Hoje, 10 de dezembro de 2014, pode vir a ser uma importante
data histórica ou uma daquelas datas condenadas a cair no esquecimento nacional
num piscar de olhos. No entanto, não saberemos disso agora, teremos que
aguardar o desenrolar dos fatos. É que hoje é o dia em que a Comissão Nacional
da Verdade vai entregar o relatório conclusivo de um trabalho que durou quase
três anos. Hoje, teremos acesso a uma série de verdades, que já conhecíamos, e
outras tantas que podem até nos surpreender. Já sabemos de antemão que este
relatório aponta cerca de 300 agentes públicos (militares e civis) que atuaram
a serviço do Estado militarizado, na repressão política que se instalou após o
golpe civil-militar de 1964.
No relatório consta que essas
pessoas investigavam, prendiam, torturavam, assassinavam e sumiam com os corpos
dos que o regime militar considerava seus inimigos e/ou uma ameaça à segurança
nacional. O relatório, claro, é polêmico. E não poderia ser diferente, pois ele
mexe e remexe em feridas que nunca cicatrizaram, mesmo que tenham sido anestesiadas
pela insistente tese de que seria salutar, para nosso sistema democrático, que
todos esquecêssemos este passado tão incômodo. De fato a que se ter parcimônia,
pois o relatório não traz os feitos de um suposto herói da pátria. Ao
contrário, indica nomes dos que atuavam nos porões da ditadura, praticando a
abjeta, imunda, asquerosa tortura.
O jornalista Elio
Gaspari chamou essa gente sórdida de a “gorilada” em sua obra “As ilusões
armadas”, uma série que cobre toda a ditadura militar. No www.arquivosdaditadura.com.br você acessa os livros e o arquivo do próprio Gaspari. Mas, o relatório
trará, também, os chefes da “gorilada”. Um deles o Cel. João Paulo Burnier, que
comandou o DOI-CODI de São Paulo, e que costumava ocupar o tempo vago
assistindo a sessões de tortura. Ele mesmo se tornou um especialista no
assunto. E não para por aí. Alguns membros da CNV disseram à imprensa que o
relatório responsabilizará ex-presidentes da República, generais de 4 estrelas,
que governaram o país nos anos da ditadura. Possivelmente, um desses será
Ernesto Geisel.
Durante muito tempo,
se tratou Geisel como um “bom ditador”, pois havia a crença, um mito na
verdade, de que ele era contra a tortura. Foi Elio Gaspari que fez a máscara
cair. No 3º Volume de sua obra, “A ditadura derrotada”, se desfaz o mito. Em
fevereiro de 1974, Geisel analisou a situação política do país com seu Ministro
do Exercito, Gal. Dale Coutinho. A certa altura da conversa, o presidente diz: “A subversão continua. Esse negócio não
acaba. Isto é um vírus que não há antibiótico que liquide”. O ministro
respondeu que: “O negócio só melhorou
quando nós começamos a matar. Eu fui obrigado a tratar esse problema e tive que
matar”. Ao que Geisel, concordando, disse: “Esse troço de matar é uma barbaridade, mas acho que tem que ser
assim”.
E esses dois eram
tidos como abertos ao diálogo. Imagine o que era capaz de fazer a linha dura do
regime? É por isso mesmo que os comandantes das Forças Armadas, de ontem e de
hoje, estam tão preocupados com a divulgação do relatório final da CNV. Os
clubes militares, que representam oficiais da reserva, tentaram até ontem
impedir a divulgação do relatório. Após seguidas derrotas judiciais, admitiram
que a divulgação do relatório acontecerá. O que não significa que vão aceita-lo
passivamente.
Dilma Rousseff está
tão receosa da animosidade do setor militar, em relação ao relatório, que
tentou recuar da cerimônia marcada para logo mais às 9 horas no Palácio do
Planalto. Ela não queria um ato público e sim uma reunião fechada com a CNV. Mas,
isso repercutiu negativamente e o governo decidiu fazer a cerimônia com os
membros da CNV, com 50 convidados, além da imprensa, claro. É que Dilma
enfrenta uma crise no Congresso e quer evitar outra com os homens de farda. O
Clube Militar do Rio de Janeiro lançou uma nota dizendo que a "verdade histórica pode ser prejudicada pelo
documento, que só investigou os abusos cometidos por agentes do Estado, sem se
preocupar com os crimes cometidos pela esquerda”.
É bom não esquecer que a CNV vai recomendar à presidente Dilma que cerca
de cem desses agentes, a serviço da ditadura militar, sejam levados a
julgamento por crimes de tortura, assassinato e desaparecimento de corpos. A
apreensão no meio militar é enorme, pois a CNV, a OAB, a Associação Brasileira
de Imprensa, dentre outras, pressionam o governo para que o relatório origine
punições. Os militares gostam de lembrar que a Lei da Anistia segue vigente. Mas,
se era para não punir ninguém, porque se investigou? Essa data só será
histórica se, e somente se, o governo decidir encarar os fatos e buscar rever a
Lei da Anistia, para que o relatório da CNV possa ajudar a revisão de um
passado que teima em não passar.
AQUI É O
POLITICANDO, COM GILBERGUES SANTOS, PARA A CAMPINA FM.
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