segunda-feira, 22 de dezembro de 2014

AFINAL, CHEGAMOS AO FUNDO DO POÇO? Parte I.

Millôr Fernandes era desenhista, humorista, dramaturgo, escritor e jornalista. Millôr era, ainda, um sensacional frasista. Com poucas palavras, e uma ironiza cortante, ele ia revelando nossos maiores temores, dilemas e problemas. Por excesso de inteligência, e pelos ossos do ofício de humorista, Millôr não levava o Brasil a sério. Coisa que eu mesmo deveria, também, fazer. Mas, como não sei fazer graça de nossas desgraças, me contento em analisa-las. Millôr dizia: “Viva o Brasil, onde o ano inteiro é primeiro de abril”. É que neste país, irritantemente ensolarado, acontecem coisas que, aos olhos estrangeiros, parecem mentira. Eu aprendi a ser um realista pessimista lendo as crônicas de Millôr. Ele dizia, se referindo as nossas mazelas politicas e sociais, que: “No Brasil, o fundo do poço é só uma etapa”. Se você, como eu, achou que o “7 X 1”, que a Alemanha aplicou no Brasil, foi o fundo do poço do nosso futebol, chegou a hora de revermos nossas opiniões.

A tragédia do Mineirão, na Copa do Mundo, foi uma etapa no caminho que o futebol brasileiro trilha para se tornar algo sem importância para nós e para o mundo. O vexame do dia 08 de julho não é nem a metade do caminho rumo ao fundo do poço. Não que eu queira discutir questões técnicas, apesar de que não precisa ser um estudioso do futebol para atestar que nosso primeiro esporte se tornou algo sem graça, sem emoção, sem qualidade e, principalmente, sem seriedade. Tostão, craque da Seleção tricampeã do mundo, escreveu, num artigo para a Folha de São Paulo, que: “Estamos na 2ª divisão do futebol mundial”. É que, na Europa, se investe mais na técnica, na ciência, na organização e na qualidade do futebol.

Segundo Tostão, “o futebol do Brasil tende a estagnação, dentro e fora de campo, pois o poder politico e financeiro não quer mudanças, apenas o lucro”. Enquanto jogadores e técnicos se abatem pelos gramados, cartolas e políticos cuidam dos lucros. Agora mesmo, vemos a “bancada da bola”, no Congresso Nacional, mobilizada para barrar, de uma vez por todas, a Lei de Responsabilidade Fiscal do Esporte (LRFE). A ideia é manter interesses pouco futebolísticos para além e acima da lei. Esse é o grande, o principal, problema do futebol no Brasil. Acostumamo-nos a ter o futebol como algo a parte das instituições, do Estado. Tratamos o futebol como nossa paixão, algo passional.  Achamos que ele não tem que se submeter as leis desse país.

Dentro da LRFE tem um artigo que trata da renegociação das dívidas dos clubes de futebol, para com o Estado brasileiro, sem que estes tenham que dar alguma contrapartida ao governo. Mais uma vez, o Estado brasileiro vai perdoar dividas. Este artigo faz parte da Medida Provisória 656/2014 que trata de isenções tributárias e do reajuste da tabela do imposto de renda. Ele foi idealizado pelo deputado federal Jovair Arantes (PTB) que, não por acaso, é vice-presidente do Atlético-GO. O artigo propõe um prazo de 20 anos para que entidades desportivas quitem seus débitos junto a União e que as multas, relativas às dividas, sejam reduzidas em 70% do valor isolado, em 30% dos juros de mora e em 100% sobre o valor dos encargos legais.

A ideia é que as dividas estacionem em seus valores originais e que possam ser pagas num prazo a perder de vista. A renegociação das dívidas, dos times de futebol, vem sendo discutida no Congresso Nacional há quase 15 anos. Em 2013 se apresentou o Projeto de Lei 5.201, conhecido como PROFORTE (Programa de Fortalecimento dos Esportes Olímpicos). A discussão não é sobre como as dívida vão ser executadas, como o Estado vai cobrar essas dívidas junto aos times de futebol. No Congresso a discussão gira em torno de como se vai dar um jeitinho para que os times sigam inadimplentes. É que os parlamentares, também torcedores, não querem se sentir culpados em cobrar dividas de seus times do coração.

Os deputados não querem que os torcedores/eleitores fiquem sabendo que seus times queridos deixaram de fazer grandes contratações para pagar dividas junto ao governo federal. No Brasil, quando o assunto é futebol, somos todos irresponsáveis. A bancada da bola defende o PROFORTE por ele ser leniente com os maus pagadores e por ainda prever o acesso dos times a mais e mais verbas públicas. A bancada da bola teme a LRFE porque ela trata da renegociação das dívidas, sem prever perdão. Essa lei traz contrapartidas que preveem punições aos clubes que voltarem a contrair débitos, como perda de pontos e até rebaixamento em campeonatos disputados. Essa lei é mais uma tentativa no sentido de dar alguma seriedade fiscal ao futebol brasileiro. É por isso tudo que nosso futebol segue lépido e fagueiro rumo ao fundo do poço que nos nem bem sabemos onde fica e nem como fica. Amanhã, vou continuar discutindo as mazelas do futebol brasileiro lembrando sempre que ele é fruto de nossa cultura.

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AQUI É O POLITICANDO, COM GILBERGUES SANTOS, PARA A CAMPINA FM.

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