Nos últimos dias o “Partido do Comando da Capital”, mais conhecido
pelo nome de fantasia que a mídia lhe deu “Primeiro Comando da Capital” e por
sua sigla PCC, mandou avisar ao Comando Geral da Polícia Militar de São Paulo
que (SIC) “vai tocar o terror na Copa do
Mundo do ano que vem”. Líderes do PCC se deixaram flagrar em conversas
telefônicas para que a justiça soubesse que ordenariam novos ataques caso
fossem transferidos para o Regime Disciplinar Diferenciado (RDD) da
penitenciária de Presidente Bernardes, no interior de São Paulo.
Vejam a porca
miséria em que vivemos. A escuta telefônica (que só pode ser utilizada com a
devida autorização judicial) passou a ser um mecanismo de comunicação entre o
crime organizado, que manda e desmanda nos presídios, e as autoridades
policiais, que seguem sem saber com lidar com o PCC. Funciona assim: quando os
líderes do PCC querem se fazer ouvir deixam-se pegar pelas escutas que o
serviço de inteligência da Polícia Militar utiliza e vão repassando suas
demandas, reivindicações e ameaças. Ou seja, o próprio Estado termina disponibilizando
para o crime organizado o instrumento que deveria servir para combatê-lo.
Promotores do Grupo
de Atuação Especial e Repressão ao Crime Organizado (GAECO/SP) repassaram ao Comando
Militar do Sudeste o resultado de suas investigações, pois o Exército terá importante
papel na segurança durante a Copa. Parece que os promotores não acreditam na
eficiência da PM quando o assunto é PCC. Marcos Willians Camacho, mais
conhecido como Marcola, é o chefe supremo do PCC. Foi ele quem começou com as
ameaças ao saber que o Ministério Público de São Paulo havia pedido sua
transferência para o RDD de Presidente Bernardes.
Em 2012 o comando do
PCC ordenou uma série de ataques no interior e na capital de São Paulo para
mostrar força e para se vingar de uma série de prisões que a polícia havia
realizado. Naquela ocasião, 106 agentes da Polícia Militar foram assassinados.
A maior cidade do país foi transformada em uma praça de guerra. Vimos abissais
e violentos acontecimentos no Estado de São Paulo. Cidadãos, policiais e
bandidos foram mortos, os bens públicos e privados depredados, prisões
transformadas em arenas de terror, i.e, a segurança pública deixou de existir.
Foram cenas de uma guerra civil de proporções alarmantes e isso me faz
constatar que o Estado de direito sofria pesados golpes ao ponto de ser
duramente ameaçado. Prova cabal da fragilidade do nosso Estado de Direito foi o
governo de São Paulo ter ido dialogar com as lideranças do PCC, como se eles
tivessem reivindicando algo legítimo que merecesse uma negociação. Ao decidir
ir conversar com o crime organizado o governo sinalizava em fortes cores o
quanto a democracia que representava era (continua sendo) frágil.
Agora, o comando do
PCC ameaça “tocar o terror” porque teve acesso, através de advogados, aos detalhes
de uma investigação que vem sendo realizada a mais de três anos e que revela
que o PCC tem uma estrutura organizacional muito bem elaborada. Claro, o que o
PCC quer é forçar outra “negociação”, como aquela de 2012, para demonstrar que
pode emparedar o governo quando bem quiser. O serviço de inteligência da Polícia
Militar de São Paulo viu que o PCC tem uma estrutura hierárquica para o caso da
cúpula ser isolada no RDD de Presidente Bernardes. Cada líder, como Marcola,
tem uma espécie de vice que assume o lugar do titular caso ele morra ou vá para
o RDD. Dessa forma, a administração da organização e o negócio do tráfico não
sofrem solução de continuidade.
Os lideres fizeram
as autoridades saber que não mais aceitarão que novos membros da organização sejam
levados aos presídios de segurança máxima. E avisaram que querem ter trânsito
livre nos pátios dos presídios, ao invés de ficarem trancafiados em suas celas,
como é praxe no RDD. Ainda disseram que se, e quando, a ordem de tocar o terror
for dada os presídios que são comandados por oficiais da PM terão suas atividades
paralisadas independente de qualquer comunicado. Pior, se Grupo de Intervenção
Rápida da Secretaria de Administração Penitenciária ou da Tropa de Choque
entrar em presídios, onde os chefões estam, os atentados nas ruas se iniciam automaticamente,
sem que alguma ordem expressa seja dada.
O Estado está de quatro frente ao PCC que faz ameaças em represália
ao fato da justiça paulista estar analisando dois recursos do Ministério
Público Estadual contra decisões de juízes que negaram a transferência da
cúpula do PCC para o Regime Diferenciado. O PCC é ciente do alto poder de
barganha que possui para negociar com o Estado. Com que cara ficaremos se o PCC
tocar o terror em plena Copa? O que diremos ao mundo se tivermos policiais e
turistas sendo mortos pelas ruas enquanto o evento acontece?
A pergunta que não quer calar é: O QUE FAZER? Negociar com o PCC e ficarmos,
mais uma vez, de cuia na mão esperando a boa vontade de Marcola e Cia? Muitos
dizem que já está mais do que na hora do Estado tocar o terror para cima do
PCC. Mas, será que o Estado tem condição de realmente enquadrar o PCC? Se o
tiro sair pela culatra, as manifestações de junho e julho e as bandalheiras
desse “black blocs” estúpidos vão ser mera diversão frente ao PCC tocando o
terror sob a sociedade.
Talvez não seja tarde, ainda, para que as instituições coercitivas
estudem a fundo a organização criminosa que tanto nos ameaça. Aliás, o PCC sabe
bem como agir frente ao Estado exatamente porque o conhece bem. Marcola, por
exemplo, é um estudioso da Teoria Geral do Estado. Quando não está cuidando dos
negócios ele lê obras de Maquiavel, de Thomas Hobbes, de John Locke, enfim, dos
filósofos que elaboraram as bases do nosso sistema político.
O sociólogo José de Souza Martins, professor da
USP, diz que o “PCC criou uma sociedade
paralela, com regras que parecem as nossas, mas que funcionam ao contrário
(...) a cadeia é parte da organização, é seu instrumento de proteção e poder”.
O PCC não dispõe do aparato legal que os governos e as instituições coercitivas
possuem, mas leva a incrível vantagem sobre o Estado de poder agir sob o manto
da clandestinidade e de não precisar respeitar as normas e procedimentos democráticos,
já que se posiciona a margem do Estado de direito. Graças a isso, o PCC pode
transformar a simples delinquência organizada numa atividade empreendedora de criminosos
que atinge altos níveis em termos de competência empresarial. O PCC modernizou
a atividade criminosa tornando-a gerencial. O delinquente isolado e amador é
coisa do passado. O crime, para o PCC, é uma atividade racional como outra
qualquer, como uma empresa, um banco, uma rede de lojas ou de supermercados. Da
cadeia, o PCC administra empresarialmente a atividade fim, que é o tráfico de
drogas, e dá conta de sem número de atividades, que vão do suborno a agentes
públicos corrompidos, passando pelos assassinatos e chegando a proteção de seus
associados. O fato é que de nossas estranhas surgiu essa anomalia que foi se
fortalecendo e que age, como um Estado paralelo, para que não acreditemos nas
instituições e no próprio sistema democrático que temos. A impressão que tenho
é que voltamos ao Estado de natureza onde a lei que vale é a do mais forte.
AQUI É O POLITICANDO, COM GILBERGUES SANTOS, PARA A CAMPINA FM.
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