Clóvis Rossi nos dá uma ótima definição para accountability. Talvez seja mais fácil explicá-lo pelos exemplos de países como o Brasil – onde “acountabilidade” é algo que inexiste – do que pela realidade de países onde a democracia está consolidada.
Folha de São Paulo – 19 de Julho de 2009.
É proibido silenciar
SÃO PAULO - Uma vez, anos atrás, um acadêmico norte-americano especializado em América Latina (o nome se perdeu nas brumas da memória) comentou comigo que a palavra "accountability" não tem tradução fiel, precisa, nem em português nem em espanhol.
O sentido mais próximo é "prestação de contas". Mas não alcança o mais profundo do conceito, que é o de introjetar a obrigação de render contas de seus atos, especialmente se se é agente público.Posto de outra forma: o funcionário público, de qualquer calibre, tem marcada na alma a certeza de que deve explicações ao público, mesmo quando o público não as esteja pedindo.
É essa consciência, indispensável à construção da República, que o senador José Sarney demonstra não possuir, ao recorrer a uma frase de Sêneca para calar-se. Essa história de combater o que chama de "injustiça" com "o silêncio, a paciência e o tempo" não passa de fuga às suas responsabilidades e de traição ao conceito de "accountability" que ele, como funcionário público da mais alta graduação, deveria ser o primeiro a defender.
De quebra, Sarney refugia-se na velhíssima e fajutíssima tese de perseguição da mídia. Não, senador, é perseguição dos fatos, e enquanto eles não forem total e definitivamente explicados, continuarão a persegui-lo, no Maranhão, em Brasília, onde for.
É essa fuga à "accountability" que explica os parlamentares que se lixam para a opinião pública. Ela paga os salários de todo esse "band of brothers", mas eles não se sentem compelidos a dizer ao púbico o que fazem, o que só aumenta a suspeita de que o que fazem só cabe mesmo em BOs.O caso de Sarney é mais grave porque tem um espaço semanal, aqui ao lado, em que poderia dar todas as explicações sem ser interrompido por perguntas. Prefere mudar de assunto. Sempre.
Professor do Curso de História da Univ. Estadual da Paraíba desde 1993. Mestre em Ciência Política-UFPE e Doutorando em Ciência da Informação-UFPB. Especialista em História do Brasil, com ênfase na Era Vargas e na Ditadura Militar, na democracia e no autoritarismo. Autor dos livros "Heróis de uma revolução anunciada ou aventureiros de um tempo perdido" (2015) e “Do que ainda posso falar e outros ensaios - Ou quanto de verdade ainda se pode aceitar” (2024), ambos lançados pela Editora da UEPB.
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