segunda-feira, 1 de abril de 2013

Foi num dia como esse que ficamos sem democracia e sem reformas.


 




Passados exatos 49 anos do golpe civil/militar de 1964 eu sugiro que façamos algumas reflexões. O golpe foi dado no dia 01 de abril, mas ele nunca foi uma mentira, pelo contrário, ele foi o marco inicial para longos 21 anos que tivemos de duras verdades. Eu vou destacar duas questões para relacionar o fato histórico com nossa realidade para não repetir o que tanto já se disse sobre o golpe de 64. Eu quero lembrar que o passado só nos serve se for para fazer com que entendamos mais e melhor o presente.





Ao contrário do que quer crer o pastor/deputado Marco Feliciano, importa sim o que se fez no passado. É preciso reavaliar o que fizemos, pois à medida que nos distanciamos temporalmente dos acontecimentos de nossas vidas vamos mudando a visão sobre eles. É preciso redimensionar os fatos vividos nos primeiros dias de abril de 1964 para nossa visão atual, pois, claro, não vivemos no passado. O que quero é refletir sobre o que herdamos em termos de cultura política do golpe e do regime militar que tivemos.




Por que as memórias do golpe e da ditadura ainda nos são tão vivas? Seria pelas feridas ainda não cicatrizadas? Como querer que os que foram reprimidos pelo Estado militarizado esqueçam tudo que passaram? Saímos da ditadura e entramos na “Nova República” alegremente sem revermos nossos atos. A Anistia Política de 1979 foi uma grande e pesada pedra colocada por cima dos erros e crimes cometidos. Assim, herdamos uma sociedade e um Estado recheados de “entulhos autoritários”, que o débil processo de liberalização que tivemos não foi competente para extrair de nosso entorno político. A ditadura acabou, mas seus procedimentos permaneceram conosco.





A principal causa do golpe de 64 foi uma suposta tensão existente entre democracia e mudanças sociais. É fato que parte considerável da sociedade queria mudanças, mas duvido que houvesse um único grupo organizado para defender e lutar pela democracia. O amplo espectro político-partidário nacional fingia aceitar o falso dilema entre mudanças sociais e democracia. Os atores políticos à direita acreditavam que a democracia levaria às mudanças sociais - por isso mesmo praticaram o golpe. Os atores à esquerda defendiam que só teríamos mudanças sociais acabando com a democracia, pois eles defendiam a violência revolucionária como motor das amplas reformas que parte da sociedade desejava.





O fato é que o confronto entre as forças políticas favoráveis e contrárias às reformas de base destruiu as instituições democráticas. O resultado a que se chegou nós bem conhecemos: nenhuma reforma social e democracia inexistente!

 





O processo de liberalização política (notem que não utilizo o termo redemocratização), efetivado com a eleição de Tancredo Neves foi torto, pois não conseguiu afastar do cenário nacional atores políticos que atuaram durante a ditadura militar. A ditadura não acabou e se criou um Estado democrático. O que nós tivemos foi um pacto entre as forças políticas - iniciado ainda em 1974 e capitaneado pelo general Presidente Ernesto Geisel e seu senhor de todas as maldades, Golbery do Couto e Silva.



O resultado foi um processo em que lentamente se foi inserindo alguns elementos do ritual democrático nas instituições sem, no entanto, reformá-las e, principalmente, mantendo intocada a espinha dorsal do regime ditatorial: o poder militar. Democracia é a junção dos mecanismos associados às formas de decidir em favor dos interesses sociais. Democracia são as normas que regem o bom funcionamento das instituições. Assim, é fácil ver que não temos uma democracia consolidada.




A forma como a ditadura foi sendo encerrada não permitiu que tivéssemos um processo em que Sociedade Civil e Estado firmassem um compromisso para banir as prerrogativas que os militares atribuíram para si durante 21 anos. Como na ditadura, seguindo a lógica da Doutrina de Segurança Nacional que dizia que o inimigo a se combater estava dentro do território nacional e não fora dele, as Forças Armadas continuaram mais preocupadas com a segurança interna do que com a externa.




Vivemos um momento difícil por não percebermos o quanto ainda temos que avançar no sentido de efetivarmos uma democracia em que aqueles que detêm a força irão obedecer aos que não as tem. Os atores políticos não devem ceder às tentações de mudar as regras do jogo político enquanto ele estiver sendo jogado. Devem se submeter às incertezas democráticas dos resultados. Esse é o nosso maior gargalo político, além da corrupção, claro. Falta-nos, ainda, aceitar que democracia deve ter um valor universal e rejeitarmos aquele dito do humorista Millôr Fernandes que diz que “ditadura é você mandar em mim e democracia sou eu mandar em você!”.




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