Remexendo um velho arquivo
(que chamo de “cesto departamento”, para onde vão coisas que finjo que estou jogando
na lixeira) encontrei esses artigos, escritos entre 1998 e 2001, que nunca
foram publicados. Não sei, não lembro, porque não “postei” o primeiro, “O que
esperar dos eleitos?”. Talvez, à época, ele tenha se mostrado tão frágil, que
eu mesmo tenha preferido esquecê-lo. Acontece!
Os outros dois foram
censurados pelo jornal, com o qual contribuía semanalmente. Sobre o artigo “A
TV que faz chorar”, a justificativa foi que eu estaria (SIC) “indo de encontro
à TV da qual a empresa é associada”. É que o jornal, onde eu publicava, era
afiliado de umas das emissoras que havia criticado. De fato, havia mesmo, mas
... acontece, também! Sobre o artigo “Fé e iogurtes”, não lembro que
justificativa se deu para o artigo ter “caído”, mesmo que desconfiei que tenha
desgostado algum explorador da fé alheia.
Não queria publicar estes
três artigos, pois os considerei “datados”, mas sob os incentivos de minha editora\filha\leitora
Lívia Freitas, resolvi que eles deviam vir a público. Pensando bem, eles não
estão tão obsoletos assim!
O que esperar dos eleitos? (1998)
Analisando o resultado das eleições
paraibanas, de 1998, chama atenção a quantidade de votos brancos\nulos para
governador e senador. Para se ter ideia, o 2° colocado para governador, Gilvan
Freire, teve 175.234 votos, enquanto brancos\nulos somaram 588 mil votos. Uma explicação
para isso é a falta de boas opções apresentadas aos eleitores. A apregoada
falta de interesse do povo, quando o assunto é política eleitoral, é frágil,
pois gostamos tanto de eleição quanto de futebol e novelas.
Tivemos um processo
eleitoral onde o governador/candidato, José Maranhão, monopolizou as eleições. Outra
questão é que não houve renovação para a bancada paraibana na Câmara Federal,
no Senado e na Assembleia Legislativa. Sempre se poderá dizer que muitos não se
reelegeram e que outros vão ao parlamento pela primeira vez. Mas, não é desse
tipo de renovação que falo.
A renovação que quero
discutir é a de ideias e práticas políticas, pois não há nada de novo sobre o
senador e os 12 deputados federais eleitos. As práticas são as mesmas desde o
começo do século, próximo de acabar, mudam apenas a forma de realizá-las. Um
distribui consultas médicas em programas de rádio, outro mal sabe expressar-se,
um terceiro ocupou o guia eleitoral para só ensinar como votar nele e ainda tem
o que se diz herdeiro político de um outro que já faleceu. Sem contar o "senador
do povão" que facilmente transita entre o trágico e o cômico.
O que estes senhores irão
fazer em Brasília? Será que eles sabem para que serve um mandato parlamentar? Eles
dizem que vão lutar por verbas para a Paraíba, mas e quanto a “Reforma Política”,
que traz a fidelidade partidária e a revisão da reeleição dos prefeitos, e a
questão fiscal, criando e aumentando impostos, além da administrativa para demitir
funcionários públicos? E sobre a reforma da previdência social, algo de nosso
óbvio interesse, eles sabem o que fazer? Foi possível, durante as eleições, ver
o que eles tem a dizer sobre estes assuntos?
Sabemos que um único voto,
de um deles, pode mudar totalmente nossas vidas. É por isso que não podemos ficar
impassíveis, esperando que eles "lutem pela Paraíba" da forma que bem
quiserem, pois não foram eleitos para distribuir cadeiras de rodas e
nebulizadores, e sim para envolverem-se nos grandes temas nacionais, como nossos
representantes. Além disso, estes senhores, que serão protegidos pelo manto da
imunidade parlamentar, precisam ser monitorados pela sociedade civil, caso
contrário teremos que viver apenas com a renovação de nomes, não de práticas
políticas.
A TV que faz chorar (2000)
É domingo. Ligo a TV e vejo
o apresentador de popular programa de auditório, com os olhos vermelhos,
falando tristemente da vida de uma mulher que, abandonada pelo marido, teve que
criar uma penca de filhos e ainda teve seu casebre destruído por um incêndio. A
mulher está presente ao palco, com seus filhos, para dar veracidade a estória
do comovido (des)animador. Ao fundo, ouve-se uma música que faria o mais brutal
dos nazistas chorar feito criancinha. Por fim, o benevolente apresentador
oferta uma casa mobiliada para a pobre família e todos se regozijam. Um final
feliz!
Mas, por ser domingo, quero
relaxar, ver algo ameno. Mudo de canal. Aparece-me outro apresentador que, gritando
descontrolada e irritantemente, quer comover o público com sofridos detalhes da
vida de uma atriz de novelas. Não há interatividade, ele faz as pergunta e ele
mesmo as responde. Parece que só ele pensa. Sigo querendo relaxar, mudo o canal
e vejo um terceiro apresentador que tenta ser a síntese dos dois anteriores:
grita burramente, como o segundo, e faz caridades como o primeiro. Trágico,
cômico, bizarro! Minha busca só termina quando me convenço que a melhor forma
de relaxar é desligando a TV. Escutar uma boa música é a solução.
A questão é que os canais da
TV aberta não nos dão opção, possuem uma programação que só considera o baixo
nível educacional do povo brasileiro. Com o advento da chamada TV paga e com a
programação segmentada (programas dirigidos a grupos específicos) criou-se a
lógica de mercado (cruel e excludente) que se o telespectador quer ver boa
programação que pague para tê-la, senão aguente as porcarias que lhe são
oferecidas, aliás, impostas. Não é à toa que a Rede Globo exibe seu
"apresentador" ao invés de um jogo de futebol. Quer assisti-lo? Pague
para isso!
Uma outra grave questão é
que devido à ausência de um Estado social, que efetive políticas públicas, as
populações pobres ficam à mercê da própria sorte e terminam recorrendo aos
oportunistas de plantão, no caso apresentadores em busca de pontos no Ibope,
que renderão polpudos contratos de publicidade, e que não pestanejam em
explorar as desgraças humanas. Se lembrarmos a eles que somos nós que fazemos a
audiência, mudando de canal e até desligando a TV, com certeza irão se
preocupar em melhorar o nível da programação. Ou não?!
Fé e iogurtes (2001)
Imagine a situação: cidadão,
com R$ 100,00, uma ata que o designa representante de um grupo e um estatuto
que regerá este grupo, vai até a Receita Federal cadastrar-se. Em dois dias, ele
já tem a sua disposição, pela Internet, o Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica
que permite que o estabelecimento funcione. Não, não estou falando de um comércio,
refiro-me a uma igreja evangélica.
Para se abrir uma igreja no
Brasil basta ter fé, pois as facilidades mundanas são muitas. Veja-se que não
se cobra taxa de IPTU, nem licenciamentos, e não se paga imposto de renda, já
que os templos são considerados entidades filantrópicas. Mas, essas igrejas,
que vemos surgir em profusão, tem um alto poder de lucro que vem,
principalmente, da contribuição que cada fiel dá a seu pastor. É o chamado
dízimo - aqueles 10% que cada "um oferta a Deus".
Vi um membro de uma dessas
igrejas dizer que (SIC) “o aluguel da sede custa R$ 2.500,00 e é preciso
mantê-la, pois a contribuição está prevista no livro bíblico de Malaquias”. Porém,
o que se vê, na verdade, são denúncias de enriquecimento ilícito de pessoas
inescrupulosas que, a título de dar conforto espiritual a quem precisa,
exploram a fé das pessoas.
Para se ter ideia de como
se dá a exploração, vejamos o caso das Igrejas neopentecostais, conhecidas
pelos seus cultos barulhentos, onde os fiéis gritam a plenos pulmões palavras
de exaltação a Deus, talvez acreditando que Ele seja surdo. Prometem prosperidade
material, ou seja, o fiel que contribui, com o dízimo, investe em si próprio,
já que “terá em dobro tudo o que doou”. Assim, Deus funciona como uma poupança:
entrega-se uma quantia a Ele e após certo tempo Ele a devolve com juros e
correção. Mas, é bom lembrar, "pequena" parte fica com o pastor para investimentos
no “negócio da fé", como diria o cangaceiro do Auto da Compadecida.
Em tempos de crise qualquer
um que prometer prosperidade material só pode conquistar adeptos. São palavras
mágicas para ouvidos desesperados. O fato é que essas igrejas são negócios
privados como outro qualquer, onde o lucro é a meta. Por isso deixemos de
hipocrisia e passemos a tratá-las como tal. Já que elas viraram um lucrativo
negócio, que explora a fé do povo, como quem vende iogurtes no supermercado,
porque o Estado não as trata como tal e passa a cobrar delas impostos para
fazer, pelo povo, aquilo que elas mesmas não fazem?
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