Eu sou do tempo
em que a “Sessão da Tarde” era à tarde e sempre passava bons filmes. Não faz
muito tempo, até porque eu ainda não completei meio século de vida, mas foi uma
época em que os canais concorriam para ver quem tinha a melhor programação.
Hoje, ao contrário, a disputa é para ver quem consegue ser pior, quem produz e
reproduz o que tem de mais tosco em termos de programação. Certa vez, na Sessão
da Tarde, assisti o filme “Fahrenheit
451” do cineasta francês François Truffaut. Lançado em 1966, este filme
trata de uma sociedade fictícia, num futuro hipotético, onde um regime
ditatorial proibia os livros, e toda forma de escrita. Os ditadores desse
regime diziam que os livros deixavam as pessoas infelizes e improdutivas.
Nessa sociedade repressora se alguém fosse pego lendo um livro era preso e
enviado para um processo de “reeducação”. O regime totalitário incentivava as
pessoas a denunciarem os leitores subversivos. Portar livros era um crime da
maior gravidade. A história se desenvolve em torno dos “bombeiros”, uma tropa
de soldados, a serviço do regime, que invadiam casas que tinham livros para
incendiá-los no meio da rua de forma que todos pudessem ver e, claro, temer. A
personagem principal da história é Guy Montag, representada pelo ator Oskar
Werner. Montag era um bombeiro que queimava livros. Até que um dia ele resolveu
descobrir o que os livros tinham de tão perigoso a ponto de merecerem ser
queimados.
Assim, ele começa a furtar livros para ler. Não mais do que repente, ele
mudou. Sua esposa, Linda Montag, desconfiou e o denunciou. Enquanto tudo isso acontecia, Guy Montag se
relacionava com Clarisse, uma mulher que ele conheceu no metrô. Clarisse levou
Guy à terra dos homens-livro, onde as pessoas que liam livros, e eram
perseguidas, se refugiavam. Lá elas decoravam livros para publicá-los quando não
fossem mais proibidos. Certo, eu não vou mais contar nada desse filme. Mas, se
o caro ouvinte quiser saber o que aconteceu com Montag pode fazer o download
desse filme. Lembro ter ficado impressionado com a história de um governo que
queimava livros, até porque os livros já faziam parte de meu universo naquele
momento.
Eu fiquei chocado quando descobri que a história de François Truffaut não
era tão ficção assim, pois, de fato, existiram sociedades e governos que
queimavam livros pelas ruas para que as pessoas não pudessem conhecer as
verdades que tantos os incomodavam. Na Alemanha nazista, na China comunista, no
Chile do Ditador Pinochet, para citar alguns exemplos, se recolhia livros,
tidos como subversivos, para queimá-los. Aqui mesmo, no Brasil, se queimou
muitos livros nos tempos da ditadura militar. Vez por outra, o Exército invadia
alguma universidade, prendia estudantes e professores e, para demonstrar força
e desdém pelo conhecimento, que leva as pessoas a refletirem, fazia enormes
fogueiras com livros recolhidos nas bibliotecas.
Eu lembrei disso tudo na terça-feira quando visitava a 7ª Mostra do Livro
Universitário, que está sendo organizada pela Editora da UEPB até o dia 20 de
junho. São mais de 500 títulos, com especial destaque para obras sobre a
ditadura militar brasileira. Essa Mostra integra o projeto “Livro é Cidadania”,
cujo objetivo é promover o amplo acesso da sociedade ao livro universitário por
preços acessíveis. Claro, a ideia é, também, divulgar as obras publicadas pela
Editora da UEPB. Enquanto via os lançamentos e aproveitava as promoções eu tive
um delírio. Imaginei se seria possível destruir livros nos dias de hoje. Sim,
foi um delírio, mas a ideia de controlar, ou cercear, o conhecimento persiste
em nossa realidade.
Ainda temos países onde se tenta controlar o fluxo de informações das
redes sociais. Aqui mesmo, no Brasil, tramitam projetos no Congresso Nacional
para limitar a venda e divulgação de livros, discos e filmes pela internet. Sem
contar que ainda praticamos a censura aos livros, vejam o caso recente de
Roberto Carlos que foi a justiça proibir a publicação de uma biografia sobre
sua vida e sua carreira artística. Nós não temos um Guy Montag queimando nossos
livros. Mas, temos a tradição de lermos pouco. O Ibope Inteligência entrevistou
5 mil pessoas, em 315 municípios em junho de 2013, e descobriu que a média de
leitura do brasileiro é de 4 livros por ano, sendo que desses 4, apenas 2 são
lidos até o fim.
A pesquisa viu ainda que a Bíblia segue sendo o livro mais lido no Brasil,
seguido pelos livros didáticos, religiosos e pelos contos infantis. O pior da
pesquisa foi atestar que 75% da população nunca frequentou uma livraria. Como
isso é possível? Elementar. É que em 68% dos municípios brasileiros
simplesmente não existem livrarias. E não precisa ir longe. Campina Grande é o
péssimo exemplo disso. Com tantas escolas e universidades não dispomos de uma
única livraria em nossa cidade. Será que Caetano Veloso se inspirou em nossa
cidade quando fez a música “Livros”?. Diz ele: “Quase não tínhamos livros em
casa/ E a cidade não tinha livraria/ Mas os livros que em nossa vida entraram/
São como a radiação de um corpo negro/ Apontando para expansão do Universo/
Porque a frase, o conceito, o enredo, o verso/ É o que pode lançar mundos no
mundo”.
AQUI É O
POLITICANDO, COM GILBERGUES SANTOS, PARA A CAMPINA FM.
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