Certa vez falava disso em sala de aula e um aluno disse que sou um “campinense
que não deu certo”. Tenho lá meus sentimentos em relação à cidade onde nasci, me
criei, constitui família, onde vivo, moro e trabalho. Mas, disse também que
isso não significa que tenha que fazer declarações de amor a minha cidade,
muito menos fechar os olhos para os problemas e defeitos que temos. Uma coisa é
ser campinense. Outra, bem diferente, é ser um “campinista” desses que acham
que Campina Grande irradia para o mundo o trabalho, o desenvolvimento e a paz. Campinista
de quatro costados é aquele que chora ao ver uma reportagem sobre nosso São
João no Fantástico da Rede Globo.
Mas, confesso, não gosto que falem mal de Campina Grande. É que para criticar
Campina tem que ter bebido das águas do Açude Velho e tem que ter ido, pelo
menos uma vez, no Clube Ipiranga. Só censura Campina quem, nas sextas-feiras,
ia ao Clube dos Estudantes Universitários, o “CEU”. Só pode depreciar Campina quem
saía do “CEU”, atravessava a rua, entrava no “CAVE” de Carlinhos e depois
tirava a pé, com o dia amanhecendo, lá para o Catolé para ouvir o Bolero de
Ravel no REFAVELA de Bel.
Eu aceito que você esculhambe Campina se e somente se, pelo menos uma vez,
saiu do REFAVELA e foi a pé, claro, para a Feira Central comer picado de bode
com pão e tomar umas lapadas de cana em D. Maria do picado, lavando tudo com
cerveja no final. E se não tiver comido a tapioca de queijo de coalho com
manteiga da terra de D. Maria é melhor nem abrir a boca. Para mandar ver em
Campina tem que ter ido ao Açude de BODOCONGÓ, no tempo em que ele era um açude,
e que fazia Jackson do Pandeiro cantar “Eu
fui feliz lá no Bodocongó com meu barquinho de um remo só / Quando era lua, com
meu bem, remava a toa / Ai, ai, ai que vida boa lá no meu Bodocongó”.
No final dos anos 1980 Gilberto Gil veio aqui
lançar o Movimento Onda Azul. Numa entrevista, ele disse que “Campina Grande tem uma vontade danada de
ser New York”. Muita gente não gostou. Alguns diziam: “quem ele pensa que é
para vir falar mal de nossa cidade”. Eu fiquei com raiva. Lembro ter dito:
“porque ele não vai falar mal de Salvador?”. Hoje, olhando em perspectiva,
entendo o que Gil quis dizer. É que o campinense é um enxerido por natureza e
exibido por definição. Se não fosse essa vontade de ser New York, de
ser grande, onde estaríamos hoje? Campinense que é campinense não tem o
complexo de vira-latas do qual nos falava Nelson Rodrigue.
Campinense da gema nasce aprendendo a lamber suas feridas, não esquece
nossa vocação para o desenvolvimento e que exalamos política e cultura por
todos os poros. Não fosse nosso complexo de superioridade seríamos quase insignificantes. Como
teríamos conseguido ser a segunda maior exportadora de algodão do mundo se
sofrêssemos de um irremediável complexo de inferioridade? Eu sei que temos que
conviver com o fato de sermos vice-campeões. Mas, dá para concorrer com
Liverpool que deu os Beatles ao mundo? Tudo bem, ficamos em 2º lugar no
algodão, mas quem, no Nordeste, se desenvolveu mais graças um produto agrícola?
Temos o Maior São
João do Mundo! Olha aí nosso complexo de superioridade à flor da pele. É como
se olhássemos de cima para baixo para todo o Brasil e disséssemos: “somos os
fiéis depositários da cultura popular tupiniquim”. Dai que a prefeitura
municipal bem que poderia se valer dessa vontade danada de ser New York. Bem
que poderia colocar um portal colossal, à entrada de quem vem da capital,
anunciando não uma marca de cervejas, mas que se está chegando à cidade que faz
a maior festa popular do mundo, quiçá da Via Láctea. Quem tem complexo de
superioridade não deve ter vergonha de nada. Temos que nos orgulhar até dos
nossos problemas urbanos, pois só os tem quem é grande. Agora, que estamos em
período eleitoral, decidi que vou votar naquele que prometer que vai transforma
Campina Grande na New York do sul do Equador.
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