Uma das condições para que um país tenha seu
sistema democrático consolidado é que nele se consiga ter eleições
competitivas, livres e limpas para o legislativo e o executivo. Outra condição
é que este mesmo país faça transições políticas sem sobressaltos. Existem dois
tipos de transição. As transições de Estado, que é quando se muda por completo
o sistema político. No final da década de 80 vimos várias dessas aqui na
América Latina. Aqui mesmo no Brasil tivemos um processo parecido com esse.
Foram os processos em que vários países transitaram
de sistemas políticos autoritários para regimes políticos em que as
instituições e os procedimentos são de tipo democrático. Mas, este não é o caso
que quero tratar. O tipo de transição que interessa, aqui, é a de governo. Ou
seja, quando através de um processo eleitoral muda-se o chefe do poder
executivo seja nacional, estadual ou municipal. Alguns falam da questão da alternância
de poder.
A alternância de poder seria a transição entre
grupos político-sociais diferentes entre si. Um bom exemplo foi à transição de
governo entre FHC e Lula. Lula era diferente de FHC, principalmente em termos
de origem social. Quando um governo sucede outro e muda, por exemplo, a
política econômica praticada não significa dizer que está, necessariamente,
havendo uma alternância de poder. Pois governos de um mesmo partido podem fazer
coisas bem diferentes.
No Brasil, em termos de transição, não somos lá
muito experientes e nem nos acostumamos a processar as transições de maneira
calma, ordeira e, fundamentalmente, republicanas. Como passamos quase metade do
século XX sob regimes ditatoriais ainda não sabemos bem o real significado de
uma eleição, ou seja, aquilo nos leva a escolher representantes. Assim como não
sabemos como devemos proceder numa transição de governo.
Lá no passado era raro
termos uma eleição e quando tínhamos acontecia de tudo. Chegamos ao ponto de
termos um golpe para garantir que Juscelino Kubitschek, presidente quase
democraticamente eleito, fosse empossado. O golpe preventivo do Marechal Lott
de 11/11/1955 foi uma movimentação político-militar destinada a assegurar a
posse de Kubitschek e seu vice, João Goulart. No Brasil era assim mesmo, tudo
se resolvia pela força das armas, até a democracia.
O fato é que a UDN, de
Carlos Lacerda, queria impedir que JK fosse eleito. Depois que perderam a
eleição, os udenistas pediram aos militares para que impedissem a posse. JK se
antecipou aos fatos e, numa articulação com o Marechal Lott, garantiu sua
posse. Inclusive ficou famosa a frase de Lacerda que é o
suprassumo do autoritarismo nacional. Disse ele: “JK não deve ser candidato, se
for, não deve ser eleito. Se ganhar a eleição, não deve tomar posse. Se tomar
posse tem que ser derrubado por um golpe”.
Interessa notar que tanto no passado, como no
presente, são as armas que garantem (ou não) que procedimentos democráticos se
realizem. Não foi isso que vimos com as tropas federais garantindo as eleições
desse ano? Outro problema que temos com a
questão da transição política é o apego desmedido que os partidos e atores
políticos possuem em relação aos cargos públicos e as estruturas de poder de
nosso país.
Existe uma cultura política pouco republicana que
faz com que não se queira deixar o cargo executivo que se ocupa. Veja-se, por
exemplo, que FHC comprometeu parte de seu 1º mandado nas articulações para que
se votasse a emenda da reeleição. E, todos sabemos, que o procedimento para
“convencer” os deputados federais de votar a favor dela foram os mesmos
utilizados pelo PT no caso do mensalão. Aliás, a emenda da reeleição foi de um
casuísmo a toda prova.
Para convencer o espectro político brasileiro a aceitar
a reeleição, FHC ofereceu um pacote completo. Além dos recursos mensaleiros,
ofereceu a possibilidade de prefeitos e governadores terem, também, o direito a
reeleição. Assim, as transições políticos
passaram a ser mais raras e mais confusas na medida em que muitos não assimilam
a ideia de que passados oitos anos em um cargo executivo terão que, finalmente,
deixa-lo para que um adversário assuma.
Agora que as eleições municipais acabaram nos
voltamos para acompanhar o processo de transição não só em Campina Grande como
pela Paraíba afora. O jogo político eleitoral acabou apenas para os derrotados,
para os vencedores está apenas começando.
Chegou a hora de sabermos quem tem um comportamento
verdadeiramente republicano e quem acha que a prefeitura não passa de uma
extensão de seus negócios particulares ou que deve ser um assunto tratado
apenas nas reuniões dominicais de família.