Mas, esse professor de ciências achava que eu tinha salvação.
Depois de tentar me convencer a prestar atenção às aulas, ele mudou sua
abordagem e fez uma proposta, na verdade um trato, irrecusável. Eu não mais
seria obrigado a assistir as aulas dele, nem precisaria fazer as atividades que
tanto detestava. Em troca, teria que ler alguns livros que ele me emprestaria e
depois discutir com ele sobre cada um desses livros. Aceitei o trato na hora. O
primeiro livro que ele me deu foi “O que é ditadura”, da Coleção “Primeiros
Passos” da Editora Brasiliense.
Mas, porque eu estou lembrando essa história? Porque hoje é o dia
do professor! Nada mais justo do que lembrar a relevância social desse
profissional. Não vou repetir o mantra do quanto-o-professor-é-importante-e-deve-ser-valorizado.
Nem vou cair na vala comum dos discursos oficiais. Não quero fazer uma ode a
nossa profissão e me recuso a reproduzir o discurso da vítima. Aquele que diz
“olhem o quanto é difícil ser professor, vejam como eles sofrem”. Não quero que
ninguém tenha pena de nós.
É óbvio que ninguém em sã consciência vai negar a importância do
professor na formação de um cidadão e no desenvolvimento social. Mas, se é
assim, como seguimos sendo profissionais tão pouco valorizados em nosso país?
Porque os governantes continuam a praticar a política de poucos direitos e
muitos deveres para com funcionários públicos da área de educação? Porque
governos tendem a criminalizar os atos dos professores que lutam pelos seus
direitos?
Professores foram tratados como black blocs alucinados em
manifestações no Rio de Janeiro, em São Paulo e em Curitiba. No Rio eles
protestavam contra um projeto da Prefeitura que instituiu o professor
“tudólogo”, i.e., o especialista em tudo. O Plano de Cargos e Salários do
prefeito Eduardo Paes criava o professor que pode dar aulas de qualquer
matéria, independente de sua formação. Assim, um professor como eu, formado em
história, poderia dar aulas de ciências. Vejam que perigo!
Em
2013 a Câmara Municipal de Campina Grande realizou sessão para homenagear
professores. Um deles foi Jonilda Alves que recebeu medalha de Honra ao Mérito
Municipal por relevantes serviços prestados a educação no município. Eu não
duvido que tenha sido uma justa homenagem. Aliás, proponho que, também a título
de homenagem, os professores sejam bem mais ouvidos em suas reivindicações e
demandas para que não precisem fazer greves. Para terminar,
aquele professor de ciências que tive lá na escola se chamava Raimundo. E, acredite,
ele conseguiu me ensinar o que era uma célula e, mais do que isso, me mostrou
que o conceito de célula pode ser usado em muitas coisas, inclusive na
política.