Neste DO QUE AINDA
POSSO FALAR lembro do OO7, o agente de sua majestade que tinha licença para
matar. Em “Quantum of Solace”, ele caça um falso ambientalista de uma
organização criminosa, que financia um golpe militar na Bolívia para controlar
suas reservas de água. O que o vilão quer é
engarrafar a água boliviana para depois vende-la. Bond, James Bond, vai lá e
salva tudo, claro! Lembrei disso após o Senado brasileiro aprovar um projeto
que, guardando as devidas proporções, prevê a mesma coisa. 65 senadores votaram por um novo marco
regulatório para a o uso da água e do saneamento básico no Brasil. Ao invés de
proteger a água, ou seja, a vida e a saúde do povo, eles privatizaram o
“imprivatizável”. A água é “propriedade” da natureza que nós, seres humanos,
usamos e abusamos. Com o sistema público deixando de ser
responsável único pelas águas, a iniciativa privada entra para tornar o
manuseio delas um negócio rentável. A consequência é que, sem os investimentos
públicos, só haverá água de qualidade para os que podem pagar, caro, pelos
serviços. Um amigo me disse que vamos terminar tendo que escolher entre tomar
a água ou usá-la para lavar roupas e pratos. O tal marco extingue o modelo
atual, de contrato entre municípios e empresas estaduais de água e esgoto, tornando-o
uma concessão com empresas privadas. A discussão sobre a privatização da água
e do saneamento aconteceu sempre num viés pró-mercado e antissocial. Seguimos
no caminho inverso ao de países que reestatizaram seus sistemas. Na Alemanha,
França, Canadá, Bélgica, todos países liberais, defensores do tal Estado
Mínimo, se entendeu que a água é um bem público que não pode ter donos. E no que Brasil, o que se fez? Se
permitiu a privatização das empresas, que respondem pelo atendimento de 90% da
população, para que elas passem a atender apenas os 10% que podem pagar caro
pela água. Será que vamos ter que chamar o James Bond para nos salvar?
Professor do Curso de História da Univ. Estadual da Paraíba desde 1993. Mestre em Ciência Política-UFPE e Doutorando em Ciência da Informação-UFPB. Especialista em História do Brasil, com ênfase na Era Vargas e na Ditadura Militar, na democracia e no autoritarismo. Autor dos livros "Heróis de uma revolução anunciada ou aventureiros de um tempo perdido" (2015) e “Do que ainda posso falar e outros ensaios - Ou quanto de verdade ainda se pode aceitar” (2024), ambos lançados pela Editora da UEPB.
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