segunda-feira, 15 de junho de 2009

Estulta normalidade.

Sugiro discutirmos a questão ambiental em Campina Grande e sua relação com a forma como os cidadãos lidam com o espaço público - como as pessoas o privatizam em prol de interesses particulares – e a desregulamentação provocada pelo poder público. A poluição sonora e o lixo que se acumula pelas ruas têm haver com os dois fatores acima citados. Muitos acham que defender o meio ambiente é distribuir mudas de plantas e proibir fogueiras juninas, mas não enxergam que parar um carro, em via pública, abrir sua mala e ligar o som em altíssimo volume é tão degradante quando fazer uma fogueira. Abaixo, um artigo onde discuto a problemática.
Estulta normalidade.
“Fala-se de um planeta melhor para nossos filhos,
mas não se falaem filhos melhores para nosso planeta.”
(Autor desconhecido)

Um cientista enjaulou cinco macacos e muitas bananas. Como normal, os símios tentaram pegá-las e foram banhados com jatos de água. Após isso, se um deles insistisse era impedido pelos outros à base de pancadas. Então, esqueceram às bananas. O cientista retirou um deles e pôs outro que correu para as bananas. Os veteranos o impediram com uma surra colossal e ele não mais tentou. Os outros macacos foram (um por vez) trocados e o mesmo ocorria – ao buscarem as bananas, os novatos eram sovados. Ficaram, pois, cinco macacos, que nunca tendo levado jatos de água, batiam nos que tentassem comer bananas. O sábio intuiu que se inquirisse os símios sobre tal atitude ouviria que “as coisas foram sempre assim - isso nunca vai mudar, é normal”.


Obtive variações dessa resposta quando indaguei transeuntes e trabalhadores (de estabelecimentos comerciais) das ruas centrais de Campina Grande sobre os constrangimentos a que somos submetidos devido à poluição sonora, visual, do solo e do ar que tantos males causam e impedem que se trabalhe e estude, se converse ou mesmo transite pelos logradouros da cidade.


Deixando a questão ambiental para os de mérito e/ou de direito, reflitamos sobre aspectos políticos da problemática, considerando que espaço público é o de uso comum e posse coletiva. Analisemos a atuação do poder público nesta área e como cidadãos campinenses lidam com o bem comum, i.e., o modo como aqueles privatizam este ao bel prazer de seus interesses.


Não credito o atino que aceita absurdos como normal. Assim como é comum macacos comerem bananas, deve ser se irritar com o descrito. Ter como normal o que acontece é estulto por desconsiderar os direitos dos que não mais vêem o espaço público como seus - ele foi privatizado pelo vale-tudo da sobrevivência e para que se faça na rua o que só deve ser feito em casa.


Hoje, energúmenos e insensatos de todos os matizes e inhenhos e alarves de todas as áreas acham-se no direito de danificarem nossos ouvidos com o excremento que a indústria musical produz e as malas de carros acrisolam nas ruas. O que legitima um néscio qualquer estacionar em plena “Praça da Bandeira” no meio da manhã, abrir a mala de seu carro e colocar em volume altissonante um desses “forrós de plástico” escatológico? O tosco dirá que o faz porque paga impostos. Na verdade, ele assim age por contar com a impunidade, certeza tivesse da punição pensaria melhor em violentar as pessoas daquela maneira.


Sob o argumento, por certo justo, da “luta pela sobrevivência”, jovens deseducados transitam por onde bem querem com seus execráveis “carrinhos de CD” – uma praga no dia-a-dia dos que fazem coisas úteis. Na rua ou em casa não há sossego. Falar ao telefone, assistir a TV, conversar, dormir, é quase impossível. Mais, se o cidadão reclama é destratado e sofre represálias desses rapazes que pedem indulgência por serem fruto da desigualdade social. A toda hora tem um desses “divulgadores” do material fecal da usina musical mirando suas “cornetas” tonitruantes em direção a quem não quer escutá-las. Se alguém reclama, logo é rechaçada e em tom ameaçador e cônscio da impunidade ouve, como já vi, “venha baixar, venha desligar”.


A poluição sonora é, para a Organização Mundial da Saúde, uma das mais graves agressões ao homem. Para a OMS, o limite tolerável é de 65 dB, acima disso danifica os ouvidos. Para trabalhadores expostos ao barulho os malefícios a saúde vão desde náuseas e cefaléias, passando por distúrbios neuro-vegetativos até efeitos psicológicos. Ainda causa redução da produtividade e aumentam os acidentes e o absenteísmo, i.e., o barulho causa prejuízos à economia da cidade. Por se tratar de problema social difuso, a poluição sonora deve ser combatida pelo poder público, pois o sossego coletivo deve ser mantido, ou retomado no caso de Campina Grande.


A poluição enfeia a cidade. Diariamente se despejam quilos de papel propagandeando de planos de saúde a curandeiros. Postei-me em uma esquina e vi que as pessoas recebem papéis, não os lêem e os levam ao chão. Dias atrás, entre o Shopping Popular Edson Diniz e o Calçadão da Cardoso Vieira, via-se um rastro de papel que encobria as calçadas. Neste dia choveu forte sobre a cidade. Desnecessário dizer para onde foi todo esse papel já que os servidores da limpeza pública estavam em greve. É esta a imagem que os turistas, que visitam Campina Grande no período junino, levem de nós. E esta é a forma como nos vemos – sujos, mal educados, egoístas, poluidores, etc.


Ainda temos outras situações em que o cidadão é achincalhado: há os que usam as calçadas para comercializar produtos (inclusive roubados); e como ruim é transitar pelas ruas, pois os veículos são estacionados nas calçadas; e as lojas que querem atrair clientes pelo barulho e não pelas mercadorias que vendem. Lamenta-se que alguns não percebam que o espaço, por ser público, é de todos e não deles que pensam ter recebido da providência direitos divinos.



E como se responsabiliza o poder público por este estado de coisas? Ele é sim fruto de uma deseducação sem fim das pessoas, mas dá-se, também, pela desregulamentação do modo de se usar os espaços públicos e pela forma como os poderes lidam com o meio ambiente. Existe em nossa cidade a idéia corrente que cuidar dele é distribuir mudas de plantas e proibir fogueiras no mês junino. O mito encobre as variadas formas de se degradar o meio ambiente. Existe conivência do poder público para com os descalabros aqui citados. Gestores e parlamentares não tomam medidas por (1) recearem perder votos dos que se sintam prejudicados e (2) por, quando candidatos, precisarem também poluir o meio ambiente com suas propagandas eleitorais. Quem esqueceu o barulho intenso da eleição de 2008? Candidatos falavam, em seus guias eleitorais, em defender o meio ambiente e iam às ruas poluí-lo com seus carros de som, passeatas, carreatas, panfletos, etc.


E que não se diga que não existem leis para combater tudo isso. Não precisa reinventar a roda, basta apoiar-se na Lei Orgânica do Município de Campina Grande. Nela é dito que a prerrogativa de proteger o meio ambiente e assegurar uma saudável qualidade de vida é do município. Cabe a administração munícipe estabelecer critérios, normas e padrões de proteção ambiental e fiscalizar instalações, equipamentos e atividades que comportem risco. Nesta Lei, um parágrafo possibilita aos atuais gestores e parlamentares municipais demonstrarem, na prática, o comprometimento com a nossa qualidade de vida. Basta definirem, em lei complementar, a política e o regulamento que coibirá a poluição. Urge que se aprove o Código de Defesa do Meio Ambiente, que dará poderes efetivos à Coordenação de Meio Ambiente para não só promover campanhas educativas como para punir os deliquentes denegridores do meio ambiente.


Para fazer valer direitos e cuidar do meio ambiente não faltam leis, falta vontade política. Os causadores de dolo são os que poluem o meio ambiente, não os que reclamam direitos.

Junho/2009.

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