Continuamos a acompanhar a Ação Penal 470, conhecida
como “Processo do Mensalão”. Consumada a fase das condenações, assistimos,
agora, o STF fazendo a dosimetria – onde os ministros definem o tamanho das
penas a serem aplicadas. Como se sabe, parte delas deve ser cumprida em regime
fechado.
O Ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, não
por acaso filiado ao PT, foi quem primeiro se manifestou sobre o cumprimento das
penas. Claro, ele está preocupado com o bem estar de seus companheiros que
terão que ficar algum tempo numa penitenciária.
São 25 pessoas envolvidas no caso do mensalão. Todas já foram condenadas
e a maioria terá que cumprir parte de sua pena em regime fechado. Lembrando que
a prisão especial, para quem tem curso superior, não se aplica a quem já foi condenado.
Zé Dirceu, José Genoíno, Delúbio Soares, João Paulo
Cunha, Marcos Valério, Roberto Jefferson, Valdemar Costa Neto, e et caterva, terão que ser recolhidos a
uma unidade prisional assim que todo o processo tiver terminado. Cardozo fez um
longo relato sobre os defeitos do sistema prisional brasileiro. Disse que ele é
medieval, que não tem como recuperar ninguém para o convívio social. Cardozo
ainda afirmou estar preocupado com a integridade física dos mensaleiros.
Notem que Cardozo falou como se não fosse o titular
do Ministério responsável pelo sistema prisional do país. O ministro falou como
se não tivesse responsabilidades por esse sistema que ele mesmo considera
medieval. A discussão chegou ao STF. Numa dessas tardes quentes de novembro, os
ministros abriram um parêntese na discussão da dosimetria e passaram a opinar
sobre as declarações do ministro Cardozo.
Eles opinaram sobre o qual seria a forma mais
pedagógica de punir um mensaleiro e da qualidade do nosso sistema prisional.
Mas, isso não alterou o propósito do STF de dar cabo desse julgamento que a
sociedade acompanha. O ministro Dias Toffoli disse ser favorável a penas financeiras. Para
ele, pedagógico é condenar a pessoa a recuperar valores desviados, já que os
presídios têm resquícios do período medieval.
O ministro Marco Aurélio
concordou com Toffoli e disse que: “a parte mais sensível do corpo humano é o
bolso”. Eu não sei dos ministros do STF, mas a parte mais sensível de meu corpo
e de minha mente é a liberdade que tenho para ir e vir para onde bem quiser. Pergunte
a qualquer desses mensaleiros se eles aceitariam pagar 20 vezes mais do que
desviaram dos cofres públicos para não ter que ficar um dia sequer na cadeia.
Eu aposto tudo, menos minha liberdade, claro, como eles pagariam sim e de bom
grado.
O ministro Gilmar Mendes disse até concordar com o
ministro da justiça, que realmente o problema existe e que “temos um inferno
nos presídios”. Mas, Mendes alertou para o fato de que agora é tarde, que essa
discussão deveria ter sido feita antes do julgamento. Gilmar Mendes pôs o dedo
na ferida quando solicitou ao governo federal que participe do debate sobre a
segurança pública de forma mais enfática com mais verbas e, de fato,
coordenando a reforma do sistema prisional.
O Estado brasileiro e os governos deixaram que o
sistema prisional se tornasse medieval. Ao longo dos anos, as prisões
brasileiras vêm servindo, em geral, como depósito das camadas sociais tidas
como indesejáveis. Porque a preocupação agora? Porque a quadrilha chefiada por
José Dirceu foi julgada, condenada e culpada na Ação Penal 470? O ministro da
Justiça só lembrou que os presídios brasileiros são medievais porque seus
companheiros terão que passar uma temporada em um deles?
Deve ter sido por isso, que o ministro Celso Mello
disse que o sistema de execução penal é um “exercício de ficção jurídica”. Mello
foi até irônico quando disse que “... a mudança no sistema prisional tem que
partir do próprio Ministério da Justiça”. O fato é que o sistema
prisional brasileiro foi sempre medieval. Apenas se constatou isso pela
preocupação do que pode vir a acontecer com membros da elite política que terão
que utilizar as dependências de alguma prisão em algum estado do país.
Mas, sempre há uma saída. Como somos uma sociedade
de privilégios para poucos temos as situações especiais para aqueles que se
utilizam de seus privilégios para cometerem crimes. Os mensaleiros podem
cumprir suas penas no “Presídio de Caras” como é conhecida a Unidade Prisional
de Tremembé em São Paulo. Para lá são mandadas as celebridades do mundo
jurídico. São os que tinham tudo para não estarem presos, mas que em algum
momento de suas vidas resolveram transgredir a lei.
Os mensaleiros fariam companhia a Roger
Abdelmassih, a Alexandre Nardoni, a Cristian e Daniel Cravinhos, a Pimenta
Neves e tantos outros. Zé Dirceu poderia até dar curso de formação política
para eles, ou seria melhor não?