A luta político-ideológica neste momento se dá para
levar o Exército a intervir, pois estamos sem governo. Quem governa o país
hoje? Michel Temer? Os presidentes do Senado e da Câmara federais tentaram
alguma coisa, mas como agir sem legitimidade? O STF está de braços cruzados e
assim ficará, pois os homens da toga preta esperam que governo e partidos rastejem
até eles. Parte da sociedade, que vê os
caminhoneiros como sua caixa de ressonância, quer intervenção militar mesmo que
não saiba para quê e que não vislumbre as funestas consequências se, e/ou
quando, os militares tomarem o poder para “reestabelecer a ordem”. Parecemos nas
mãos deles até porque setores que são contra o intervencionismo apenas gritam
histericamente nas redes sociais.
A paralização dos caminhoneiros é um movimento autoritário, pois não representa os interesses de uma classe social e parece ser a reedição das “greves de caminhoneiros” de 1964, no golpe civil-militar brasileiro, e 1973, no golpe militar chileno, onde a ideia era paralisar o setor produtivo para implantar o caos e desestabilizar seus governos, contribuindo para o golpismo. Essas paralisações foram promovida pelos empresários com apoio logístico da CIA e do Departamento de Estado dos EUA.
O
professor de direito da UERJ, Afrânio Jardim, afirmou em seu Facebook que essa greve
é uma “paralisação das empresas, um ‘Lock
Out’ para truncar o processo eleitoral”. Jardim disse que “pela televisão, se verifica caminhões sem
carroceria, do mesmo modelo e cor, com faixas contra os impostos e não contra o
preço do combustível. O Sistema Globo dá ampla e permanente cobertura para inflar
o movimento dos patrões. Este tipo de ‘Lock Out’ ajudou na queda do socialista Salvador Allende, no
Chile, e criou clima favorável ao golpe que derrubou João Goulart. Podemos
dizer que ‘há mais coisa entre o céu e a terra do que sonha nossa vã
filosofia".
Entidades
empresariais como Associação dos Produtores de Soja, Associação Brasileira de
Atacadistas e Distribuidores, Confederação Nacional dos Dirigentes Lojistas e Confederação
Nacional dos Transportes afirmaram que a greve dos caminhoneiros é legítima,
num claro posicionamento favorável a um movimento do qual deveriam ser contra. Estranho
que patrões estejam ao lado de trabalhadores considerando que somos uma
sociedade capitalista. Fiquemos em alerta pelos efeitos colaterais dessa
paralisação, pois ela pode ser a justificativa para não termos eleições. É que
o conglomerado golpista de 2016 não consegue viabilizar o anti-Lula – uma
candidatura para enfrentar, com chances reais, o próprio Lula ou alguém que ele
apoie. Assim, o adiamento das eleições e a constituição de um governo
interventor jurídico-militar, com apoio da grande mídia, é uma possibilidade
que não se deve descartar.
A
Revista Fórum, em editorial da quarta-feira (23/05/18), Crise pode levar Brasil a um golpe dentro do golpe, afirma que: “Em grupos de
direita pelas redes sociais as mensagens defendendo intervenção militar estão
viralizando. Vídeos falando sobre o caos com o aumento do preço dos
combustíveis e invocando as Forças Armadas para resolver a crise têm sido
espalhados. Os indícios são de que parte dessas mensagens está sendo enviada
não de maneira orgânica ou espontânea, mas por postagens pagas e provavelmente
a partir de distribuição por linhas telefônicas do exterior”.
Sobressaltado,
vi vídeos onde a preocupação não é a luta pelos interesses de uma categoria
profissional, mas sim instrumentalizar o movimento para pavimentar a incursão
golpista dos militares. Vi um caminhoneiro dizer: “Estamos juntos na greve, fazendo adesivos para colar nos nossos carros
e nos de quem apoiar essa greve. Intervenção militar já! Se a gente não tirar
esses corruptos do poder, a gente não vai para frente". Em outro
vídeo, viralizado pelo WhatsApp, um homem aparece em frente a uma impressora
industrial mostrando adesivos com a frase: “Intervenção
militar já!”.
Um terceiro vídeo mostra uma fila de caminhões,
bloqueando uma rodovia, com um caminhoneiro exaltado pelo fervor nacionalista
berrando autoritariamente: "Representando
o caminhoneiro, o transportador de carga. Aqui tem brio, aqui tem sangue (...) parando
São Paulo, parando o Brasil e indo para Brasília destituir os três poderes
corruptos. Intervenção militar já. O povo está cansado de sustentar estes
corruptos. Aqui é patriota". Mesmo que não queira subestimar o
brasileiro em sua infinita capacidade de abusar de seus próprios direitos, fico
imaginando uma caravana de caminhões adentrando a Esplanada dos Ministérios
para depor os tais poderes corruptos. Estaria o bolsonariano motorista
delirando ou teriam lhe dito que tanques de guerra se juntariam aos caminhões
na Praça dos Três Poderes em Brasília?
Um
jornalista me perguntou se estamos na antevéspera de uma intervenção militar? Disse
não ter certeza, mas afirmei que trilhamos rapidamente o caminho que ainda nos
levará a uma ditadura ou a adotarmos um sistema político em que o autoritarismo
dará sustentação ao funcionamento de alguns, poucos é bem verdade,
procedimentos democráticos. Neste cenário, teremos eleição e censura
funcionando juntas, como se não fossem paradoxais entre si, e a garantia da
liberdade de expressão mesmo que o cidadão possa ser preso e até condenado por tornar
públicas suas opiniões. Assim, o regime político elegerá seus governantes, mas
estes poderão reprimir seus inimigos, com “Supremo com tudo”.
Alguma
surpresa? Nenhuma, não foi assim que o regime militar funcionou? Lembro que Hannah
Arendt, em “As Origens do Totalitarismo”, nos mostra que em situações de caos,
de ausência de direção, com instituições politicas fragilizadas e governo
anódino, vale a lei do mais forte. O caos interessa aos que preferem a
ditadura!
Para finalizar,
sugiro relacionar toda essa questão com o processo eleitoral que cada vez mais
tenho menos esperança que possa se realizar ainda este ano. Vejamos o que diz Celso
Rocha de Barros, doutor em sociologia pela Universidade de Oxford, num artigo
para a Folha de São Paulo, Bolsonaro
te acha otário
“E se você acha que roubarem seu dinheiro e te deixarem sem comida é a pior coisa que pode lhe acontecer nessa história, veja o que Bolsonaro está fazendo. Bolsonaro gosta da greve dos caminhoneiros porque cedo ou tarde alguém vai morrer sem hemodiálise por causa da paralisação, e Bolsonaro quer que pessoas morram sem hemodiálise. Bolsonaro apoia a greve dos caminhoneiros porque o desabastecimento vai deixar a população com fome, e Bolsonaro quer a população com fome. Bolsonaro quer isso tudo porque sabe que quanto mais você estiver com raiva, medo e fome, quanto mais estiver desesperado e sem saber o que fazer, menor será sua capacidade de pensar direito. E ninguém jamais votará em Bolsonaro se estiver pensando direito. Bolsonaro apoia a greve para produzir desordem agora e vender ordem em outubro”.
“E se você acha que roubarem seu dinheiro e te deixarem sem comida é a pior coisa que pode lhe acontecer nessa história, veja o que Bolsonaro está fazendo. Bolsonaro gosta da greve dos caminhoneiros porque cedo ou tarde alguém vai morrer sem hemodiálise por causa da paralisação, e Bolsonaro quer que pessoas morram sem hemodiálise. Bolsonaro apoia a greve dos caminhoneiros porque o desabastecimento vai deixar a população com fome, e Bolsonaro quer a população com fome. Bolsonaro quer isso tudo porque sabe que quanto mais você estiver com raiva, medo e fome, quanto mais estiver desesperado e sem saber o que fazer, menor será sua capacidade de pensar direito. E ninguém jamais votará em Bolsonaro se estiver pensando direito. Bolsonaro apoia a greve para produzir desordem agora e vender ordem em outubro”.
PS: Na matéria do UOL, PF pediu prisão de
empresários acusados de articular greve, “Locaute acontece quando donos das empresas impedem seus trabalhadores
de exercerem suas funções, agindo em interesse próprio e não para atender
reivindicações laborais. Diferente da greve, um direito previsto na
Constituição Federal, o locaute (termo que vem do inglês lock out e em tradução
livre significa trancar) é ilegal”. Agora mesmo, vejo notícias de que
empresários do ramo de transportes estão por trás das greves dos caminhoneiros.
É por isso que os “grevistas” só falam em baixar os impostos e em intervenção
militar, demandas claras dos donos do capital.
PS: Menos de 24 horas após ter postado esta
coluna, a realidade (sempre mais contundente do que minhas opiniões poderiam e gostariam
de ser) veio, infelizmente, confirmar a análise que faço acima. O vídeo abaixo
traz um exemplo lamentável de vergonha alheia!
O fato se deu em frente ao 31° Batalhão de
Infantaria Motorizada, no domingo (27/05/18), em Campina Grande-PB, também conhecida
como a “ilha tucana” por que consagrava nas urnas o PSDB, em sua versão
coronelística, enquanto o Nordeste em peso elegia governos comprometidos com o
desenvolvimento social brasileiro, falo de Lula e Dilma Rousseff. Nas imagens podemos ver, literalmente, vivandeiras-manifestoches (veja o artigo Vivandeiras querem golpe), claro, batendo à porta de um quartel pedindo golpe e ditadura, numa atitude sabuja, reacionária, alienada, totalitária. Sabemos bem onde isso termina! A charge de Duke demonstra claramente o que inevitavelmente acontecerá com essa gente estúpida que pensa que a força é solução para todos os nossos dilemas.
Maio – 2018.
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