entendeu, também, que para acabar com o chantagista só mesmo lhe retirando o motivo da chantagem. Pareceu um salto no escuro, mas a ideia foi bem racionalizada. Ao decidir apoiar a cassação de Cunha, se viu livre de defender o indefensável. O PT está numa posição tão delicada que até aceita perder um de seus braços, que atende pelo nome de Dilma Rousseff, na esperança de recuperar o respaldo social que outrora era seu principal capital politico. Hoje, Dilma é refém do seu partido e depende dele tanto quanto tem que se submeter ao PMDB, o achacador-mor da República.


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sexta-feira, 4 de dezembro de 2015

ITARARÉ NOTÍCIAS 03 de Dezembro de 2015





Nesta entrevista, com os jornalistas Anchieta Araújo e Mônica
Victor no ITARARÉ NOTÍCIAS, analisei os últimos acontecimentos e desdobramentos da política nacional depois que o Presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha, aceitou um dos processos que pedem o impeachment da Presidente Dilma Rousseff.


Consideramos que Eduardo Cunha enfrenta um processo de cassação de
mandato no Conselho de Ética da Câmara Federal; discutimos os motivos (reais ou não) para o impeachment, o exacerbado nível de revanchismo de Cunha, que compromete o funcionamento das Instituições políticas, e o quanto é delicado o momento politico que vivemos. 


Ainda tratamos do papel do PT e do PMDB neste contexto e se a saída de Dilma da Presidência da República melhoraria ou pioraria a situação do país.


quarta-feira, 18 de novembro de 2015

Vivandeiras querem golpe para salvar a democracia - Parte III.



Certo. Se a crise é de tal monta, que afeta a estabilidade do país e diz respeito às Forças Armadas, o que fazer então? Cumprir a Constituição Federal e intervir na ordem social e politica? Ou deixar que os civis ponham ordem no frege que eles mesmos causaram? A entrevista do Gal. Villas Bôas é algo dúbia. Num momento ele diz, numa provável resposta ao senador Serra, que é a “sociedade que tem que aprender com seus erros e ter consciência que cabe a ela solucionar esses problemas”. Já em outro ponto da entrevista afirma que “as Forças Armadas têm que estar em condições de atender às demandas da população”.


É como se ele estivesse dizendo que o Exército não vai intervir para corrigir os erros da sociedade, mesmo que possa vir a atender uma demanda de intervenção vinda da população. Nunca é demais lembrar que quase a metade da população brasileira se mostra simpática a volta dos militares ao poder central do país, segundo pesquisas do Datafolha e do Ibope realizadas neste ano. É preciso atentar para os perigos de costumeiramente se pedir, aos que detém o monopólio da força, para que intervenham no poder político (civil, por excelência). Nossa história nos exemplifica que não raras vezes vivandeiras terminaram sendo perseguidas pelos que tomaram o poder a força dos sabres e tanques de guerra – Carlos Lacerda, a Igreja Católica e a classe média brasileira que o digam.


Resultado de imagem para frágeis democraciasEm democracias frágeis agitações politicas na caserna querem sempre dizer algo. Agora, no mês de outubro, o Ministro da Defesa, Aldo Rebelo, teve que exonerar o Comandante Militar do Sul, Gal. Antônio Hamilton Martins Mourão, por ele ter dito que: “mera substituição da presidente não trará mudanças significativas (...) mudança seria o descarte da incompetência, má gestão e corrupção (...) toda consciência autônoma, livre e de bons costumes precisa despertar para a luta patriótica, contribuindo para o retorno da autoestima nacional”. Com tais comentários o Gal. Mourão incorreu em vários erros: (1) desrespeitou a (sua) comandante em chefe das Forças Armadas; (2) atingiu a ordem hierárquica das instituições coercitivas; (3) opinou sobre uma seara que não lhe diz respeito; (4) induziu civis e militares a atuarem em defesa de valores pouco democráticos.


Para piorar a situação, se promoveu no quartel da 3ª Divisão do Exército, em Santa Maria (RS), homenagem póstuma ao coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra, notório torturador da ditadura militar que chefiou o DOI-CODI de São Paulo. Homenagear figura tão abjeta, num país governado por uma ex-militante que foi presa e barbaramente torturada, soa como um escarnio, mas não deixa de ser uma movimentação política da caserna. Os militares gaúchos quiseram enviar um recado ao governo que acusou o golpe e tomou uma atitude drástica, coisa rara nos dias de hoje, mandando o general boquirroto realizar tarefas burocráticas em Brasília.


O ímpeto golpista das manifestações de rua arrefeceu, mas o ativismo autoritário nas redes sociais segue firme, forte, bem articulado em que pese não conseguir disfarçar uma contundente estupidez quando o assunto é a recente história politica brasileira. Não passa um dia sequer sem que alguém cite um caso de corrupção para logo em seguida pedir aos militares para nos salvarem (SIC) “do horror de viver numa democracia”, frágil, mas uma democracia. Se é verdade que os militares não estam interessados em fazer cumprir o art. 142 de nossa Constituição, é bem verdade, também, que quase metade da população cansou de viver sob os dilemas da democracia. O problema é que essa metade não viveu os tempos obscuros da ditadura e se recusa a travar conhecimento a cerca do que acontecia com aqueles que se oponham ao regime militar.


Brasileiros apontam a possibilidade de termos uma nova ditadura por não considerarem a democracia como o único sistema político possível. Essa insistente lembrança que temos da ditadura quer dizer que não apostamos todas as nossas fichas na democracia. Sérgio Buarque de Holanda já dizia que a “democracia, no Brasil, foi sempre um lamentável mal entendido”. Foi, e continua sendo, para pelo menos 45% da população que pensa ser bom viver num sistema onde as liberdades e os procedimentos democráticos são artigos de luxo para bem poucos.


terça-feira, 17 de novembro de 2015

Vivandeiras querem golpe para salvar a democracia - Parte II.



Sim, a crise se agravou pela instabilidade do governo Dilma. A presidente foi reeleita dizendo que não faria tudo o que passou a fazer a partir de 02 de janeiro passado. Ela negava que estávamos em crise durante a campanha eleitoral de 2014. Atitude temerária, passível de uma reprimenda da sociedade, mas não na forma de vaias e atitudes desrespeitosas para com a pessoa da Presidente. Quando a sociedade lhe retirou apoio, jogando para as calendas sua popularidade e a aprovação ao governo, estava justamente repreendendo a presidente pelos erros cometidos.


Caberia, ainda cabe, ao governo buscar corrigir seus erros e reconquistar, através de políticas públicas relevantes, o respeito e a legitimidade perdidos. Estranho mesmo é ver o governo tão dócil a este presidencialismo de extorsão, praticado em larga escala, tendo o PMDB como achacador-mor da República. A desgastada fórmula de governar por meio de uma coalização de partidos fracassou na medida em que as siglas aliadas chantageiam o governo por cargos e verbas em troca de apoios na seara parlamentar.


Estranho, também, foi ver a oposição abrindo mão de suas prerrogativas legais, buscando a porta lateral do golpismo calcada na mentalidade udenista onde crises institucionais se resolvem com saídas de força. Não se buscou o golpismo tradicional, ativado pelas Forças Armadas, mas sim um golpismo que segue ritos e procedimentos democráticos. Seria possível conviver com este paradoxo? Em democracias consolidadas procedimento democrático é a água que jamais se mistura com o óleo da mentalidade autoritária.

Em nosso caso, com a criatividade que temos para misturar água e óleo, encontramos uma forma de exercitar nossa mentalidade pretoriana sem ter que rasgar a Constituição Federal. E é bom lembrar que temos em nossa Constituição o Art. 142 que dá lastro a uma intervenção militar ao definir que as Forças Armadas “destinam-se à defesa da Pátria, à garantia dos poderes constitucionais e, por iniciativa de qualquer destes, da lei e da ordem”. A mesma Constituição que define como se procederá em caso de impeachment presidencial é a que dá poderes aos militares para intervirem.


Tal qual em outros idos, sempre existe a possibilidade das vivandeiras baterem às portas dos quartéis. Ao que tudo indica a oposição sondou as Forças Armadas sobre a possibilidade de apoio para destituir Dilma Rousseff. Assim como fez Fernando Collor para ver se se mantinha no poder e como fez Itamar Franco para garantir que assumiria mesmo a presidência no desfecho da crise gerada pelo impeachment de 1992. O senador José Serra (PSDB) se referiu várias vezes, entre os meses de julho e setembro, sobre a possibilidade da crise descambar para uma intervenção militar ao comparar o atual momento com aquele abril de 1964. Serra, vivandeira de quatro costados, batia a porta da caserna. Era como se ele quisesse lembrar aos militares que estava na hora deles tomarem as rédeas novamente.


A prova disso foi que o Gal. Eduardo Dias da Costa Villas Bôas teve que esclarecer o posicionamento da instituição que comanda neste momento tão conturbado. Este fato por si só quer dizer algo. Se a ordem politica e social, e as instituições, estivessem funcionando normalmente o Comandante do Exército ficaria em seu lugar. Numa entrevista a Folha de São Paulo, em 14 de outubro, o General Villas Bôas negou a possibilidade de uma intervenção militar, mas admitiu que uma “crise social (poderia) afetar a estabilidade do país e isso diria respeito às Forças Armadas”. Ele chegou mesmo a dizer que: “E aí, nesse contexto, nós nos preocupamos porque passa a nos dizer respeito diretamente”.



CONTINUA AMANHÃ...


segunda-feira, 16 de novembro de 2015

Vivandeiras querem golpe para salvar a democracia - Parte I.


Em junho de 1950, numa entrevista ao Jornal paulista "Folha da Noite", Getúlio Vargas disse: "Conheço meu povo, tenho certeza de que serei eleito. Mas, sei que não chegarei ao fim do meu governo. Se não me matarem, não sei até onde meus nervos aguentarão, mas não tolerarei humilhações”. Tirante o tom messiânico, o sentimentalismo populista e a extorsão emocional próprios de Vargas, temos a resposta do então candidato a presidente a um editorial do jornalista Carlos Lacerda publicado no Jornal carioca “A Tribuna da Imprensa”. O artigo é o suprassumo do autoritarismo. Dizia “O Corvo”, alcunha que uns usavam para denegrir Lacerda e outros para destacar sua sagacidade politica, que: "O Sr. Getúlio Vargas, senador, não deve ser candidato à presidência. Candidato, não deve ser eleito. Eleito não deve tomar posse. Empossado, devemos recorrer à revolução para impedi-lo de governar”. Inclementemente simples.


No Brasil era assim: onde houvesse a palavra revolução logo se lia golpe, assalto ao poder, intervenção militar. Carlos Lacerda liderava a União Democrática Nacional (UDN) uma espécie de PSDB só que bem mais conservadora, autoritária e sem viés liberal algum. A UDN era para Vargas e seu PTB o que, guardando as devidas e enormes proporções, o PSDB é para Lula, Dilma e o PT – uma feroz oposição disposta a tudo para derrubá-lo. Com seu libelo golpista, Lacerda expressava a impaciência de setores elitizados cansados de verem seus interesses represados pelo nacional-desenvolvimentismo. Fruto de uma sociedade desacostumada a praticar ritos democráticos, Lacerda pedia golpe aos militares ao invés de pedir votos para UDN.


O resto desse imbróglio é história que nos ensina muito sobre nosso presente. O governo Vargas foi tumultuado desde o começo, com a oposição implorando aos militares para tomarem o poder, com o presidente se suicidando em agosto de 1954 e com Lacerda tendo o desfecho autoritário que tanto ansiava dez anos depois, em 1964. Não pretendo fazer ilações entre este período com o momento critico em que vivemos, mas lembro que, como nas décadas de 1950 e 1960, muitos seguem acreditando que a força é solução única para nossas crises institucionais. A tese de que nossa democracia representativa se consolidou ruiu de vez! Fôssemos uma sociedade que reconhecesse os valores da democrática (liberdade e igualdade em doses equilibradas) e não veríamos vivandeiras rondavam os quartéis.


Vivandeira vem do francês “vivandière” e significava (na Guerra de Canudos, por exemplo) a mulher que seguia a tropa levando mantimentos para os soldados. O jornalista Elio Gaspari, numa coluna para a Folha de São Paulo em janeiro de 2010, afirmava que o marechal Humberto Castello Branco chamava de vivandeiras os políticos que iam aos quartéis conchavar com a oficialidade. Dizia Castello Branco: “São os que, como vivandeiras alvoroçadas, vêm aos bivaques bulir com os granadeiros e provocar extravagâncias ao Poder Militar”.

 Se déssemos o real valor que a democracia tem, vivandeiras seriam coisas do passado e não assistiríamos a deplorável cena de brasileiros vestidos de verde-e-amarelo, cantando o hino nacional e pedindo aos militares para intervirem na ordem política e social do país enquanto, frenética e pateticamente, batem panelas em suas luxuosas varandas. De fato, quase a metade de nossa população aceitaria alegremente trocar nossa frágil democracia por um regime de força.


Este cenário de crise político-econômica não se agravou por causa da corrupção que grassa instituições e sociedade. Temos uma moralidade seletiva na politica, onde se escolhe como e porque ser ou não desonesto. Onde o presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha, não é criticado pelo envolvimento em negócios escusos, mas por ter se deixado flagrar com tanta facilidade. Também não indicaria as pedaladas fiscais do governo Dilma como fato gerador da crise. Aliás, o que vem a ser este "crime bárbaro" que se quer usar para golpear as instituições? “Pedalar” é quando o governo toma dinheiro emprestado aos bancos para pagar contas. Como a dívida pública brasileira é sempre alta, governos usam este expediente para manter o equilíbrio financeiro. Até 2014, pedaladas eram vistas como mal necessário. Houve quem se gabasse de pedalar para não arrombar as contas. Pedaladas se tornaram motivo para impeachment como estratégia de quem não consegue chegar ao poder pelas urnas.


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quarta-feira, 4 de novembro de 2015

MAS, AFINAL, PORQUE ESTAMOS EM GREVE?


Por uma conjunção de fatores pessoais, profissionais e políticos não me posicionei até então sobre a greve deflagrada há exatos 137 dias pela Diretoria da Associação dos Docentes da UEPB (ou o que dela restou) e por um grupo de professores que compõem este Comando de Greve. Quero lembrar que sou apenas um dos tantos professores da UEPB e que não tenho cargos eletivos ou na estrutura da Administração Central da Instituição desde 2006 e assim pretendo seguir. Também, não tenho problema algum em lhes dizer que preservo boas relações com pessoas que dirigem nossa Instituição, mesmo que me reserve o direito delas discordar. 

Não vou ocupar o tempo de vocês com chavões do sindicalismo que lutou contra a ditadura militar, no final dos anos 1970; não vou repetir o discurso da "justeza do movimento" e da "necessidade de nos unirmos em torno de uma causa". Recuso-me fazer profissão de fé seja a quem for e a que causa for. Os que bem me conhecem sabem que não faço proselitismos, nem à esquerda e muito menos à direita, e que não costumo me submeter a vontades alheias sem que esteja absolutamente convencido de suas (e minhas) necessidades. Desculpem-me a ingenuidade de uma pergunta tola: "AFINAL, PORQUE É MESMO QUE NÓS, PROFESSORES DA UEPB, ESTAMOS COM NOSSAS ATIVIDADES PARALISADAS Há 137 DIAS?".

Penso não ser o momento, ainda, de discutirmos como e porque essa greve foi decretada. Em que pese estar convencido que, em algum momento próximo futuro, tenhamos que analisar a esdrúxula situação de uma ínfima quantidade de professores resolverem o que a totalidade deve ou não fazer. É chegada a hora de encararmos de frente o fato de que a ADUEPB não mais representa o conjunto dos professores da UEPB. Quando voltarmos às nossas atividades teremos que abraçar o dilema de que uma baixíssima representatividade não tem qualquer legitimidade para tomar seja que decisão for. Inclusive, e principalmente, a de paralisar as atividades de uma Instituição do porte da UEPB.

Como diria Herbert Vianna, "minha burrice faz aniversário ao permitir" que esse estado de coisas prossiga. De fato, não desejo mais me envolver com "atividades sindicais", muito menos pretendo voltar a fazer parte (como sócio) da entidade que foi capaz de voltar às costas à categoria que deveria representar (falo do episódio da aprovação do nosso Plano de Cargos, Carreiras e Remuneração).

Repito, esta entidade não tem legitimidade alguma para representar a categoria dos professores da UEPB, principalmente quando se recusa a ouvir o que eles pensam a cerca desse movimento. Vi que a ADUEPB não permitiu que professores, que não são seus sócios, participassem (ou votassem) numa assembleia, mesmo que ela se coloque como representante de todos os professores da UEPB. Espero ter visto errado, espero ter me enganado. Desconheço se essa é uma postura compartilhada pelo Comando de Greve. Espero, torço, para que não seja. Já foi hábito nosso todos os professores da Instituição serem chamados às Assembleias realizadas em períodos de greve. Inclusive, todos votavam, mesmo os que não eram sócios da entidade.

Já nos parece um tanto quanto clara a impossibilidade de se cumprir as reivindicações feitas pelo Movimento grevista. Se olharmos para a longuíssima greve dos técnicos-administrativos da UEPB, com o que era reivindicado e o que de fato foi conquistado, veremos que chegou a hora de definirmos o que realmente queremos com essa greve. Tenho visto os que fazem o movimento grevista dando primazia, prioridade, ao enfrentamento político em relação ao Reitor da UEPB e ao Governo do Estado. Hora, se é assim, podemos voltar as nossas atividades. Eles podem, devem, continuar suas ações políticas sem que toda a comunidade acadêmica siga prejudicada dessa maneira. Estou convencido que indivíduos e/ou pequenos grupos devem lutar para implementar seus projetos políticos, mas não ao custo de tantos prejuízos de nossa comunidade acadêmica.
Está claro que essa greve não é do conjunto dos professores da UEPB. Há um crescente isolamento desse grupo à frente do movimento grevista. A ocupação da Reitoria da UEPB foi um fato, como tantos outros, dessa greve. Mas, ela parece não mais se retroalimentar. Porque insistir em algo que não consegue gerar resultados positivos? Certo, compreendo que algumas pessoas necessitem ter uma greve (uma ocupação ou invasão) para chamar de sua e para fornir suas biografias, mas chegou a hora de pensarmos na comunidade acadêmica e, principalmente, em nossos alunos que, sim, querem aulas, e de boa qualidade.

PS: Se sou contra as reivindicações? Não, não sou, mesmo que discorde de algumas “bandeiras de luta”. Se acho que o Governo do Estado deve acabar com seu silencio ensurdecedor sobre a Greve da UEPB? Não só acho, como estou convencido que ele precisa urgentemente apresentar alguma proposta factível ao Reitor da UEPB.