Professor do Curso de História da Univ. Estadual da Paraíba desde 1993. Mestre em Ciência Política-UFPE e Doutorando em Ciência da Informação-UFPB.
Especialista em História do Brasil, com ênfase na Era Vargas e na Ditadura Militar, na democracia e no autoritarismo. Autor dos livros "Heróis de uma revolução anunciada ou aventureiros de um tempo perdido" (2015) e “Do que ainda posso falar e outros ensaios - Ou quanto de verdade ainda se pode aceitar” (2024), ambos lançados pela Editora da UEPB.
Esta semana o LEVANTE POPULAR DA JUVENTUDE da Universidade Federal
da Paraíba (Campus de João Pessoa) promove a I SEMANA ACADÊMICA DO DIREITO
entre os dias 18 e 20 de maio de 2016 no Auditório do Centro de Ciências
Jurídicas (CCJ).
Participarei proferindo a palestra “HERANÇA JURÍDICO POLITICA DA
DITADURA MILITAR” e lançando o meu livro “HERÓIS DE UMA REVOLUÇÃO ANUNCIADA OU
AVENTUREIROS DE UM TEMPO PERDIDO”.
A I SEMANA ACADÊMICA DO DIREITO tratará de temas como Reforma
Política, Segurança Pública, Direito à Cidade e Meio Ambiente. Também, se
aponta para a necessidade de se aprofundar o debate sobre os resquícios da ditadura
militar no atual Estado Democrático de Direito e o conturbado momento
jurídico-politico da sociedade brasileira.
Temos que nos submeter às incertezas do jogo
eleitoral democrático, ou seguiremos nos perguntando se devemos defender a
democracia ou, dito de outra forma, se não seria melhor vivermos em uma
ditadura.
Os nascidos em 2000 poderão votar nas
eleições deste ano numa democracia parida da liberalização iniciada pelo regime
militar. Quando os atuais jovens de 16 anos nasceram, havia apenas 15 anos que
a ditadura acabara. São latentes em nosso entorno seus entulhos autoritários.
A Constituição de 1988 traz os germes da
ditadura –vide os artigos 142 e 144, inexistentes em várias democracias, que
dão prerrogativas aos militares para agirem sobre a ordem politica e social do
país. E isso para não falar que o Congresso Nacional e a sociedade brasileira
são povoados por uma fauna de saudosistas do regime militar. O discurso do
deputado Jair Bolsonaro, na sessão da Câmara dos Deputados que abriu o processo
de impeachment contra a presidente Dilma, reverenciando a memória de um
torturador, é um plangente exemplo disso. Nossa democracia repousa sob
escombros de um regime que tinha a tortura como política de Estado.
Como viver em uma democracia tão frágil?
Como respeitar uma eleição se os eleitos não pretendem cumprir as funções
delegadas pelos eleitores? Como o jovem eleitor quererá participar sabendo que
suas decisões poderão ser desfeitas por golpes travestidos de impeachment? Por
que valorizar um sistema que pode desmanchar decisões tomadas nas urnas?
54.501.118 eleitores decidiram que Dilma Rousseff nos governaria entre 2015 e
2018.
Como eles se sentem ao ver um grupo de
parlamentares corruptos, conservadores, oportunistas, autoritários e
pateticamente irresponsáveis processando a destituição da presidente eleita
democraticamente e que não cometeu crime algum?
Eleições permanentes e alternância no
poder são essenciais. Mas, o cidadão tem que se responsabilizar pelas escolhas
feitas nas urnas. Não adianta fazer discursos enfurecidos diante dos escândalos
de corrupção e depois dar ao corrupto o conforto de ter um mandato e foro
privilegiado.
Eleições em profusão pouco adiantam se
não estamos dispostos a cumprir os mecanismos institucionais que permitem que
os que descumprem suas funções (e as leis) sejam responsabilizados com
pressupostos penais que causem punibilidade. Por que supomos que esse
revezamento de nomes e siglas nos cargos governamentais é solução única para
nossos males? Por que nos contentamos com tão pouco?
Nosso processo eleitoral evoluiu com
dificuldades. Em 1960, na última eleição presidencial antes do golpe de 1964, 6
milhões de eleitores votaram. Na eleição seguinte, 29 anos depois, foram 120
milhões de eleitores. Crescíamos quantitativamente enquanto desaprendíamos a
votar. Já em 2004, os eleitores entre 16 e 25 anos foram cerca de 25 milhões.
Quantos destes amadureceram para intervirem no processo eleitoral e para
atentarem para a responsabilidade de se eleger um reconhecido corrupto?
O governo e o sistema representativo
devem ter o consentimento do cidadão para serem legítimos. Essa anuência vem do
contrato social, materializado no sufrágio universal, onde os cidadãos dão
autoridade para que leis sejam criadas. Em "Capitalismo, Socialismo e
Democracia" o economista e cientista político austríaco Joseph Schumpeter
se refere à democracia como um método político por onde se escolhe os que
decidem e que dá ao cidadão o poder de substituir um governo por outro para que
ele próprio se proteja dos riscos dos escolhidos se tornarem uma força
inamovível. Dizia ele: "A democracia significa apenas que o povo tem a
oportunidade de aceitar ou recusar os homens que a governam".
Devemos nos contentar com isso? Não, é
insuficiente! Mas, se não consolidarmos nem isso, como avançaremos para um
sistema que contemple aspectos mais amplos do funcionamento de um Estado que
seja a um só tempo legal e legítimo, e, portanto, de direito e democrático?
Hoje, ditaduras parecem coisa do passado
e eleições se sucedem a cada dois anos. Falta-nos ter a política como o que
orienta as relações sociais e uma mentalidade democrática que substitua essa
pretoriana visão de mundo que temos. Mas, isso não se faz apenas com discursos.
Eleições podem ser uma via para isso. Se é ruim conviver com elas, o que dirá
sem?
Pela educação, nosso passado autoritário
precisa ser revisto. Na ditadura, Estudos Sociais, Educação Moral e Cívica,
Organização Social e Política do Brasil e Estudos dos Problemas Brasileiros
constavam nos currículos escolares para afirmarem os interesses e a ideologia
do regime militar. Mas, paradoxalmente, essas matérias eram subvertidas por
professores que driblavam a censura e o medo para ensinar "assuntos
diferentes". Foi assim que muitos, como eu, puderam ter acesso à
filosofia, política, história, sociologia.
Os que se lembrarem disso são menos
jovens do que esses que vão votar pela primeira vez e podem contribuir num
processo de educação política. Se não estamos em uma ditadura e temos liberdade
de expressão, por que não usar espaços devidos para educar para a cidadania que
ensina para que servem as instituições políticas? O que é a República, a
Federação, a Constituição, os Poderes e suas funções, as eleições e os
partidos, os direitos e os deveres, o papel da imprensa. É preciso munir o
jovem para que ele entenda a democracia e possa valorizá-la como algo útil para
sua existência.
No século 20 vivemos 36 anos sob
ditaduras, sem contar os anos nos quais vestígios de democracia coexistiam com
uma couraça de autoritarismo. Desde a proclamação da República, ainda não
tivemos mais de 35 anos contínuos de democracia sem que ditaduras e
autoritarismos de toda sorte solapem as instituições. Do fim do regime militar,
em 1985, até aqui, ainda somamos menos anos do que os vividos sob as duas
ditaduras do século 20.
Nossa jovial e festiva democracia
eleitoral ainda tem muito que evoluir. É preciso ter instituições responsáveis
com cidadãos respeitados em seus direitos e igualmente responsáveis. Temos que
nos submeter às incertezas do jogo eleitoral democrático. Do contrário,
seguiremos nos perguntando se realmente devemos defender a democracia ou, dito
de outra forma, se não seria melhor vivermos em uma ditadura.