segunda-feira, 10 de março de 2014

PODE ATÉ PARECER, MAS ISSO NÃO É UMA DITADURA


No sábado, o Debate Integração, produzido pela equipe de jornalismo da Campina FM, tratou do direito a manifestação política no Brasil. Tratou, ainda, das tentativas de se regulamentar a forma como o cidadão deve se expressar em público. Ao que tudo indica, o Estado quer limitar o direito do cidadão de se manifestar livremente nas ruas. De fato, o que está caracterizado é a tentativa de se manipular uma das principais prerrogativas constitucionais que temos que é a liberdade de expressão. Ao ver que o Estado, alicerçado em procedimentos democráticos, pretende ditar como e quando poderemos nos manifestar nas ruas, sobre questões políticas e sociais, lembrei-me da obra “O Leviatã” de Thomas Hobbes.

Hobbes, matemático e filósofo da política, era inglês e viveu entre os séculos XVI e XVII. Ele é tido como o criador do poder absoluto. Foi Hobbes quem mais defendeu a necessidade de termos um Estado e um governo fortes. Hobbes dizia que “se dois homens desejam a mesma coisa, fatalmente se tornarão inimigos”. Para ele, só o Estado pode regular as relações entre os homens de forma que eles não se tornem lobos de si mesmo. Para Hobbes, o Estado deve se valer de um poder absoluto para impedir à violência, a guerra, a baderna e a anarquia. Numa palavra, o Estado poderia agir com força máxima para impedir a negação de sua autoridade.

A quem diga que, no limite, essas ideias deram lastro à formação das ditaduras modernas. De minha parte, penso que se é ruim ter o Estado, como um leviatã pairando sobre nós com suas enormes asas, imagine como seria viver sem. O projeto que o Ministério da Justiça enviou para o Congresso Nacional, para ser visto em regime de urgência, e que propõem a regulamentação das manifestações, lembra a ideia hobbesiana de um Estado controlador das vontades e dos direitos do cidadão. A primeira questão, de uma obviedade irritante, é que este governo, dito democrático, não poderia, sob nenhuma hipótese, querer impor limites ao sagrado direito que o cidadão tem de participar politicamente das coisas da República.

Na Constituição Federal, o direito e as garantias individuais, uma delas a liberdade de expressão, são cláusulas pétreas, ou seja, são aqueles dispositivos que não podem ser alterado nem por força de uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC). O que o governo petista de Dilma Rousseff quer é dar um verniz democrático a um ato autoritário para atender aos interesses da FIFA. Como se sabe, Joseph Blatter exigiu que o governo brasileiro impeça que manifestações ocorram durante a Copa do Mundo. É lógico que se o governo puder dar um jeito para que esses manifestantes nunca mais saiam às ruas tanto melhor. Para a FIFA, e seus patrocinadores, se eles não fizerem nada apenas durante os dias da Copa do Mundo já está de bom tamanho.
 
O ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, disse que o tal projeto pretende regulamentar as manifestações populares. Até aí, nenhuma novidade, eu ficaria mesmo surpreso se tivéssemos um projeto para regulamentar as manifestações da elite. Cardozo disse que o projeto de lei entrará em regime de urgência constitucional. É que já estamos em março e a Copa da FIFA começa em junho. O ministro disse que a lei permitirá que se enfrente uma série de situações em torno da questão política. O regime de urgência garante a apreciação do projeto em até 45 dias, pois, do contrário, a pauta da Câmara será trancada. Mas, este projeto será mesmo aprovado, pois, como é de se esperar, situação e oposição concordam em por fim às manifestações.

Vejam que o governo está bem mais preocupado com a questão política do que com a segurança pública. É que, no Brasil, manifestações e movimentos populares sempre foram tratados como caso de polícia, não como coisa da política. Sintomaticamente, Cardoso anunciou o pacote “anti-manifestação” no lançamento da Campanha da Fraternidade. Vejam como o governo é pouco fraternal para com o cidadão ao tentar limitar suas liberdades. E, notem, não estou falando em igualdade. O projeto prevê o aumento das penas aplicadas aos que forem condenados, por crimes cometidos em protestos de rua, e a proibição do uso de máscaras. O governo ainda quer ser avisado com antecedência da realização de atos públicos e de reuniões. O ministro disse que o projeto é equilibrado e que não quer limitar a liberdade de expressão ou de reunião. Exato, não quer limitar, o que se quer é saber quando e como o cidadão vai protestar contra o governo para, provavelmente, impedi-lo de fazer.

O fato é que o governo chove no molhado. Pois nosso ordenamento jurídico já dispõe sobre o direito do cidadão se expressar publicamente. Para o caso dos “black blocs” estúpidos já existe o código penal, basta aplica-lo. O problema é que a orientação política do governo não é democrática. A questão é que temos o hábito pretoriano de achar que a lei pode sempre ser mais dura e que ela só deve servir para punir, nunca para garantir direitos e preceitos do cidadão.

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