quarta-feira, 1 de maio de 2013

A seleção paraibana de futebol não vai jogar hoje!





Assim que se soube que o Campinense Clube enfrentaria o Clube de Regatas Flamengo em Campina Grande, pela 2ª fase da Copa do Brasil, um frisson tomou conta dos torcedores do Campinense e de todos os que gostam de futebol. Fiquei entusiasmado, pois finalmente poderia assistir de perto os times que torço se enfrentando numa competição nacional. O caro ouvinte quer saber se tenho algum problema em ver meus dois únicos times do coração disputar uma partida? Não, não tenho nenhum problema com isso. Pelo contrário, acho que vai ser uma experiência única e tenho certeza que será, também, emocionante. Mas, eu não vou usar o POLITICANDO de hoje para falar de minhas paixões futebolísticas.




Hoje, eu vou defender o direito do cidadão de torcer pelo time que ele bem quiser, não importando se este time é ou não da cidade, Estado ou mesmo região onde ele nasceu. É que, no Brasil, a naturalidade de um cidadão não se define pelo time que ele torce. Se fosse assim, times de futebol como Flamengo, Corinthians, São Paulo, Vasco da Gama e Cruzeiro não teriam torcedores espalhados por todos os Estados e regiões desse país que tem, como sabemos, dimensões territoriais de um continente.



Eu sugiro uma reflexão. Antes de chamarmos de “paraibacas” os torcedores paraibanos que vão torcer pelo Flamengo, e não pelo Campinense, que tal pensarmos no processo que levou o futebol a se tornar nosso esporte nacional e nossa maior paixão coletiva.“Paraibaca” é uma forma agressiva e preconceituosa que se usa para chamar aqueles que, mesmo sendo paraibanos, torcem por um time do Sudeste. Os que usam esse termo devem desconhecer os fatores históricos que nos levaram a esse estado de coisas.



A partir de 1937 as rádios passaram a transmitir, em cadeia nacional, jogos dos times de futebol que mandavam jogadores para a Seleção Brasileira. É que o ditador-presidente, Getúlio Vargas, via nisso uma forma de integrar o país em torno do governo federal. Depois, quando já vivíamos à sombra das chuteiras imortais, como dizia Nelson Rodrigues, e quando já tínhamos a seleção tricampeã do mundo ficou quase impossível impedir que se torcesse, pelo Brasil afora, pelos grandes times de futebol.



Como impedir que se torcesse pelo Santos de Pelé, pelo Botafogo de Garrincha, pelo Flamengo de Zico, pelo Fluminense de Rivelino? Como querer que o torcedor paraibano não se encantasse, ao ponto de se tornar um torcedor, com esses artistas da bola? Por causa disso, torcedores pelo Brasil afora começaram a criar o que eu chamaria de filiais de suas paixões. Vejam que no Piauí existe um Flamengo, na Bahia temos um Fluminense, sem contar os “atléticos”, “esportes” e “américas” espalhados pelo país.



A televisão teve papel importante nisso. Mais não foi o futebol quem se valeu da TV para se nacionalizar. Foi o contrário. Foi Walter Clark quem sugeriu que a Rede Globo transmitisse jogos de times do Rio de Janeiro e São Paulo para todo o Brasil. A ideia era boa, pois quem não iria querer assistir ao vivo aquilo que se tornou nossa própria identidade cultural? A TV foi sendo levada pelo futebol para onde quer que houvesse um torcedor ávido por assistir um bom jogo e, quem sabe, uma boa novela.



O cinema teve sua importância nisso. Entre os anos 70 e 80 eu tinha duas grandes diversões aos domingos. Uma era ir ao Estádio Amigão ver o Campinense Clube jogar. A outra era ir para as matinês do Cine Capitólio ou do Cine Babilônia. Além dos filmes, assistíamos ao Canal 100, um cinejornal que trazia notícias da semana e variedades, além de fazer propaganda da ditadura militar. A parte mais esperada era a do esporte. Em geral, um clássico do campeonato carioca ou paulista era apresentado. O Canal 100 era o casamento entre o futebol e o cinema. Nelson Rodrigues disse que o Canal 100 “inventou nova distância entre o torcedor e o craque em plena cólera do gol. Tudo o que o futebol possa ter de lírico, dramático, patético e delirante era ali apresentado”.


 


Não foi difícil para mim, que torcia pelo Campinense, torcer, também, pelo Flamengo. Assim como não foi difícil para amigos meus, que torciam pelo Treze, passarem a torcer pelo Vasco da Gama ou pelo Corinthians. Era uma questão de identificação. Assim, vejo com naturalidade que um paraibano torça por um time local e por outro do Sudeste. Se o jogo de logo mais fosse entre a Seleção de Futebol da Paraíba e a Seleção do Rio de Janeiro, aí sim deveríamos torcer pelo nosso Estado. Mas, não é o caso.



Os times que jogam hoje materializam paixões. Quem conseguir explicar racionalmente essa questão que peça a um trezeano para torcer pelo Campinense. Eu não peço, pelo contrário, defendo o amplo direito de cada um torcer por quem bem quiser. Deixemos de lado esse bairrismo tolo de que se não é de nossa terra deve ser rechaçado. Esqueçamos esse complexo de vira-latas “nelson rodriguiano” de que somos os pequenos Davis que devem se unir para enfrentar o grande Golias. Se por acaso você vai torcer contra o Campinense, não se preocupe se vão te chamar de “paraibaca”. Afinal de contas seu compromisso, hoje a noite, não é com o estado ou cidade onde nasceu e sim com seu time do seu coração.


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