Nos dias de hoje, principalmente
nos períodos eleitorais, sempre falamos em reformas. Às vezes penso que somos
reformistas por definição! Mas, na verdade, nos apenas gostamos de falar em
reformas, daí a praticarmos já vai uma grande distância. Estamos sempre falando
em reformas. Tem sempre alguém defendendo a reforma tributária e do modelo
econômico. A reforma agrária continua sendo bandeira de luta de movimentos
organizados. Muita se fala, também, de reformas na educação.
E ainda existe a mãe de todas as
reformas – eu falo da reforma política, que é aquele negócio que ninguém sabe
bem o que é, e nem como fazer, mas que todo mundo defende como se fosse à
panaceia para todos os nossos problemas. Há 50 anos, em 1963, também era assim.
Só se falava em reformas. No início da década de 60 a sociedade brasileira se
mobilizou em torno das Reformas de Base. Naquela época havia um amplo
sentimento de que, sem reformas, nunca sairíamos do terceiro mundo.
Em 1963, o presidente da
República era João Goulart, também conhecido como Jango. Menos por vontade
própria e mais pela pressão de vários setores da sociedade, Jango aderiu às
reformas de base não sem algumas vacilações pouco normais para a época. No
passado, as reforma tinham alta capacidade de mobilizar a sociedade, ao
contrário dos nossos dias, aonde as pessoas só vão ocasionalmente às ruas e em
geral para lutar por coisas sem sentido e/ou para atrapalhar o trânsito.
Se no passado se lutava por
reforma agrária, política e educacional, hoje se luta pela liberalização da
maconha e pelo livre direito das vagabundas fazerem sabe lá o que. Hoje, o
máximo que fazemos é participar ocasionalmente de manifestações contra a
corrupção. Apesar de que não
adianta ser contra a corrupção e eleger “Malufs” e “Severinos Cavalcantis” a
cada dois anos. O fato é que no passado éramos reformistas praticantes, hoje
não passamos de uns reformistas de botequim.
Um movimento de
massa organizado lutava pelas reformas de base e reivindicava do Congresso
Nacional medidas constitucionais necessárias para uma consequente reforma das
instituições. Mas, pelo que lutavam os reformistas da década de 60? Eles se
mobilizaram por uma reforma agrária que democratizasse o acesso a terra
e que desse às pessoas condições de viver, comer e se desenvolver junto com
suas famílias. Pasmem! Mas, em 1963 já se falava em transposição do Rio São
Francisco.
A mesma que se
arrasta pelos anos, torrando somas fantásticas de dinheiro, enquanto a seca
devora o povo nordestino impiedosamente. Em 1963, 90% das terras no Brasil
estavam nas mãos de apenas 10% da população. Passados 50 anos, apenas 10% das
terras brasileiras estam nas mãos de 90% dos brasileiros. Ou seja, não mudamos
nossa estrutura fundiária porque seguimos sem fazer uma ampla reforma agrária.
Lá em 1963
falava-se muito em reforma urbana para que grande parcela da população
pudesse ter boas condições de moradia e para que o fosso social, que separa as
pessoas de acordo com seus locais de moradia, fosse encurtado. Claro, não
fizemos reforma urbana – as favelas estam aí para não me deixarem mentir.
Lutava-se por reforma educacional que ampliasse a rede pública de
ensino. Os jovens entravam na luta política pela porta das mobilizações por
mais vagas nas universidades.
Como nos dias de
hoje, se lutava em 1963 por reforma tributária que corrigisse a desigual
distribuição de encargos entre o capital e o trabalho, entre ricos e pobres.
Essa é outra reforma que adoramos defender, mas não parecemos saber o que fazer
para efetivá-la. Além da questão tributária, falava-se da reforma bancária
que pudesse levar crédito e financiamento a todas as forças produtivas do país
a juros normais, sem usura e sem corrupção. O financiamento até foi
democratizado, já a usura e a corrupção...
Naquela época se falava muito em reforma
administrativa que pudesse dotar o Estado brasileiro de uma estrutura mais
sólida, menos dependente da burocracia e com eficientes mecanismos de controle contra
a corrupção. Claro, essa reforma jamais foi
feita, do contrário não estaríamos às voltas com mensaleiros, sanguessugas e
todas essas quadrilhas que pilham o Estado brasileiro impedindo que se possa
desenvolver. Em 1963 falava-se em reformar o sistema político-partidário e a
forma da representação. Falava-se em reformar os poderes e as eleições. Hoje,
continuamos a falar dessas coisas, apenas encontramos um termo que resume tudo
isso: é a tal reforma política.
Sempre se dirá que não se fez reformas
por causa do golpe militar de 1964. É que, com ditadura, fica mesmo difícil
fazer reformas sociais e políticas. É preciso não esquecer que o golpe foi dado
exatamente para se impedir que as reformas acontecessem. Mas, a ditadura acabou
a 28 anos – tempo considerável para se reformar tudo, inclusive o Estado
brasileiro. O fato é que somos um bando de reformistas de gabinete. Até achamos
que devemos nos reformar, mas como não sabemos como, seguimos assim
irreformáveis.
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