Coerente com a atual conjuntura brasileira, onde a necessidade de
se rever nosso passado autoritário deixou de ser uma opção, é que A COMISSÃO DA
VERDADE E DA PRESERVAÇÃO DA MEMÓRIA (CVPM) está sendo criada na Universidade
Estadual da Paraíba. Foi considerando isso, além do fato de que a UEPB tem uma
profunda inserção histórica e política na sociedade paraibana, que o Reitor,
professor Rangel Junior, promoveu a criação da CVPM/UEPB.
O momento não poderia ter sido mais propício, pois “coincide” com a
inauguração de uma Comissão similar na Universidade Federal de Campina Grande
(UFCG). O ato foi recheado de simbolismos. Foi nele que o antigo Auditório
Guilardo Martins (ex-reitor da Universidade Federal da Paraíba e contumaz
colaborador da ditadura militar) passou a ser denominado de Auditório João
Roberto de Souza Borges, um líder estudantil que foi perseguido durante o
período militar tendo, inclusive, desaparecido no período. Em 1969, João
Roberto morreu afogado em um açude, na cidade de Catolé do Rocha, num episódio
que nunca foi devidamente esclarecido.
A CVPM/UEPB terá objetivos bem definidos, tendo como principal o de
efetivar um trabalho de pesquisa, no âmbito da própria Instituição, para que se
possam descobrir ações que de alguma maneira tenham afetado a UEPB. A Comissão
buscará descobrir quantos e quais foram os seus professores, estudantes e
funcionários que chegaram a ser perseguidos por ações, atos, decretos e outras
formas que caracterizavam o modus
operandis do regime militar vigente à época.
Para ficar um caso, lembremos o de José Filho que, sendo presidente
do Diretório Central dos Estudantes, sofria perseguições de forma que suas
atividades pudessem ser acompanhadas de perto. Mesmo que não se possa precisar
de que maneira, mas se sabe que José Filho tinha seu direito de ir e vir
cerceado por agentes públicos a serviço do regime miliar. Sabe-se, por exemplo,
que ele foi chamado várias vezes para depor na primeira metade da década de 70,
ou seja, no momento de aguçamento da repressão política efetivada pelo Estado
brasileiro militarizado.
Outro objetivo da CVPM/UEPB é o de buscar formas de reparação para
os danos que pessoas como José Filho tenham sofrido. A CVPM/UEPB não tem nenhum
poder de investigação criminal/judicial. Mesmo seguindo a lógica que orienta a
criação da Comissão Nacional da Verdade (http://www.cnv.gov.br)
e da Comissão Estadual da Verdade e da Preservação da Memória da Paraíba (http://www.cev.pb.gov.br/) a CVPM/UEPB tem objetivos
próprios que privilegiam aspectos inerentes à história política da UEPB. Na
verdade, a intensão é promover o levantamento de fontes e de informações sobre
este período da nossa história.
É sabido que professores e estudantes da UEPB sofreram os mais
variados tipos de perseguições durante a década de 70. Nada a se estranhar se
considerarmos que as universidades eram alvo prioritário do aparato repressivo
do governo militar por razões um tanto quanto óbvias. Basta lembrar que foi o
Movimento Estudantil, nas universidades públicas, que cedeu parte considerável
de militantes para as organizações revolucionárias que lutaram contra o governo
militar. Os órgãos de repressão eram cientes disso, tanto que monitoravam as
atividades políticas nas universidades brasileiras. Um dos mecanismos de
acompanhamento era a criação, no âmbito das Instituições de Ensino Superior, de
uma espécie de Serviço de Informação que poderia, ou não, abastecer o Serviço
Nacional de Informação (SNI).
Sabemos que à época da Ditadura militar a UEPB possuía um sistema
que reunia informações sobre as atividades políticas (ou não) de seus
professores, alunos e funcionários. Na década de 70, o almoxarifado da
Instituição era administrado por um militar que bem poderia ter a função de
levantar informações sobre tais atividades da comunidade acadêmica. Já nos idos
dos anos 80, quando o regime militar entrava em seu ocaso, foi encontrado um
arquivo na Instituição com nomes de pessoas que supostamente haviam sido
perseguidas politicamente.. Este arquivo contém fichas individuais que trazem
nomes, fotos, funções e, claro, atividades político-acadêmicas desenvolvidas.
Que se tenha claro que o objetivo central da CVPM/UEPB é o da
coleta de documentos e informações que possam subsidiar a produção de um sem
número de trabalhos acadêmicos, ou não, além de oferecer um tipo de informação
de fundamental importância para a sociedade paraibana. Promover transparência
de conhecimentos é o ponto de partido para que se possa, por exemplo, dar
consecução ao trabalho investigativo e a reparação de danos materiais e
imateriais. Ainda poderemos promover a capacitação recíproca de agentes de
Estado e da sociedade civil na medida em que a CVPM/UEPB terá amplas
possibilidade de trabalhar em conjunto com a Comissão Estadual da Verdade e da
Preservação da Memória da Paraíba que foi instituída pelo Governo do Estado da
Paraíba, através do Decreto 33.426, de outubro de 2012.
Inclusive, a finalidade da CVPM/UEPB não difere muito dos objetivos
da Comissão Estadual na medida em que esta foi criada para “buscar (...) o esclarecimento às graves violações de direitos humanos
praticados por agentes públicos contra qualquer pessoa no território da Paraíba
(...) a fim de efetivar o direito à memória e à verdade histórica na edificação
do Estado Democrático de Direito”. A CVPM/UEPB será composta por
representantes dos três seguimentos da Instituição. São eles: professor José
Benjamim Pereira, instituído como presidente; professor Edmundo de Oliveira
Gaudêncio; professor Gilbergues Santos Soares; técnico-administrativo Luan da
Costa Medeiros; estudante do curso de Direito Camilo de Lélis Diniz de Farias.
Julho/2013.
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