Na sexta-feira terminamos o
Jornal Integração com “Garota de Ipanema” de Tom Jobim e Vinícius de Morais. É
que se instituiu que o dia 25 de janeiro é o dia da Bossa Nova, uma homenagem a
Tom Jobim que nasceu nesse dia no ano de 1927. Hoje eu não vou falar de
política, e sim de um movimento musical que surgiu no Brasil e ganhou o mundo,
se tornando uma referência de bom gosto musical. Acreditem, houve uma época em que,
nos EUA e na Europa, o Brasil era o país da Bossa Nova.
Foi uma época em que Tom Jobim
era tão famoso quando Pelé pelo mundo afora. Foi uma época em que o Brasil era
uma referência em termos de boa música. Em pensar que hoje a maior referência
musical brasileira na Europa é Michel Teló. Em 1958, Elizeth Cardoso gravou um
disco com músicas de Tom Jobim e Vinícius de Moraes. Neste mesmo ano, Carlos
Lyra, Roberto Menescal e João Gilberto já tinham definido bem a estrutura
musical do que depois se chamou de Bossa Nova. Oficialmente, a Bossa Nova
surgiu quando João Gilberto lançou o disco “Chega de Saudade” em 1959. Era um
ritmo novíssimo. Cheio e acordes sofisticados e tendo a marca do improviso, daí
muitos terem dito que a Bossa Nova era o jazz verde-amarelo.
Caetano Veloso diz que tomou um
susto quando ouviu João Gilberto pela primeira vez, pois ele ia para um lado
com seu violão e a orquestra ia para o outro e no final todo mundo se entendia.
Isso é bem a nossa cara, pois no Brasil é assim mesmo. Aqui, cada um vai para
um lado e no final terminamos nos entendendo, ou tentando. A Bossa surgiu nos
bares e apartamentos da Zona Sul do Rio de Janeiro. Surgiu e sempre foi uma
coisa das classes sociais mais abastadas, apesar de que Tom Jobim a fez subir o
morro da Mangueira com piano e tudo.
Certo, a Bossa era um movimento musical elitista. A classe média carioca a
criou, mas isso não quer dizer nada. Pois o que importa é a qualidade. Na
verdade, a Bossa é o movimento mais eclético que já existiu no Brasil. Seus
criadores se inspiraram no samba, no jazz, na música erudita e onde mais puderam
buscar sonoridades. João Gilberto já disse que aprendeu a tocar violão ouvindo
Jackson do Pandeiro, que, não por acaso, era conhecido como o Rei do Ritmo.
Apesar disso a
Bossa Nova foi um movimento musical minimalista. Para eles bastava um banquinho
e um violão. Nem era preciso ter uma boa voz. Vejam que João Gilberto tem
aquela vozinha sem graça que chega a irritar. Aliás, as deficiências vocais de
Tom Jobim e João Gilberto eram tão apontadas que virou tema de uma música. Em
“Desafinado”, eles diziam que: “Se você disser que eu desafino/saiba que isso
em mim provoca imensa dor”. E terminavam ironizando ao disserem que no “peito
dos desafinados também bate um coração”.
Em 1962, Tom & Vinícius
fizeram o clássico da Bossa Nova e da própria MPB. Uma das 10 músicas mais
gravada e regravada de todos os tempos surgiu numa mesa de bar e para chamar a
atenção de uma moça que vinha, passava e não dava bolas para ninguém. Reza a
lenda, que os dois passavam os dias tomando chope no Bar Veloso, hoje Garota de
Ipanema. Quase todos os dias, Helô Pinheiro, no esplendor de seus 20 e poucos
anos, passava pela calçada do bar com “aquele doce balança a caminho do mar”.
Eles passavam todas às cantadas possíveis e
Helô não dava a menor atenção aqueles dois bebuns com um violão. Até que um dia
eles resolveram usar o talento que Deus lhes deu e passaram uma cantada que
funcionou. Tom Jobim contou, numa entrevista
muitos anos depois, que lá vinha Helô, com o doce balanço, e eles começaram a
cantarolar: “olha que coisa mais linda, mais cheia de graça, é essa morena que
vem e que passa, num doce balança a caminho do mar”.
Aí não teve jeito. Helô, parou, sentou
a mesa com os dois e virou a garota do Tom e do Vinícius. Dizem que, literalmente,
pois ela teria namorado com os dois. Depois a garota ganhou o Rio, o Brasil, os
EUA e o mundo. Até Frank Sinatra se dobrou as curvas sinuosas da Garota de
Ipanema, eu estou falando da música, não da garota. Tom e Cia foram fazer shows
nos EUA e na Europa. João Gilberto gravou um memorável disco com Stan Getz, que
era o Jobim dos EUA.
A Bossa influenciou muita gente
boa. Chico Buarque, os tropicalistas e os grandes da MPB nas décadas de 70 e
80. Até Roberto Carlos flertou com a Bossa. Tim Maia gravou um disco só com
clássicos e dizia que era Bossa sem fazer biquinho. Mas, o que teria acontecido
com o país que abrigou tão rico movimento musical? Hoje Tom Jobim, Vinícius de
Moraes e João Gilberto não são mais conhecidos por uma geração que só ouve esse
excremento que indústria musical deposita nas ruas.
Se eu fosse vivo em 1962, e
estivesse nos EUA, andaria com uma camisa da seleção brasileira para que todos
soubessem que eu vinha do mesmo país de Tom Jobim. Hoje, se eu for a Europa,
fico de boca fechada para que ninguém saiba que sou do mesmo país de Michel
Teló.