segunda-feira, 8 de setembro de 2014

QUANTO DE RACISMO AINDA CABE DENTRO DE VOCÊ?

O Superior Tribunal de Justiça Desportiva excluiu o Grêmio da Copa do Brasil por causas das ofensas racistas que sua torcida desferiu contra o goleiro Aranha do Santos. E já não era sem tempo, pois não é de hoje que se fazem campanhas contra o racismo. Em vários jogos da Copa do Mundo, inclusive naquele em que o Brasil foi achincalhado mundialmente pelo 7 X 1 contra a Alemanha, havia o protocolo FIFA em que jogadores liam uma mensagem contra o racismo. Mas o protocolo FIFA, as campanhas educativas, as punições e até a própria lei não têm sido tão eficientes, do contrário não seguiríamos vendo essas cenas lamentáveis de torcedores desrespeitando jogadores com atitudes racistas.

Por causa desse último episódio, lembrei-me de dois vídeos, feitos em Portugal, para uma campanha publicitária contra o racismo. Os vídeos foram feitos a cerca de dois anos e vão direto ao ponto, sem rodeios.  Em um deles temos uma situação racista em um avião. Uma senhora branca, muito bem vestida, senta-se lado de um rapaz negro. Ela está visivelmente incomodada por ter que se sentar ali. Daí ela chama a aeromoça e pede para mudar de lugar. A aeromoça argumenta que não vai ser possível, já que não há mais lugares vazios na classe econômica. A senhora, bastante irritada, se recusa viajar ao lado do rapaz e exige que alguma providencia seja tomada. A aeromoça vai conversar com o comandante.

Na volta, ela olha para a senhora e para o rapaz e diz em tom solene: “O comandante manda dizer que temos um lugar vazio na 1ª classe e que pedimos desculpas, pois é inconcebível um passageiro viajar ao lado de uma pessoa tão desprezível”. A senhora branca abre um sorriso e faz menção de se levantar. A aeromoça diz para ela continuar sentada e pede ao rapaz que lhe acompanhe até a 1ª classe, onde será acomodado de forma a ficar longe daquela senhora desprezivelmente racista. No outro vídeo, um rapaz negro esbarra, na rua, em um rapaz branco e logo pede desculpas. O rapaz branco diz: “Ei, preto, aqui no meu país tem que andar como gente, aqui não é a África. Porque você não volta para sua terra?”.
 
E ele diz mais: “Quando você for embora, aproveite e leve os indianos, os brasileiros e os chineses com você”. Ocupado em xingar o suposto africano, o rapaz racista não percebe que está no meio da rua e um carro o atropela violentamente. A cena seguinte mostra o português bastante machucado, em um leito de hospital, sendo atendido por uma equipe de um médico e duas enfermeiras. Detalhe, o médico é negro. O vídeo termina com a seguinte pergunta: “Até onde vai seu preconceito?”. O titulo dessa campanha publicitaria é: “Coloque o racismo em seu devido lugar”. Será que a moça, que foi flagrado pelas câmeras de televisão chamando o goleiro Aranha de macaco, tem alguma ideia de onde deve colocar o preconceito dela?

Não foi a primeira vez que gremistas se comportaram como trogloditas. Em 2011, o meia Zé Roberto denunciou que torcedores imitavam macacos a cada vez que ele tocava na bola. Ele disse que essa situação chega a ser normal no Rio Grande do Sul. Em 2013, num jogo entre Caxias do Sul e Novo Hamburgo o atacante Vanderlei foi chamado de macaco. Em seu depoimento, ele disse que viu torcedores do Caxias imitando macacos, e apontando para ele, enquanto fazia o aquecimento. Já neste ano, num jogo entre Esportivo e Veranópolis, pelo Campeonato Gaúcho na cidade de Bento Gonçalves, o árbitro Márcio Chagas da Silva foi chamado de macaco, safado e imundo. O seu carro foi depredado e coberto por bananas.

A moça que xingou o goleiro Aranha disse, em seu depoimento à polícia, que não teve uma atitude racista e que apenas foi no embalo da torcida que costuma entoar uma canção que repete, não por acaso, várias vezes a palavra macaco. Os jornais mostraram que a moça é de uma família de classe média, que estuda e trabalha, que tem vizinhos negros e que se dá bem com todos eles. Mas, se é assim, porque, afinal, essa moça estava com aquele olhar de fúria xingando o goleiro Aranha? Eu não duvido que essa moça tenha boa índole. Na verdade, ela nem acha que fez algo errado, pois para ela, para boa parte da torcida do Grêmio e muitos e muitos outros brasileiros é mesmo normal chamar alguém de macaco por causa da cor de sua pele.

O grito de guerra dos gremistas tem a palavra macaco porque, de fato, para eles é comum, normal, xingar pessoas pertencentes à raça negra. Como é comum para aquele torcedor do Villarreal atirar bananas em jogadores brasileiros negros. Este é o problema. Muitos brasileiros pensam que ainda vivemos no tempo da escravidão. Nossa cultura politica é, ainda, aferrada a esse passado de escravidão e vergonha. Na verdade, não completamos o ciclo que poria fim a escravidão. Nós não fizemos nossa “Revolução Francesa”. Tampouco passamos um processo educativo que mostrasse as pessoas qual a diferença entre um macaco e um ser humano. Eu não sou otimista. Penso que esses episódios vão continuar a acontecer até que um dia entendamos, de uma vez por todas, que somos todos frutos do mesmo processo de miscigenação.

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AQUI É O POLITICANDO, COM GILBERGUES SANTOS, PARA A CAMPINA FM.

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