terça-feira, 24 de março de 2015

SOMOS UM BANDO DE ARAMIS - Parte II.

O UOL/Folha entrevistou, também, o técnico em contabilidade Tiago da Silva de São Paulo. Tiago é um idólatra do autoritarismo, um néscio que acredita nas tolices que o ex-roqueiro Lobão publica na Revista Veja. Tal qual Aramis, crê que "seria bom (uma intervenção militar) para limpar toda essa sujeira". Ele diz confiar no “Exército para ter um país menos corrupto”. Tiago afirma que “o golpe de 64 foi uma intervenção em defesa da pátria para livrar o país do comunismo e que o abuso de poder de alguns militares foi o lado ruim do período”. O que será para Tiago o “lado ruim do período”? Será que ele leu sobre o fato da tortura ter sido uma politica repressiva do Estado militarizado? O que aconteceria se Tiago soubesse que os militares eram tão corruptos quanto os governos dos tempos da democracia?

Tiago não diferencia a conjuntura de 1964 com está em que vivemos, pois só considera uma intervenção militar pelo “medo de que o Brasil adote o socialismo”. Como assim? É risível falar em socialismo quando vivemos (para o bem e para, bem mais, o mal) uma situação de “pleno capitalismo”. Será que Tiago é dos que acreditam que os governos de Cuba e da Venezuela planejam invadir o país para implantar uma republicana fidelista/bolivariana e que João Pedro Stédile seria o novo ditador brasileiro?

Mas, Tiago é obrigado a conviver com uma incoerência. Mesmo defendendo o fim do governo Dilma, seja por impeachment, seja por intervenção, ele só estuda em uma universidade privada por ter 50% da mensalidade através de bolsa do PROUNI e os outros 50% financiados pelo FIES. Tiago financiou sua casa por um desses programas sociais do governo federal. Se é verdade que a economia move as decisões do cidadão/eleitor, Tiago teria mais motivos para querer que esse governo não acabasse. É ele mesmo que diz que: “Não adianta dar com uma mão e tirar com as duas. A corrupção apaga o mérito desses programas".  

Mas, se é assim, a melhor coisa a fazer seria abrir mão dos tais programas e aderir a um projeto politico autoritário que promovesse desenvolvimento sem corrupção, claro. O problema é que Tiago parece desconhecer que é possível promover desenvolvimento, sem programas assistencialistas, diga-se de passagem, dentro de um sistema político democrático. Mas, não o culpo, Tiago é conseguência dessa cultura politica pretoriana que fomos cevando ao longo do século XX.

Por ingenuidade, por oportunismo ou por terem sido acometidos por essa demência cega que pensa que bater panelas é solução para alguma coisa, Aramis e Tiago se quedam a tese do caminho mais curto para resolver o problema da corrupção que a própria ditadura militar não resolveu, até por que dele se valia para maximizar seus interesses. Conheço alguns Aramis que defendem uma intervenção militar, para acabar com a corrupção, por um colossal desconhecimento de nosso passado autoritário. Apesar de que se a pessoa reúne condições para defender suas ideias autoritárias, numa rede social, bem que poderia ler um livro didático de história para entender porque os militares golpearam as instituições democráticas em 1964.

Sou réu confesso de minhas incompetências por não conseguir explicar o que nos leva a querer um regime de força, para resolver problemas que temos numa sociedade que pratica procedimentos democráticos. Está em nossa cultura politica a contumaz ideia que os militares são os únicos capazes de resolver os problemas que nós, os civis, criamos. Persiste em nosso entorno a ideia, oriunda do movimento tenentista, de que seriam os militares a reserva moral de nossa sociedade. Talvez a antropologia politica possa me ajudar. Tem razão o antropólogo Roberto DaMatta quando diz que “o Brasil não é mesmo para principiantes”.

E já é tempo de perguntar: mas, afinal os que pensam os militares disso tudo? Atenderiam o clamor das ruas? Que o alto comando das Forças Armadas acompanha tudo com olhar atento não resta dúvidas. A questão é: a caserna está se movimentando? Haveria articulações, nos meios militares, para atender ao chamamento dos que imploram por intervenção e golpe? Lideranças civis, a frente dessas arrogantes manifestações, já teriam combinado com lideranças militares para uma espécie de reedição do golpe de 1964?

Eu não creio nisso ou, pelo menos, não disponho de elementos críveis neste sentido. Existe uma nova geração de oficiais de alta patente formados no pós-ditadura militar. Mesmo que concordem com a manutenção do histórico papel politico das Forças Armadas e que não abram mão das prerrogativas (herdadas da ditadura militar e que lhes permite intervir nos poderes constituídos) os militares parecem confortáveis em não terem o ônus de governar, mesmo que possuam o bônus de interferirem nas questões administrativas da República.

As Forças Armadas parecem ter se convencido, ao contrário da sociedade civil, que é mais interessante serem fiadoras desse sistema democrático do que estar a frente de um regime de força que, óbvio, só se sustenta por reprimir seus adversários. Os militares entenderam bem a tese de Elio Gaspari em seu seminal livro “A ditadura escancarada”: “A essência das ditaduras não está naquilo que elas fazem para se perpetuar no poder, mas naquilo que a partir de certo momento já não precisam fazer” (pag. 232).  Na ditadura era preciso sujar as mãos perseguindo as oposições ao regime. Na democracia não precisa mais descer aos porões da coerção, pois a Constituição Brasileira manteve alguns entulhos autoritários a exemplo dos artigos 142 e 144.

Continua amanhã...

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