Segundo o
Dicionário Caldas Aulete, “vivandeira” é a mulher que acompanha tropas,
em marcha, para fornecer aos soldados alimentos, bebidas e outros gêneros. O
termo vem do francês “vivandière”, ou seja, a pessoa que negocia víveres em
feiras ou arraiais. Os franceses já
diziam que vivandeiras eram as mulheres que pousavam nos acampamentos militares
para venderem de tudo um pouco, inclusive o corpo. Na Guerra do Paraguai e na
de Canudos o Exercito brasileiro se servia bem das vivandeiras. Historiadores
dão conta do importante papel, desempenhado pelas vivandeiras, que acompanharam
a Coluna Prestes, pelos mais de 25 mil quilômetros de boa parte do território
nacional, quando das lutas contra o governo federal entre 1924 e 1927.
Eu não sei exatamente como ou quem introduziu o termo vivandeiras no
noticiário politico. O fato é que entre as décadas de 40 e 60 do século XX
passou-se a chamar, ironicamente, claro, de vivandeiras os civis que viviam em
volta do Exercito. Ouvi em algum lugar que foi o escritor Sérgio Porto, também
conhecido pelo pseudônimo de Stanislaw Ponte Preta, quem criou a metáfora que
deu tão certo. E eu não duvido, pois esse tipo de ironia inteligente era típica
de Sérgio Porto. Com o fim da 2ª Grande Guerra, fomos obrigados, pela
conjuntura internacional, a implantar um sistema que não fosse ditatorial,
mesmo que não precisasse ser democrático. Com a queda de Getúlio Vargas
passamos 19 anos elegendo presidentes.
Até 1964, quando iniciamos outra etapa ditatorial, era muito comum que
atores e partidos políticos, derrotados nas eleições, não aceitassem a
legalidade e a legitimidade dos resultados e fossem, literalmente, bater às
portas dos quartéis. Entre o 2º governo de Getúlio Vargas, passando pelos anos
de Juscelino Kubitschek, e o período de João Goulart setores autoritárias e retrógrados
de nossa sociedade pediam sempre para que o Exército interviesse na ordem
política e social do país. Forças políticas conservadoras não pestanejavam em
pedir que os militares usassem a força para interromper o processo eleitoral, o
debate político, as reformas sociais ou mesmo a atuação de um governo
constitucionalmente eleito.
Foi por isso que ganharam a denominação, nada honrosa, de vivandeiras dos
quartéis. Tal qual as vivandeiras da Guerra de Canudos, estas forças ficavam
por ali arrodeando os militares, dispostas a tudo, para que eles dessem cabo de
seus interesses. A vivandeira mais conhecida dessa época foi Carlos Lacerda, um
dos fundadores da União Democrática Nacional, que foi deputado federal e governador
do antigo Estado da Guanabara. Lacerda levava a sério o papel de vivandeira e
por isso pagou caro. “O Corvo”, como era mais conhecido, era dono do jornal “A
Tribuna da Imprensa”, uma espécie de Revista Veja da época. Através dos
editoriais que lançava em seu Jornal, Lacerda exercitava o suprassumo do
autoritarismo verde amarelo.
Tal qual o PSDB, em relação ao PT, a UDN de Lacerda perdeu 4 eleições
seguidas para a estrutura política comandada por Getúlio Vargas de 1949 até
1960. Em todas as situações a UDN não se conformou em perder e foi bater as
portas da caserna. Um ótimo exemplo
disso foi quando da campanha eleitoral de 1955 que terminou elegendo JK
presidente. Lacerda, prevendo a derrota e ciente de que não a aceitaria, lançou
o mais famoso de seus editoriais. Dizia “O Corvo”: “JK não deve ser candidato, se for, não deve ser eleito. Mas, se ele
ganhar, não deve tomar posse, e se isso acontecer deve ser deposto pelas Forças
Armadas”. Simples assim. Sem meias palavras.
A lógica de Lacerda era fruto de nossa sociedade autoritária. É mais ou
menos assim: se eu não posso ser eleito democraticamente, não faz mal, eu me
articulo com os militares, promovo um golpe de força e, finalmente, assumo o
poder. Lacerda e as vivandeiras da sociedade da época tanto fizeram que
conseguiram. Em 1964, os militares golpearam as instituições, cassaram o
presidente eleito, e implantaram um regime que prendia, torturava e matava seus
opositores. Agora mesmo, vendo as vivandeiras dos nossos dias pedindo que as
Forças Armadas intervenham, para depor a presidente Dilma, fico a me perguntar
por que, passados 50 anos, ainda somos assim, tão autoritários, tão toscos?
Os dias que antecederam o Golpe de
1964 foram assim. Setores da sociedade iam às ruas pedir que o Exército depusesse
João Goulart. O argumento era de que Jango era um corrupto. Vejam que
coincidência, a mesma acusação que fazem a Dilma. Hoje, a aparência
enganosamente boa de democracia que temos obriga nossas vivandeiras partidárias
a outra estratégia. Ao invés de baterem as portas dos quartéis, buscam os
tribunais acarpetados de Brasília. Mas, temos as vivandeiras joviais que vão às
ruas com suas mentalidades empoeiradas por um autoritarismo tardio. E o que
dizer das que ficam pelas redes sociais propagando um sem número de mentiras?
Porca miséria essa nossa que não mudamos enquanto o tempo passa bem em frente
aos nossos olhos.
AQUI É O
POLITICANDO, COM GILBERGUES SANTOS, PARA A CAMPINA FM.
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