Ontem eu falava
da entrevista que a presidente do IBOPE Inteligência, Marcia Cavallari,
concedeu ao jornal espanhol “El País”. A entrevista é um soco no estômago do
brasileiro que só pensa na Copa do Mundo e em vender seu voto em outubro. É
certo que o jornal “El País”, como de resto a imprensa europeia, tem se
dedicado a martelar nossas mazelas e esse jeito desorganizado,
descompromissado, que temos de encarar a vida e a nossa própria organização
social e política. Mas, Marcia Cavallari é brasileira e pode, então, falar mal
de nós mesmos. Sem contar que sendo estatística, cientista política e
especialista em Pesquisas de Opinião ela pode, sim, opinar sobre muita coisa.
Cavallari confirmou que há um desejo de mudança.
O problema é que não existe quem possa encarnar esse sentimento. A elite
política brasileira se mostra incapaz, pelo histórico descompromisso que tem
para com as questões sociais, de apresentar alguém com este perfil. Já das
camadas populares não deve aparecer alguém que represente o sentimento de
mudança, pois, também historicamente, nosso povo não foi suficientemente
preparado, eu falo de educação, para coisas como a mudança. Cavallari disse
que, nas pesquisas do IBOPE, não se percebeu um nome se apropriando do
sentimento de mudança, por isso Dilma segue levando vantagens. Por falta de
opção melhor, o eleitorado deve terminar se conformando com o que já tem.
O mais interessante da entrevista de Cavallari é quando ela coloca o dedo
em nossas feridas. Ela afirma que, graças a uma série de pesquisas, deu para
perceber que “o brasileiro é bem mais
cúmplice do que vítima da corrupção”. E ela tem razão, pois os corruptos
contumazes, da lavra de um Paulo Maluf, continuam sendo eleitos pelo povo. Das
pesquisas IBOPE se extrai a contradição de que, mesmo contrárias à corrupção,
as pessoas seguem elegendo corruptos. Isso é bem verdade na medida em que as
manifestações da metade do ano passado para cá eram, também, contra a corrupção
e contra os políticos. Mas, qual a certeza que temos que políticos corruptos
serão barrados pelas urnas em outubro?
Certo, somos contra a corrupção. Mas, continuamos a praticar o jeitinho
brasileiro, nossa instituição informal maior. Queremos o fim da corrupção, mas
não abandonamos nosso jeito transgressor de ser quando o assunto é maximizar
interesses próprios. O fato é que a maioria dos brasileiros é contra a
corrupção, mas essa mesma maioria comete atos de corrupção para defender seus
interesses, ou de sua família. É a velha história de dar algum dinheiro, ao
guarda de trânsito, para se livrar de uma multa. Cavallari afirmou que, em uma
das pesquisas do IBOPE, se descobriu algo curioso. Sobre a Copa da FIFA , a
maior angustia do brasileiro não é se nossa Seleção será ou não campeã. A maior
preocupação é sobre o que vão pensar de nós.
É isso mesmo. O brasileiro está preocupado com sua imagem lá fora. Existe
um grande receio sobre a possibilidade de nos sentirmos envergonhados por causa
da falta de infraestrutura para receber os visitantes estrangeiros. O
brasileiro se preocupa sobre o que vão falar dos desmandos, da desorganização e
da ausência dos tais legados sociais. Ou seja, nos preocupamos com o que os
outros vão pensar, mas não nos interessa o que nós mesmos achamos disso tudo.
Não deixa de ser interessante que, finalmente, tenhamos conseguido colocar
alguma prioridade acima desse orgulho estulto de sermos campeões do mundo. Se
esta Copa dos horrores servir para que nosso povo fique mais consciente já é
alguma coisa.
Já os políticos estam bastante preocupados com a Copa da FIFA. É que as
obras, e os desmandos de toda sorte, são responsabilidade dos governos federal,
estaduais e municipais. Está todo mundo no mesmo barco. A solução seria a
seleção ser campeão. Mas, aí já fica mais complicado, pois ainda se vai
combinar com os russos, como diria Garrincha. A considerar o que diz o IBOPE,
conquistar o 6º título mundial não deverá servir como um poderoso analgésico.
Marcia Cavallari afirma que até estamos um pouco mais sensíveis para assuntos
coletivos. Mas, a ideia de que o “bandido bom é o bandido morto” ainda
prevalece. O IBOPE detectou um amplo apoio aos crescentes atos de linchamento
de marginais.
Sintomático é o caso da professora que postou uma foto, numa rede social,
de um rapaz de chinelos no aeroporto do Rio de Janeiro. O comentário da
professora idiota foi: “De chinelos? Isso aqui é um aeroporto ou uma
rodoviária? Cadê o glamour?”. O fato é que não melhoramos em muita coisa.
Segundo o IBOPE, continuamos tão racistas, machistas e conservadores quanto a
50 ou 60 anos atrás. Sem contar, que continuamos a favor de toda sorte de
desigualdades sociais como sempre estivemos.
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