sexta-feira, 13 de fevereiro de 2015

QUANTO VALE O MEU DIREITO?

Há uns dias parei num posto de combustíveis para comprar a commodity, como gostam de dizer jornalistas especializados em economia, mais valorizada que temos. Não, eu não fui comprar gasolina. Fui, na verdade, adquirir uma garrafa com água mineral. Foi quando presenciei uma cena digna de se comentar. Um casal, que saía de dentro da loja de conveniência existente no posto, discutia, em um volume acima do aceitável, sobre a viabilidade de processar o proprietário da loja de conveniência. É que o rapaz tinha encontrado uma dessas garrafinhas, com leite fermentado, que estava com a data de validade vencida. Ele estava exultante mediante a possibilidade de ganhar uma ação por danos morais e matérias. A moça nem tanto. Dizia ela: “não vale a pena ir atrás desse tipo de coisa, pois a justiça é lenta”. Mas, o rapaz argumentava que um advogado tinha lhe dito que nestes casos a indenização é certa. A moça, impaciente, dizia que ele não deveria ter comprado o leite fermento.

Eu pensei em perguntar ao rapaz porque simplesmente ele não devolveu a bebida, e pediu seu dinheiro de volta, ao perceber a data vencida. Não o interpelei porque se sua namorada não conseguia demovê-lo da ideia o que dirá eu, um estranho. Se vendo com a sorte grande, ao encontrar um produto estragado, o rapaz só pensava na quantia a titulo de indenização.  Eu não sei como terminou a discussão. Nem sei se o rapaz foi bater as portas da justiça por causa de uma mísera garrafinha de leite fermentado. Certa vez, ao chegar em casa, após adquirir produtos no supermercado, percebi que um deles estava estragado. Pensei em voltar ao estabelecimento para trocar o produto, mas desisti só de pensar em enfrentar todo aquele trânsito mais uma vez. Nem cogitei processar o supermercado numa ação de danos morais e materiais, pois minha moral seguia intacta e os danos materiais foram suportáveis. Além do mais, que espécie de consumidor sou eu que não presta atenção no que está comprando?

Essa história me fez pensar que uma coisa é ser lesado ao adquirir serviços e produtos e outra, bem diferente, é deixar-se lesar para tirar algum proveito. O Código de Defesa do Consumidor existe para garantir direitos e deveres, é sempre bom lembrar.  O maior shopping de Campina Grande foi condenado, pela 4ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça da Paraíba, a indenizar, por danos morais no valor de R$ 10 mil, um homem que se envolveu em uma confusão com outros frequentadores do estabelecimento. O indenizado alegou que o esquema de segurança do estabelecimento falhou, em evitar a briga, pois não agiu de forma pró-ativa para impedir que o confronto ocorresse. Eu não vou discutir o caso em si. É provável que o indenizado tenha razão.

Mas, chama atenção como se tornou algo comum recorrer à justiça em busca de indenizações por danos morais e materiais. Será que, finalmente, ficamos mais conscientes de nossos direitos, de nossa cidadania? Ou será que não se criou uma indústria que percebeu que esse ativismo judiciário pode ser um rentável negócio? O “advogado-porta-de-cadeia” não mais existe. Hoje, bom negócio mesmo, é caçar recompensas a titulo de danos morais e materiais. Vejam que nos cinco juizados especiais cíveis de João Pessoa tramitam mais de 43 mil ações que visam as tais indenizações por danos morais e materiais. Em 2014 foram julgadas 28.327 ações, só na capital. 10% delas foram consideradas improcedentes.
Ou seja, são as ações absurdas, descabidas, onde se percebe que o litigante pretende tão somente ganhar alguma quantia em dinheiro. A juíza leiga Tatiany Lopes Gonçalves, do 2º Juizado de João Pessoa, afirma que, hoje, se entra com ações por qualquer coisa. Ela conta casos como o de uma pessoa que processou uma loja de eletrodomésticos porque um de seus vendedores negou-lhe uma sacola grande ou do casal que processou o sindico do seu prédio porque as luzes do corredor estavam apagadas. Uma ação de oportunismo gritante foi a de um cliente que pediu indenização por não ter visto o gol do seu time enquanto almoçava num restaurante. O litigante, de má fé, alegou que um garçom ficou bem em frente à TV impedindo que ele pudesse ver o gol. Claro, ele perdeu a ação. Deveria ser processado por ocupar a justiça com um motivo tão banal.

Todo esse ativismo judiciário demanda um sem número de ações. Os processos vão se acumulando e a justiça vai ficando cada vez mais lenta. As ações caça-níqueis se misturam aos processos relevantes onde direitos estam sendo desrespeitados e deveres não são cumpridos. Demoramos uma vida republicana para finalmente entendermos que é na justiça onde se busca resolver problemas. Mas, exageramos na dose, e instrumentalizamos a justiça para que ela atenda nossos interesses mais fúteis. Agora, não mais perguntamos aos nossos advogados se nosso direito é bom ou ruim. O que queremos mesmo saber é quanto vale o nosso direito.

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