Millôr Fernandes era desenhista, humorista, dramaturgo,
escritor e jornalista. Millôr era, ainda, um sensacional frasista. Com poucas
palavras, e uma ironiza cortante, ele ia revelando nossos maiores temores,
dilemas e problemas. Por excesso de inteligência, e pelos ossos do ofício de
humorista, Millôr não levava o Brasil a sério. Coisa que eu mesmo deveria,
também, fazer. Mas, como não sei fazer graça de nossas desgraças, me contento
em analisa-las. Millôr dizia: “Viva o
Brasil, onde o ano inteiro é primeiro de abril”. É que neste país,
irritantemente ensolarado, acontecem coisas que, aos olhos estrangeiros,
parecem mentira. Eu aprendi a ser um realista pessimista lendo as crônicas de
Millôr. Ele dizia, se referindo as nossas mazelas politicas e sociais, que: “No
Brasil, o fundo do poço é só uma etapa”.
Se você, como eu, achou que o “7 X 1”, que a Alemanha aplicou no Brasil, foi o
fundo do poço do nosso futebol, chegou a hora de revermos nossas opiniões.
A tragédia do
Mineirão, na Copa do Mundo, foi uma etapa no caminho que o futebol brasileiro
trilha para se tornar algo sem importância para nós e para o mundo. O vexame do
dia 08 de julho não é nem a metade do caminho rumo ao fundo do poço. Não que eu
queira discutir questões técnicas, apesar de que não precisa ser um estudioso
do futebol para atestar que nosso primeiro esporte se tornou algo sem graça,
sem emoção, sem qualidade e, principalmente, sem seriedade. Tostão, craque da
Seleção tricampeã do mundo, escreveu, num artigo para a Folha de São Paulo, que:
“Estamos na 2ª divisão do futebol
mundial”. É que, na Europa, se investe mais na técnica, na ciência, na
organização e na qualidade do futebol.
Segundo Tostão, “o futebol do Brasil tende a estagnação,
dentro e fora de campo, pois o poder politico e financeiro não quer mudanças,
apenas o lucro”. Enquanto jogadores e técnicos se abatem pelos gramados,
cartolas e políticos cuidam dos lucros. Agora mesmo, vemos a “bancada da bola”,
no Congresso Nacional, mobilizada para barrar, de uma vez por todas, a Lei de
Responsabilidade Fiscal do Esporte (LRFE). A ideia é manter interesses pouco
futebolísticos para além e acima da lei. Esse é o grande, o principal, problema
do futebol no Brasil. Acostumamo-nos a ter o futebol como algo a parte das
instituições, do Estado. Tratamos o futebol como nossa paixão, algo
passional. Achamos que ele não tem que
se submeter as leis desse país.
Dentro da LRFE tem um
artigo que trata da renegociação das dívidas dos clubes de futebol, para com o
Estado brasileiro, sem que estes tenham que dar alguma contrapartida ao
governo. Mais uma vez, o Estado brasileiro vai perdoar dividas. Este artigo faz
parte da Medida Provisória 656/2014 que trata de isenções tributárias e do
reajuste da tabela do imposto de renda. Ele foi idealizado pelo deputado
federal Jovair Arantes (PTB) que, não por acaso, é vice-presidente do
Atlético-GO. O artigo propõe um prazo de 20 anos para que entidades desportivas
quitem seus débitos junto a União e que as multas, relativas às dividas, sejam
reduzidas em 70% do valor isolado, em 30% dos juros de mora e em 100% sobre o
valor dos encargos legais.
A ideia é que as
dividas estacionem em seus valores originais e que possam ser pagas num prazo a
perder de vista. A renegociação das dívidas, dos times de futebol, vem sendo
discutida no Congresso Nacional há quase 15 anos. Em 2013 se apresentou o
Projeto de Lei 5.201, conhecido como PROFORTE (Programa de Fortalecimento dos
Esportes Olímpicos). A discussão não é sobre como as dívida vão ser executadas,
como o Estado vai cobrar essas dívidas junto aos times de futebol. No Congresso
a discussão gira em torno de como se vai dar um jeitinho para que os times
sigam inadimplentes. É que os parlamentares, também torcedores, não querem se
sentir culpados em cobrar dividas de seus times do coração.
Os deputados não
querem que os torcedores/eleitores fiquem sabendo que seus times queridos
deixaram de fazer grandes contratações para pagar dividas junto ao governo
federal. No Brasil, quando o assunto é futebol, somos todos irresponsáveis. A
bancada da bola defende o PROFORTE por ele ser leniente com os maus pagadores e
por ainda prever o acesso dos times a mais e mais verbas públicas. A bancada da
bola teme a LRFE porque ela trata da renegociação das dívidas, sem prever
perdão. Essa lei traz contrapartidas que preveem punições aos clubes que
voltarem a contrair débitos, como perda de pontos e até rebaixamento em
campeonatos disputados. Essa lei é mais uma tentativa no sentido de dar alguma
seriedade fiscal ao futebol brasileiro. É por isso tudo que nosso futebol segue
lépido e fagueiro rumo ao fundo do poço que nos nem bem sabemos onde fica e nem
como fica. Amanhã, vou continuar discutindo as mazelas do futebol brasileiro
lembrando sempre que ele é fruto de nossa cultura.
AQUI É O
POLITICANDO, COM GILBERGUES SANTOS, PARA A CAMPINA FM.
Nenhum comentário:
Postar um comentário