terça-feira, 7 de fevereiro de 2023

Quando a extremosa destra atacou a República e como desmilitarizar\desbolsonarizar o Brasil

 

(Foto: Adriano Machado/Reuters)

O levante terrorista em Brasília só aconteceu porque não controlamos o poder militar e porque, claro, não somos uma democracia.

Começo este artigo lembrando que “EU JÁ SABIA, QUE EU AVISEI!”, pois insisti bastante, entre os meses de novembro e dezembro do ano passado, que só teríamos paz se a extremosa destra fosse retirada da frente dos quarteis. O fato é que o levante terrorista em Brasília só aconteceu porque não controlamos o poder militar e porque, claro, não somos uma democracia. Lembro, ainda, que um ditador precisa de um fato histriônico para chamar de seu. Mussolini teve a “Marcha dos camisas pretas sobre Roma”, em 1922; Hitler teve o “Putsch da Cervejaria”, em 1923; Donald Trump teve a “Invasão do Capitólio” em 2021. Agora, Jail Bozo tem sua “intentona terrorista” com hordas da extrema direita violentando a capital do país. É certo que fracassaram, mas os danos e custos são muitos e graves.
A Rede Globo insistiu, em seus editoriais, que a democracia venceu. Os três poderes (Executivo, Legislativo e Judiciário) afirmaram e afirmam que as instituições estão funcionando e que nossa democracia é sólida. Mas, devo lembrar, que a tragédia de Brasília só ocorreu porque não somos uma democracia, mesmo que nos utilizemos de alguns procedimentos democráticos. Se fôssemos uma democracia consistente, Jail Bozo estaria preso desde quando elogiou um notório torturador numa certa sessão do Congresso Nacional em 2016. Se a democracia tivesse realmente vencido, a extremosa terrorista não teria atacado os três poderes da República! SIMPLES ASSIM!
Se fôssemos uma democracia efetiva as Forças Armadas não usariam prerrogativas, trazidas da ditadura militar, para ancorar atentados terroristas. O fato é que o Exército deu suporte ao bolsonarismo nazificado que acampou, não por acaso, em frente a seus quartéis. De fato, existe uma cadeia de comando sobre os atos terroristas em Brasília. Existe uma organização (criminosa) que atuou nos locais onde o “gado patriotário” se aglomerou, passando, claro, pelos que bancaram essa festa macabra, e que foi até o alto comando das Forças Armadas e de setores do mercado e do grande capital. Será que é tão difícil entender isso?!
Gostávamos de supor que a extremosa iria enfraquecer e se desarticular. Mas a serpente golpista se alimentava, nos acampamentos, com nutrientes vindos dos quartéis. Nos divertíamos com memes e patacoadas patriotárias enquanto o ovo da serpente era chocado nos acampamentos paramilitares Brasil afora. A serpente cresceu e virou um monstro pronto para nos devorar.
Se tivéssemos um efetivo controle sobre o poder militar, ele não se voltaria contra as decisões que tomamos nas urnas. Isso só acontece por causa das tais prerrogativas militares e dos entulhos autoritários, como o artigo 142 e a Lei da Anistia, que o processo que nos trouxe da ditadura militar até aqui foi incapaz de erradicar. Quer um exemplo? A insubordinação dos militares que, descumprindo ordens da justiça e do governo, impediram que a polícia, não por acaso militarizada, retirasse a horda terrorista do acampamento-mor em Brasília. Basta ver o comportamento pusilânime do Ministro da Defesa para entender tudo. A leniência de José Múcio para com os militares beirou a prevaricação.
A democracia perdeu mais uma batalha quando a extrema direita terrorista perpetrou esse doloroso golpe bem no coração da República. É certo que medidas foram tomadas,  mas é preciso cortar a cabeça da serpente acabando com as prerrogativas militares e submetendo as Forças Armadas ao poder civil. É isso ou nunca teremos democracia, nem paz. Para que o terror não volte a agir contra nós, temos que expurgar as Forças Armadas e as Instituições coercitivas. Temos que desmontar a tutela que os militares exercem sobre nós. O que aconteceu em Brasília pode ser uma janela de oportunidades para uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que possa, por exemplo, criar um artigo que impeça os militares de atuarem na política.
 No entanto, preciso demonstrar que “desbolsonarizar” não é a mesma coisa de “desmilitarizar”, mesmo que os dois conceitos façam parte de um amplo projeto de DEMOCRATIZAÇÃO da nossa sociedade, tão acostumada ao autoritarismo.
Após a 2ª Guerra Mundial, os Aliados promoveram a desnazificação da Alemanha. Mas, para remover os entulhos nazistas usaram líderes e funcionários da ditadura hitlerista. Como podemos perceber, a desnazificação alemã não conseguiu pôr fim ao nazismo. É que nem sempre o veneno da cobra salva a vítima picada pela cobra. Não é à toa que, em dezembro de 2022, a justiça alemã prendeu 25 terroristas de extrema direita que pretendiam golpear o Estado alemão. Como se vê, não é só no Brasil onde terroristas tentam dar golpe de Estado!
E já é hora de sugerir a você, cara(o) leitora(o), que assista os documentários “O inimigo do meu inimigo, a vida clandestina de Klaus Barbie, o Açougueiro de Lyon” (2009), do diretor escocês Kevin Macdonald (que também dirigiu “O último rei da Escócia”) e “A arquitetura da destruição” (1989), do diretor sueco Peter Cohen, que fez também “Homo Sapien 1900”. Assim você entenderá porque a “cadela do nazi-fascismo está sempre no cio”, como diria Berthold Brecht.
O passo inicial para “desbolsonarizar” o Brasil foi dado quando vencemos Jail Bozo nas eleições. Mas, foi só um passo. Este processo segue com a punição dos bolsonaristas que atentaram contra a República. Como se diz por aí: ANISTIA É O C...  ENFIM! Mas, o que vamos fazer com o eleitorado bolsonarista? Temos que chamá-lo de volta à razão. Ele têm que ser responsabilizado politicamente pelo 08\01 e têm que entender que o apoio dado a um fascista criminoso, do quilate de Bolsonaro, é causa da tragédia de Brasília.
Mas, somos uma sociedade militarizada. O Exército entrou na política e se ocupou das questões sociais desde que deu o golpe de Estado que proclamou a República. Nos 21 anos em que nos governou, sob uma ditadura, militarizou a sociedade e as instituições para atender a seus interesses. O pacto que gerou a tal da “Nova República” incluía manter prerrogativas pelas quais militares são capazes de tudo, até se aliar a um desqualificado como Bolsonaro, que tinha claro projeto de tornar o Brasil uma ditadura. Então, o que é preciso fazer para desmilitarizar o país? Primeiro, as Forças Armadas não podem agir como Poder Moderador da República, tal qual fazia Pedro I no Império. Precisam saber que não pairam para acima e além do Estado. Na verdade, as Forças Armadas precisam ser despolitizadas, deixar de se comportarem como partido político e assumirem seu real papel que está, não por acaso, na Constituição.
Temos indícios promissores. O presidente Lula excluiu da Comissão de Anistia militares que foram postos lá por Jail Bozo, exonerou do Gabinete de Segurança Institucional (GSI) militares comprometidos com o golpismo e desinfectou bolsonaristas da Polícia Federal e da Polícia Rodoviária Federal. A ministra Rosa Weber, atual presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), suspendeu o decreto de indulto natalino pelo qual o ex-presidente Bolsonaro concedeu, graciosamente, anistia aos policiais condenados pelo Massacre do Carandiru em 1992. É aqui que desbolsonarização e desmilitarização se encontram.
Bastante relevante foi Lula ter demitido o General Júlio César de Arruda do comando do Exército. Foi ele mesmo quem impediu que bolsonaristas terroristas, acoitados no acampamento-mor de Brasília, fossem presos ainda na noite do 08\01. Este general desobedeceu ordens do próprio Ministro da Justiça, Flávio Dino, que seguia determinações do presidente da República, para que os vândalos golpistas fossem detidos. Ou seja, o general se insubordinou, desobedeceu, ordens que vinham diretamente do Comandante em Chefe das Forças Armadas. Foi mais uma situação, de tantas, em que o poder militar recusou se submeter ao poder civil.
Com esse ato, Lula sinalizou às Forças Armadas que elas precisam se subordinar ao poder político, afinal também precisam ser desbolsonarizadas. A Constituição também precisa ser desmilitarizada. Seria bom modificar o tal Artigo 142, no trecho que diz que cabe às Forças Armadas garantir os poderes constitucionais e “por iniciativa de qualquer destes, da lei e da ordem”. A lei precisa ser clara e objetiva, não pode dar margens a interpretações, principalmente àquelas que querem acabar com a democracia.

 

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