Minha filha me perguntou o que eu daria a ela no
dia das crianças. Como ela vive dizendo que é uma pré-adolescente, eu disse que
não daria nada, pois o dia era das crianças. Eu disse que no dia do
pré-adolescente lhe daria um presente. Ela argumentou que esse dia ainda não
foi criado. Vi, então, que minha filha está deixando de ser criança. Percebi
que o dia da criança existe para que lembremos que elas são eternas.
Minha filha diz que não gosta de política. Ela reclama
que eu só falo de política e já me questionou porque é que a COLUNA POLITICANDO
só fala dessa “coisa chata que é a política”. Eu já elaborei várias teses para
explicar a minha filha (e algumas outras pessoas, candidatos inclusive) que a
política é uma coisa só nossa, dos animais racionais, que a política existe
para, junto com outras coisas, dar razão a nossa existência.
O mais engraçado é que minha filha diz não gostar
de política, mas ela me enche de perguntas sobre a política eleitoral. Domingo
passado ela fez questão de ir até a urna comigo, apesar de que eu impus a ela
um voto de silêncio. É que a democracia pertence ao mundo das crianças. Já as ditaduras e os
autoritarismos de toda sorte pertencem ao mundo dos adultos. Minha filha diz
detestar política, mas ela pratica a exaustão o oxigênio da política que é a
capacidade de argumentar.
Certa vez ela disse que “queria tirar a pilha do Jornal Nacional”.
É que ela queria que eu não assistisse o jornal para brincar com ela e eu dizia
que precisava assisti-lo para me informar.
Tal qual os políticos
experientes, minha filha não perde a oportunidade de se sair com uma boa
resposta. Um dia eu disse que “ia chamar
a Supernanny para dar um jeito na teimosia dela”. Ela não se fez de rogada
e disse que: “Quem está precisando da Supernannny é você e minha
mãe que só hoje já brigaram duas vezes”.
Minha filha gosta, como alguns políticos, de dar
respostas diretas. Quando eu perguntei o que ela iria fazer com minha máquina
calculadora, ela respondeu de bate-pronto: “somações”. Outra vez ela justificou
da seguinte maneira, quando eu perguntei por que a aula tinha acabado tão cedo:
“é que estava goteirando na escola,
papai”. Ao ver a mãe dela saindo de casa para uma festa, Clara assim a
definiu: “mamãe é empiriquitosa”.
Em termos de questionamento, impagável foi o dia em
que minha filha resolveu questionar o próprio Papai Noel. É que ela tinha
enviado uma carta para ele pedindo uma bicicleta. Papai Noel, do alto de suas
atribulações, se confundiu. Ao invés de trazer uma bicicleta, o bom velhinho
trouxe uma boneca. Clara, escreveu mais uma carta reclamando, dizendo que: “Papai
Noel, eu pedi uma bicicleta, mas você trouxe uma boneca”. Mais um pouco e ela denunciava Papai Noel ao
PROCON.
Certa vez, Clara perguntou a mãe dela o que é ser
gay. Minha esposa disse, para simplificar, que gay é um homem que gosta de
outro homem. Minha filha disse, concluindo: “Então
papai é gay, porque ele gosta de meu irmão e ele é homem”.
Outro dia a mãe de Clara disse que iria sair para
trabalhar e que só voltaria à noite. Clara até não reclamou, mas saiu-se com a
seguinte pérola: “Mamãe eu queria que
você fosse idosa para não precisar trabalhar e ganhar dinheiro sem sair de
casa”.
Assim como os candidatos, Clara gosta de dar
respostas malucas para perguntas que ela não sabe a resposta. Um dia lhe
perguntei se ela sabia por que só estava aparecendo metade da lua e ela disse
que tinha sido um cachorro que tinha comido a outra metade.
Clara não gosta de política, muito menos de
políticos, mas sabe interpretar interesses que não ficam claros. Um dia ela me
perguntou se eu ia para o aniversário da amiguinha dela. Eu disse que não, mas
que queria que ela trouxesse muitos doces para mim. Clara foi direta na
interpretação dela: “papai, você quer
comer os doces do aniversário de minha amiga, mas não quer ir para a festa”.
Bem vinda ao mundo real, minha filha, os adultos são assim mesmo.
Minha filha não é versada só em política. Ela
entende de filosofia também. Alguns dias depois que a bisavó dela faleceu ela
racionalizou a morte da seguinte maneira: “o
ruim de morrer é que agente não pode ficar mais vivo”. Eu sou suspeitíssimo
para falar. Mas, convenhamos, essa é a melhor definição que se tem para a
morte. Minha filha definiu em um minuto o que a humanidade tenta fazer a pelo
menos 15 séculos.
Um dia, querendo acabar com uma discussão de
adultos insanos, minha filha disse que “quanto
mais o pinto pia, mais a pia pinga”. Simples assim. Ainda bem que minha
filha não gosta de política. Se ela gostasse, imaginem o moído que ia ser.