terça-feira, 24 de março de 2020

Da Série: "LIVROS, DISCOS E FILMES QUE FIZERAM MINHA CABEÇA"


Em tempos de isolamento social, por causa da PANDEMIA, uma dica de leitura que vem bem a calhar é "A PESTE" de Albert Camus, numa tradução de Graciliano Ramos. Este livro foi publicado no Brasil pela histórica LIVRARIA JOSÉ OLYMPIO EDITORA em 1973.

A cidade de Oran, uma possessão francesa na costa da Argélia, norte da África, é atingida pela peste bubônica. De repente, ratos começam a morrer aos montes. Rapidamente, a população da cidade é atingida. Camus fala como é viver numa cidade sitiada pela peste. 
São vários personagens, cada um com suas Idiossincrasias, vivendo as angústias de um tempo difícil. É o editor quem diz: “Na cidade sitiada pela peste, pequeno mundo fechado em si mesmo com um sem número de problemas pessoais associados ou paralelos aos problemas de toda a coletividade...”. 
É impossível, não associar Oran, conflagrada pela peste, com o mundo em que vivemos sitiado pelos dois vírus mais perigosos dos dias de hoje: o coronavirus e a ignorância.


Na mesma direção de “A PESTE”(de como reagimos às tragédias sociais e pessoais) temos Franz Kafka, um dos escritores mais relevantes do século XX, nascido na Tchecoslováquia em 1883, mas que escrevia em alemã, talvez porque pudesse via a concordar com Caetano Veloso que diz na música “Língua”: “Se você tem uma ideia incrível é melhor fazer uma canção, está provado que só é possível filosofar em alemão”. 
Sugiro, então, a coletânea, lançada pelo editora Civilização Brasileira, em 1969, com as três mais importantes histórias de Kafka, onde realismo e absurdo são os dois lados de uma mesma moeda para que se explore a atormentada alma humana.

“METAMORFOSE” - A história apavorante de Gregor Samsa, que acorda transformado em um inseto, onde Kafka usa a metáfora do homem sendo “insetizado” para tratar dos nossos maiores medos e dilemas.

“O ARTISTA DA FOME” - Fala de um homem que vive de jejuar e que pretende bater seu próprio recorde de fome. Mas, porque num mundo onde tanta gente passa fome, devido as desigualdades sociais, alguém seria um faminto por opção?

“NA COLÔNIA PENAL” - Num lugar terrível, onde os condenados são submetidos a um aparelho de tortura que não poupa ninguém, inclusive o homem que o inventou, Kafka fala da opressão a que todos nós podemos ser submetidos.


Outra dica interessante é “BANDIDOS” de Eric Hobsbawm lançado no Brasil pela Editora Paz e Terra. Num tempo em que é comum se achar que “bandido bom, é bandido morto”, Hobsbawm nos mostra como tratar o banditismo numa perspectiva social. 
Aqui, ele é um campo de pesquisa para nós, historiadores, com uma perspectiva que “o coloca no contexto do poder, da política, e do controle por parte dos governos e do Estado”. 
Neste livro, Lampião e os cangaceiros, Pancho Villa e os revolucionários, Robin Hood e os que “tiravam dos ricos para dar aos pobres”, além dos despossuídos de sempre, não são bandidos comuns, são rebeldes em potencial. Eles são o “elemento social que, estando fora do alcance do poder e sendo ele mesmo detentor de poder, resiste a obedecer.


A dica “bônus track” é o disco “FRANCISCO” de Chico Buarque de 1987, lançado
pela RCA. Hoje, é o aniversário de minhas filhas, que nasceram no mesmo dia, mas em anos diferentes, e eu acordei cantando a música “As minhas meninas” que é desse disco, pensando que as minhas meninas, não são minhas. 
Chico teve três filhas e eu tive duas. Sempre convivemos com muitas mulheres e as coincidências param por aqui, pois ele dedicou atenção especial em sua obra ao
universo feminino, escrevendo músicas em que as mulheres falam o que sentem. “AS MINHAS MENINAS” é a constatação que “As meninas são minhas / Só minhas na minha ilusão”.
Neste disco tem uma das mais belas canções de Chico Buarque que é “LUDO REAL”, feita em parceria com Vinicius Cantuária, pois Chico não é “apenas” o melhor compositor da MPB, é também grande músico.

Vale prestar atenção na letra da música “O VELHO FRANCISCO” que fala desse nosso passado inglório de escravidão e monarquia: “Fui eu mesmo alforriado/ Pela mão do Imperador / Tive terra, arado / Cavalo e brida / Vida veio e me levou”.
Muita interessante, é “BANCARROTA BLUES” sobre como tudo pode ser ou não uma mercadoria, num sistema onde tem pessoas mais preocupadas com a lei da oferta e da procura do que com a vida.

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