O Superior
Tribunal de Justiça Desportiva excluiu o Grêmio da Copa do Brasil por causas
das ofensas racistas que sua torcida desferiu contra o goleiro Aranha do
Santos. E já não era sem tempo, pois não é de hoje que se fazem campanhas
contra o racismo. Em vários jogos da Copa do Mundo, inclusive naquele em que o
Brasil foi achincalhado mundialmente pelo 7 X 1 contra a Alemanha, havia o
protocolo FIFA em que jogadores liam uma mensagem contra o racismo. Mas o protocolo
FIFA, as campanhas educativas, as punições e até a própria lei não têm sido tão
eficientes, do contrário não seguiríamos vendo essas cenas lamentáveis de
torcedores desrespeitando jogadores com atitudes racistas.
Por causa desse
último episódio, lembrei-me de dois vídeos, feitos em Portugal, para uma
campanha publicitária contra o racismo. Os vídeos foram feitos a cerca de dois
anos e vão direto ao ponto, sem rodeios. Em um deles temos uma situação racista em um avião.
Uma senhora branca, muito bem vestida, senta-se lado de um rapaz negro. Ela
está visivelmente incomodada por ter que se sentar ali. Daí ela chama a
aeromoça e pede para mudar de lugar. A aeromoça argumenta que não vai ser
possível, já que não há mais lugares vazios na classe econômica. A senhora,
bastante irritada, se recusa viajar ao lado do rapaz e exige que alguma
providencia seja tomada. A aeromoça vai conversar com o comandante.
Na volta, ela olha para a senhora e para o rapaz e diz em tom solene: “O comandante manda dizer que temos um lugar
vazio na 1ª classe e que pedimos desculpas, pois é inconcebível um passageiro
viajar ao lado de uma pessoa tão desprezível”. A senhora branca abre um
sorriso e faz menção de se levantar. A aeromoça diz para ela continuar sentada
e pede ao rapaz que lhe acompanhe até a 1ª classe, onde será acomodado de forma
a ficar longe daquela senhora desprezivelmente racista. No outro vídeo, um
rapaz negro esbarra, na rua, em um rapaz branco e logo pede desculpas. O rapaz branco
diz: “Ei, preto, aqui no meu país tem que
andar como gente, aqui não é a África. Porque você não volta para sua terra?”.
E ele diz mais: “Quando você for
embora, aproveite e leve os indianos, os brasileiros e os chineses com você”.
Ocupado em xingar o suposto africano, o rapaz racista não percebe que está no
meio da rua e um carro o atropela violentamente. A cena seguinte mostra o
português bastante machucado, em um leito de hospital, sendo atendido por uma
equipe de um médico e duas enfermeiras. Detalhe, o médico é negro. O vídeo
termina com a seguinte pergunta: “Até
onde vai seu preconceito?”. O titulo dessa campanha publicitaria é: “Coloque o racismo em seu devido lugar”.
Será que a moça, que foi flagrado pelas câmeras de televisão chamando o goleiro
Aranha de macaco, tem alguma ideia de onde deve colocar o preconceito dela?
Não foi a primeira vez que gremistas se comportaram como trogloditas. Em
2011, o meia Zé Roberto denunciou que torcedores imitavam macacos a cada vez
que ele tocava na bola. Ele disse que essa situação chega a ser normal no Rio
Grande do Sul. Em 2013, num jogo entre Caxias do Sul e Novo Hamburgo o atacante
Vanderlei foi chamado de macaco. Em seu depoimento, ele disse que viu
torcedores do Caxias imitando macacos, e apontando para ele, enquanto fazia o
aquecimento. Já neste ano, num jogo entre Esportivo e Veranópolis, pelo
Campeonato Gaúcho na cidade de Bento Gonçalves, o árbitro Márcio Chagas da
Silva foi chamado de macaco, safado e imundo. O seu carro foi depredado e
coberto por bananas.
A moça que xingou o goleiro Aranha disse, em seu depoimento à polícia, que
não teve uma atitude racista e que apenas foi no embalo da torcida que costuma
entoar uma canção que repete, não por acaso, várias vezes a palavra macaco. Os
jornais mostraram que a moça é de uma família de classe média, que estuda e
trabalha, que tem vizinhos negros e que se dá bem com todos eles. Mas, se é
assim, porque, afinal, essa moça estava com aquele olhar de fúria xingando o
goleiro Aranha? Eu não duvido que essa moça tenha boa índole. Na verdade, ela
nem acha que fez algo errado, pois para ela, para boa parte da torcida do
Grêmio e muitos e muitos outros brasileiros é mesmo normal chamar alguém de
macaco por causa da cor de sua pele.
O grito de guerra dos gremistas tem a palavra macaco porque, de fato, para
eles é comum, normal, xingar pessoas pertencentes à raça negra. Como é comum
para aquele torcedor do Villarreal atirar bananas em jogadores brasileiros
negros. Este é o problema. Muitos brasileiros pensam que ainda vivemos no tempo
da escravidão. Nossa cultura politica é, ainda, aferrada a esse passado de
escravidão e vergonha. Na verdade, não completamos o ciclo que poria fim a
escravidão. Nós não fizemos nossa “Revolução Francesa”. Tampouco passamos um
processo educativo que mostrasse as pessoas qual a diferença entre um macaco e
um ser humano. Eu não sou otimista. Penso que esses episódios vão continuar a
acontecer até que um dia entendamos, de uma vez por todas, que somos todos
frutos do mesmo processo de miscigenação.
AQUI É O
POLITICANDO, COM GILBERGUES SANTOS, PARA A CAMPINA FM.
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