O caro ouvinte que viveu, ou tem algum conhecimento do
período da ditadura militar, iniciada com o golpe de 1964, deve ter informações
suficientes para saber dos males que ela nos causou. E é por isso mesmo que
deverá se surpreender com o que vou dizer. Hoje, é comum vermos pessoas
afirmando que a corrupção é um mal das democracias e que só um retorno à
ditadura militar moralizaria o Brasil. Eu mesmo já me surpreendi ao ver alguns
alunos e professores, da UEPB, concordando com isso. A visão, deturpada, de que
foi o PT, a partir dos governos de Lula e Dilma, que inaugurou a corrupção no
Brasil é de uma fragilidade a toda prova. Supor que chegamos ao nível da lama,
a partir de 2002, só pode ser coisa da cabeça senil de Lobão.
Um ouvinte me questionou porque não “vejo a bagunça que está o Brasil com esse governo?”. Eu diviso bem
os maus feitos e efeitos do PT e vejo acima e além desse discurso falso
moralista e hipócrita que vem, por exemplo, das ruas de São Paulo. Ouvi o
relato de um colega que disse que, numa turma com 20 alunos, apenas um
discordou da ideia de que só uma intervenção militar acabaria com a corrupção
no Brasil. Por isso, mais uma vez, vou recorrer a nossa história política
recente. A corrupção (ou bagunça como queira) petista, tucana e de tantas
outras colorações partidárias é filha direta da que se praticava no tempo dos
generais. Eu não quero decepcionar ninguém, mas não foi o PT que inventou o
mensalão.
José Dirceu e sua
quadrilha aperfeiçoou o que se pratica no Brasil desde tempos imemoriais. A
Operação Lava Jato é supra e intrapartidária. A Petrobrás é alvo predileto da
rapinagem desde que foi criada e em especial no período militar. A tese de que
no regime militar não havia escândalos, devido a uma suposta moralidade
implantada pelo Exército, é, no mínimo, equivocada. Na década de 1970 se
produziram muitos escândalos que não eram divulgados porque a imprensa sofria
censura.
O historiador Pedro
Henrique Campos acaba de lançar o livro
“Estranhas catedrais – as empreiteiras brasileiras e a ditadura civil-militar”,
pela Editora da Universidade Federal Fluminense. Se você pretende não mais se
enganar, leia esse livro. Pedro Campos afirma que, durante a ditadura, não se
tinha acesso à informação. Os escândalos não vinham à tona, o que não quer
dizer que não existissem. Para ele, em relação ao aparelho de Estado, a
apropriação era ainda maior do que hoje em dia. Segundo o historiador, a
influência de empreiteiras junto ao governo federal teve origem na ditadura
militar. Foi com o golpe de 64 que elas passaram a ter poder e a participar dos
escândalos de corrupção.
Ele descreve como o
setor privado de infraestrutura participou ativamente do processo de tomada de
decisão, junto aos cinco generais/presidentes que tivemos, e como este setor se
manteve bem próximo ao Estado brasileiro mesmo com a redemocratização. Quer
mesmo saber quando foi que essa gente, que vive de fazer empreitadas com o
Estado, conquistou seu lugar ao sol? Foi com as obras da construção de
Brasília, ainda na segunda metade da década de 1950, no governo de Juscelino
Kubitschek. Todas aquelas obras maravilhosas, projetas por Oscar Niemeyer,
foram super, hiper, mega faturadas. Ali surgiram grandes fortunas com o detalhe
que quase nada foi investigado para não atrapalhar o sonho dourado de termos
uma nova capital.
Já na ditadura não
havia eleição para presidente, portanto não havia o Caixa 2 das campanhas
eleitorais. Tudo era feito diretamente com o governo. Os militares criaram o
cenário ideal para a proliferação de todo tipo de negociação escusa. Logo que
tomaram o poder, fizeram, com a valorosa contribuição de Delfim Netto e Otávio
Bulhões, uma ampla reforma econômica que superdimensionou os recursos para
investimentos em infraestrutura e cortou gastos com saúde e educação. É a mesma
coisa que os governos, de Sarney a Dilma, fizeram e fazem. A ideia foi sempre
carrear recursos para este mundo que só funciona na base do toma-la-da-cá. Os
militares conduziam grandes quantias para as tais obras públicas.
As empreiteiras se
apropriavam desses recursos, sob a justificativa de promover o desenvolvimento
nacional. Foi assim que a Transamazônica, as usinas de Itaipu e Angra 1, a
Ponte Rio-Niterói, por exemplo, foram erguidas. São as “estranhas catedrais” de
que nos fala Chico Buarque em “Vai Passar”. Havia uma regra no regime militar.
Os participantes dos esquemas de corrupção tinham que contribuir para com a
“caixinha da repressão”. Quem se locupletava do erário tinha que dar sua cota
para que o Estado torturasse e matasse cidadãos brasileiros. Se você quer viver
em uma ditadura pode defender isso. Afinal, vivemos em uma democracia, com suas
fragilidades, mas uma democracia, onde se pode ter e defender opiniões. Mas,
esqueça essa história de um sistema imune à corrupção, ela é falsa.
AQUI É O
POLITICANDO, COM GILBERGUES SANTOS, PARA A CAMPINA FM.
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