Professor do Curso de História da Univ. Estadual da Paraíba desde 1993. Mestre em Ciência Política-UFPE e Doutorando em Ciência da Informação-UFPB. Especialista em História do Brasil, com ênfase na Era Vargas e na Ditadura Militar, na democracia e no autoritarismo. Autor dos livros "Heróis de uma revolução anunciada ou aventureiros de um tempo perdido" (2015) e “Do que ainda posso falar e outros ensaios - Ou quanto de verdade ainda se pode aceitar” (2024), ambos lançados pela Editora da UEPB.
sábado, 9 de abril de 2016
PONTO A PONTO COM GILBERGUES SANTOS
Entrevista no Programa Ponto a Ponto, com o Jornalista Paulo Roberto da TV Itararé, sobre o 52º ano do golpe civil-militar de 1964 e a atual conjuntura politica brasileira.
Não por acaso, a entrevista foi ao ar exatamente no dia 31 de março de 2016, em um dia que só se falava em golpes, impeachment presidencial e do descontrole político institucional que enfrentamos,
A entrevista serviu, ainda, para divulgação do livro "HERÓIS DE UMA REVOLUÇÃO ANUNCIADA OU AVENTUREIROS DE UM TEMPO PERDIDO", lançado pela Editora da Universidade Estadual da Paraíba, onde analiso o comportamento politica da esquerda brasileira durante o regime militar.
quarta-feira, 6 de abril de 2016
O abismo em que nos lançamos
Já dizia Tom Jobim que o
Brasil não é para principiantes. E não é mesmo, pois o governo dos EUA financiava
os “brasilianistas” para nos tornar palatáveis aos seus quereres interesseiros.
Já para Millôr Fernandes o fundo do poço, no Brasil, é só uma etapa. Porém, ao
que tudo indica, passamos do nível fundo do poço, mesmo que não se possa precisar
quando chegaremos às infinitas profundezas onde não há piso nem teto. Vivemos
em uma zona nebulosa. A “gray zone”, como gostam de dizer os cientistas
políticos, seria aquela situação em que nem nos tornamos uma democracia
consistente e nem retroagimos para um regime de força militarizado ou não.
Nossa convulsionada
conjuntura nos faz crer que estamos numa dimensão onde os corpos (políticos) se
batem descontroladamente, onde as leis da gravidade democrática não agem. Vivemos
num buraco negro onde impera um sistema de força econômica e juridicamente assimétrico,
demandado pelos interesses de um mundo coorporativo (leia-se empreiteiras)
corrompido e corruptor e por uma elite político-partidária despida de seus,
poucos é bem verdade, pruridos republicanos. Senão, vejamos.
O vice-presidente missivista
e conspirador-mor da República, Michel Temer, quer, junto com seus asseclas, o
impeachment da presidente Dilma mesmo que isso reforce nossa fama de república bananeira
pelo mundo afora. Temer sabe que só será presidente pela via golpista, já que não
dispõe da matéria prima que alimenta nossa frágil democracia eleitoral, o voto.
Afinal que país é esse em que seu maior partido politico, PMDB, mantém um pé na
situação e outro na oposição? Que partido é este que diz não fazer mais parte
do governo, mas segue ocupando cargos em todos os escalões?
Derrotados nas últimas
quatro eleições não aceitam às incertezas do jogo democrático e não suportam mais
ser oposição. Querem o conforto que a situação oferece, pois só são democratas
estando no governo. Uma vez na oposição usurpam o poder ante a possibilidade de
terem pela via golpista o que não conseguem pela via eleitoral. Os que querem
Dilma longe do Palácio do Planalto prospectam propinas na Petrobrás, em Furnas,
no Banestado, no Rodoanel e na Companhia Paulista de Trens Metropolitanos. Os
arautos do impeachment, afanadores de verbas da merenda escolar, querem depor Dilma
pelas tais pedaladas fiscais na falta de um argumento crível. Impedir um governo
de exercer seu mandato eletivo através de uma farsa rocambolesca, como a que vemos
no Congresso Nacional, é, como diriam os alemães, um putsch!
A presidente é chamada
de ladra por uma gente que veste verde-e-amarelo para esconder o preto fascista
que trás por dentro de suas camisas. Dilma não foi indiciada, sequer declarada
suspeita, nem denunciada pelo Ministério Público. Ela não foi condenada por
crime algum, mas é atormentada por um conjunto de forças politicas, econômicas
e das comunicações que querem impô-la aquilo que tão bem merecem. Ver o grã-tucanato
quatrocentão de São Paulo e alhures, dedo em riste, acusando a presidente é um
acinte a nossa inteligência. O “maestro soberano” tinha mesmo razão.
O presidente da Câmara
dos Deputados e delinquente-mor da República, Eduardo Cunha, comanda o processo
de impeachment da Presidente através de uma comissão onde mais da metade de
seus parlamentares são indiciados. O que mais esperar de um país onde os
executores de um impeachment presidencial são réus em processos de corrupção e
até de homicídio? A regra básica do direito que diz que o juiz não pode ter
participado dos atos que julga é no Brasil, tal qual o fundo do poço, apenas
uma etapa rumo ao buraco negro da mais ampla inconstitucionalidade.
Um juiz opera no limite da
irresponsabilidade se vendo acima e além das instituições e da sociedade.
Sérgio Moro, togado pelos interesses de um partido politico, inspirado no modus operandis do fascismo italiano, pulveriza
direitos dos que tem como inimigos ao abusar de escutas invasivas, vazamentos
seletivos e do incitamento ao linchamento midiático. O ativismo judicial de
Moro atenta contra a mínima ideia de Estado democrático. Só mesmo num Estado
fascista um juiz de 1ª instância divulga conversas telefônicas da presidente da
República passando por cima da Suprema Corte.
A assimetria da justiça
brasileira salta aos olhos quando impõe um procedimento de condução coercitiva
a um ex-presidente e engaveta investigações contra um senador da República,
ex-candidato a presidente, sobre quem pairam suspeitas e acusações de toda
sorte. Um exemplo de assimetria deslavada? As contas da campanha eleitoral de
Dilma estam sendo escarafunchadas. Mas, porque não se investiga as contas de
Aécio Neves quando se sabe que ele foi, também, agraciado pelos cobres da
Odebrecht? A justiça deve emparedar os corruptos, mas sem essa seletividade
mórbida ecoada pelos meios de comunicação. Supor que só um sistema de força é
capaz de abater a corrupção é uma visão pueril dos manifestantes dominicais e
um oportunismo dos que são sistematicamente barrados pelas urnas. Se ditaduras
fossem solução para a corrupção, seríamos o povo mais honesto do mundo!
Os corruptos devem ser
punidos, mas que se faça isso dentro do Estado de Direito, respeitando a
Constituição, pois não basta um Estado ter leis (rule of law), onde se espera
que todos a respeitem. Isso não permite saber se as instituições conseguem
cumprir seus papéis adequadamente. É preciso que Estado e governo sejam pela
lei (rule by law) que deve ser justa e propiciar a distribuição do bem-estar. A
injustiça é praticada na sua forma mais perversa quando é instituída por uma
determinação legal. Se uma injustiça é formalizada pela lei dificilmente
pode-se dela defender. É isso que estamos vendo agora. O Congresso Nacional
assumiu o papel, que em 1964 coube as Forças Armadas, de encontrar as
justificativas legais para depor a presidente da República. Daqui a vinte anos vamos
estudar isso como o “golpe parlamentar de 2016”.
Completamos 31 anos do
pacto que pôs fim ao regime militar e que chamamos imprecisa e erroneamente de
“Nova República”. Foi em 1985 que a liberalização “lenta, segura e gradual” (iniciada
pelo general-presidente Ernesto Geisel) se determinou. Naquele ano um general (João
Figueiredo) deixava o governo e um civil (José Sarney) assumia. Uma simples
troca de nomes nos legou o atual sistema democrático. Saímos de uma ditadura de
21 anos e entramos num sistema representativo sem fazer uma transição politica
relevante. Sequer pudemos investigar, julgar e condenar os que praticaram
crimes, como a tortura, durante a ditadura. Este pacto exauriu-se.
A “Nova República” vive
seus estertores. Os adversários na ditadura contrataram que não resolveriam
suas diferenças para conviverem pacificamente na democracia. Como não
resolvemos as contradições que trouxemos do regime militar, seus fantasmas e
esqueletos assombram esse sistema que vive de formalismos democráticos sob uma
couraça de autoritarismo. Como não sabemos resolver nossos dilemas
institucionais respeitando preceitos democráticos, parte da sociedade resolveu
que é hora de mais um reverso autoritário, mesmo que o golpe tenha essa feição
parlamentarista. A outra parte da sociedade não embarcou em aventuras golpistas
e se mobiliza em defesa da democracia. Menos mal, alivia, mas não resolve. E já
é hora, então, de questionar porque insistimos em viver rumo ao abismo, onde as
incertezas prosperam?
Abril/2016.
terça-feira, 5 de abril de 2016
O golpe civil militar de 1964 e a atual conjuntura política do Brasil
Dentro das ações alusivas aos 10 anos do Centro de Ciências Humanas
e Exatas (CCHE), em Monteiro/PB, e dos 50 anos da Universidade Estadual da
Paraíba (UEPB), o Campus VI da Instituição realiza neste mês de
abril uma série de palestras sobre temas que envolvam o papel da universidade
na produção do conhecimento e na formação de sujeitos críticos.
A primeira atividade foi realizada na quinta-feira (7), às
19 horas, no Auditório do Campus de Monteiro, com a palestra do professor
Gilbergues Santos, do Departamento de História do Campus I, com o tema “O golpe civil militar de 1964 e a atual
conjuntura política do Brasil”. Segundo o palestrante a atividade se deu “a
propósito do 52º ano do golpe civil militar de 1964, que instalou uma ditadura
que durou de 21 anos, e da atual conjuntura politica onde tanto se fala de
golpes e de nossas fragilidades democráticas (...) trataremos dos motivos que
fazem as memórias do regime militar ainda nos serem tão vivas”.
Após a palestra, o professor Gilbergues Santos lançou seu livro “Heróis de uma revolução anunciada ou aventureiros de um tempo perdido?”,
editado pela Editora da Universidade Estadual da Paraíba (EDUEPB).
sexta-feira, 1 de abril de 2016
Publiquei hoje este artigo no Site do
UOL (http://noticias.uol.com.br/opiniao)
a propósito dos 52 anos do Golpe Civil-Militar de 1964 e de nossa atual
conjuntura politica.
Política
GILBERGUES
SANTOS
Atores políticos não podem ceder às tentações de
mudar as regras do jogo e devem concordar com as incertezas democráticas dos
resultados
Gilbergues Santos
Especial
para o UOL 01/04/2016 06h00
Passados 52 anos do golpe civil-militar de 1964 temos que
reavaliar o fato histórico, pois à medida que nos distanciamos temporalmente do
acontecimento nossa visão sobre ele muda. Assim, temos que redimensionar o 31
de março para nossos dias. É preciso refletir sobre a cultura política
pretoriana herdada da ditadura militar, já que em nossa atual conjuntura só
falamos de golpes de toda sorte e das ameaças que nossa frágil democracia segue
sofrendo.
Por que as memórias do golpe e da ditadura militar ainda nos são
tão vivas? Seria pelas feridas ainda não cicatrizadas e por termos uma
sociedade e um Estado recheados de "entulhos autoritários", que um
débil processo de liberalização não foi competente para extrair do nosso
entorno político?
A principal causa para o golpe de 1964 foi a tensão (um falso
dilema) existente entre democracia e mudanças sociais. O amplo espectro
político-partidário nacional antagonizava esses dois fatores,
desnecessariamente. Os atores políticos à direita acreditavam que pela
democracia poderia se chegar às mudanças sociais, e por isso deram o golpe. Os
atores à esquerda defendiam que só teríamos mudanças sociais acabando com a
democracia. O confronto entre as forças políticas contrárias e favoráveis às
reformas de base destruiu as instituições democráticas. O resultado a que se
chegou bem conhecemos: democracia inexistente e nenhuma reforma social!
O processo de liberalização política (notem que não falo em
redemocratização ou transição), efetivado com a eleição de Tancredo Neves, é
torto, pois não afastou do cenário nacional os atores políticos da ditadura. O
que nós tivemos foi um pacto entre as forças políticas, iniciado ainda em 1974
e capitaneado por Ernesto Geisel e Golbery do Couto e Silva. O resultado foi um
processo em que lentamente se foi inserindo alguns elementos do ritual
democrático nas instituições sem, no entanto, reformá-las e, principalmente,
mantendo intocada a espinha dorsal do regime ditatorial: o poder militar.
Se democracia política são os mecanismos e práticas associados às
formas de decidir em favor dos interesses sociais –além das normas que regem o
bom funcionamento das instituições e as atitudes que marcam a relação entre
elas e a sociedade civil–, veremos que não temos uma democracia consolidada.
Não tivemos um processo em que sociedade civil e Estado pudessem firmar um
compromisso para banir as prerrogativas que os militares atribuíram para si
durante 21 anos. Como na ditadura, e seguindo a lógica da Doutrina de Segurança
Nacional que dizia que o inimigo a se combater estava dentro do território
nacional e não fora dele, as Forças Armadas continuaram mais preocupadas com a
segurança interna do que com a externa.
Vivemos um momento difícil por não percebermos o quanto ainda temos
que avançar no sentido de efetivarmos uma democracia em que aqueles que detêm
as armas irão obedecer aos que não as tem. É preciso, também, que os atores
políticos não cedam às tentações de mudar as regras do jogo político enquanto
ele estiver sendo jogado, além de concordarem em se submeterem às incertezas
democráticas dos resultados. Falta-nos, ainda, aceitar que democracia tem um
valor universal. Infelizmente tinha mesmo razão Millôr Fernandes quando dizia
que "ditadura é você mandar em mim e democracia sou eu mandar em
você!".
GILBERGUES
SANTOS
é cientista político e professor da UEPB (Universidade Estadual da
Paraíba)
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