Conta-se que em
1962 o presidente francês, Charles de Gaulle, teria dito que, definitivamente,
o Brasil não é um país sério. Parece que ele fez essa constatação devido ao
contencioso franco-brasileiro conhecido como “a guerra das lagostas”. De Gaulle
não inventou a roda, apenas estabeleceu a verdade de um fato. Decisivamente,
não somos sérios, principalmente nas questões sociais e políticas. A forma como
organizamos esta Copa da FIFA diz muito do que somos e como somos. A frase
gerou uma crise diplomática só resolvida depois que de Gaulle veio ao Brasil
ser paparicado pelo povo que ele acusou de não ser sério.
Em 2006, Paul
Wolfowitz, presidente do Banco Mundial, disse que a corrupção no Brasil é "endêmica e profundamente
enraizada". O Banco Mundial havia lançado um estudo para aferir o grau
de transparência em termos de responsabilidade no setor público, controle da
corrupção e aplicação da lei em 200 países. A pesquisa atribuía cores para
mostrar a evolução em cada um dos itens. Os países com os piores desempenhos
ganhavam um vermelho bem forte. As nações com bons níveis de desempenho
ganhavam um verde claro e os intermediários ficavam entre o amarelo e o
laranja. O Brasil, claro, ganhou um vermelhão daqueles.
Mas, ficamos todos revoltados com a frase de Wolfowitz. O governo federal
exigiu um pedido oficial de desculpas. Os grandes jornais gastaram rios de
tinta para mostrar que a corrupção não é assim tão grave no Brasil. O orgulho
nacional estava ferido de morte. Na época, o caso Mensalão acabara de vir a
público. O partido que ocupava, e ainda ocupa, o poder central do país tinha
montado um esquema de compra e venda de parlamentares, para dizer o mínimo.
Ficamos condoídos porque um gringo qualquer ousou dizer a verdade. Vivemos
a repetir que nosso principal problema é a corrupção. Mas, quando alguém vem lá
de fora para dizer isso ficamos, assim, raivosos, indignados, nos achando
injustiçados.
Tal qual a coruja, que não quer que se diga que seus filhotes são feios,
não queremos que digam aquilo que bem sabemos que somos. Ao contrário de
Narciso, que acho feio o que não é espelho, não queremos ver nossa imagem
espelhada na opinião dos outros, pois bem sabemos que somos uma sociedade
corrompida e que não somos lá muito sérios. Agora mesmo ficamos ofendidos e
horrorizados com a campanha publicitária, em forma de camisetas, que a
multinacional Adidas lançou em alusão a Copa da FIFA. A Adidas é uma das
patrocinadoras da Copa e já está a muitos anos no mercado nacional. A
presidente Dilma ficou indignada pelo suposto apelo sexual contido nas
camisetas. Como sempre, vieram reclamações de todos os lados. Os puros de alma
e os politicamente corretos de plantão se armaram com seus discursos
hipócritas.
Foram tantos os protestos que a multinacional suspendeu a produção e a
distribuição das camisetas. Nossa presidente, dada a arroubos moralistas bem
típicos da esquerda que a originou, disse que as camisetas não ajudam a
combater o turismo sexual. Eu concordo com a presidente. Uma camiseta não ajuda
nem atrapalha o turismo sexual. Se o governo quer combater esse tipo de crime,
na Copa, basta proibir os seus praticantes, que aparecem nas listas da
Interpol, de entrarem no Brasil.
Mas, afinal, o
que essas camisetas têm de tão escandaloso? Rigorosamente, elas não têm nada de
mais. Pelo contrário, elas são bem feitas, bonitas e até divertidas. Elas são,
sim, politicamente incorretas como somos todos nós quando viramos torcedores ou
foliões. A Adidas queria vende-las nos EUA, na Europa e nas arenas, aqui no
Brasil, a preços exorbitantes, claro. Eu vi imagens de duas delas. Numa aparece
a frase "I love Brasil", com o coração transformado num corpo de
mulher que estaria de fio dental. A outra camiseta traz uma mulata de biquíni,
segurando uma bola, tendo o corcovado carioca por trás. Nela lê-se a frase
"Lookin' to Score", que significaria “querendo marcar”. Na gíria
americana poderia significar, também, "querendo arrumar mulher".
Deve ter sido
isso que tanto chocou nossa presidente e os puros de alma que a cercam. Parece
que essa gente não vê televisão, pois passamos quase três meses com a mulata
“globeleza” sambando, completamente nua, em qualquer horário da televisão. Se
compararmos as tais camisetas com a cobertura carnavalesca, focada nos
atributos femininos, a Adidas deveria ser canonizada. Seus executivos devem se
perguntar como proibimos as camisetas se a bunda da mulata brasileira virou
produto de exportação.
Por favor,
deixemos de hipocrisia. Cultivamos desde sempre a imagem do país sensualizado,
da "morena sestrosa de olhar indiferente", como diria Ary Barroso. O
Rio de Janeiro é, sim, uma referência sexual e sensual pelo mundo afora. E isso
foi usado para convencer os executivos da FIFA a trazerem a Copa para cá. O
grande Tim Maia já dizia que a hipocrisia é a mentira da mentira. Então,
deixemos de lado esse falso moralismo esquerdizante. Ninguém vai nos respeitar
mais ou menos por causa desses surtos periódicos de seriedade. Afinal de
contas, essas camisetas só reforçam aquilo que nós mesmos consideramos nossa
marca maior.
AQUI É O POLITICANDO, COM GILBERGUES SANTOS, PARA A
CAMPINA FM.
Nenhum comentário:
Postar um comentário