A notícia saiu na Folha de São
Paulo de 03 de agosto passado. Num primeiro momento eu não quis acreditar.
Pois, afinal de contas, não somos lá muito sérios quando o assunto é a política
institucional. A manchete dizia que “Estudante
tenta refundar a Arena, partido da ditadura”. Eu deveria não ter levado a
sério. Deveria mesmo ter passado rapidamente para a próxima matéria. Mas, fazer
o quê, a curiosidade falou bem mais alto.
Cibele Bumbel
Baginski é estudante do curso de direito na cidade gaúcha de Caxias do Sul. Ela
é jovem, tem apenas 22 anos de idade, é fã de "heavy metal" e de
cultura gótica, seja lá o que for isso. Cibele está liderando um movimento,
pela internet, como é típico dessa geração, para refundar a Aliança Renovadora
Nacional, a velha e conservador ARENA - o partido que dava sustentação ao
regime ditatorial militar fundado em 1964.
Cibele parece ser
simpática ao movimento pela criação da República dos Pampas Gaúchos que quer
separar a região sul do resto do Brasil. Ela disse que existe um tipo de
eleitor no Brasil que é "conservador e nacionalista". Ao que tudo
indica ela pensa em liderar este tipo de eleitor.
Cibele disse que não se identifica com nenhum partido. Mesmo assim, ela já foi
filiada ao “Democratas”. Nada mais coerente, pois políticos que foram ou são do
DEM estiveram na ARENA. A exemplo de Marco Maciel, Jorge Bornhausen, José
Agripino Maia, etc.
Apenas para que se saiba. A ARENA
foi fundada em abril de 1966, pelo Ato Institucional nº 02, que extinguiu os
partidos da época e instituiu o Bipartidarismo. Junto com a ARENA veio o
Movimento Democrático Nacional – MDB, que anos depois tornou-se o atual PMDB.
A função da ARENA era dar sustentação aos
governos militares no Congresso Nacional e nas Assembleias Legislativas
estaduais. Na época, se dizia que a ARENA era o partido do “sim, senhor”,
enquanto que o MDB era o partido do “sim”. Foi da ARENA que surgiu, no final da
ditadura militar, o PDS que serviu de base para o PFL e que, finalmente, se
transformou em DEM. Assim, não é exagero dizer que a ARENA ainda vive nas
entranhas do DEM.
Talvez, nem fosse preciso Cibele Baginski criar (ou
recriar) a ARENA. Bastaria realizar uma campanha nacional para trazer para o
DEM mais filiados e militantes que fossem, claro, conservadores e
nacionalistas.
Cibele diz ter apoios em 12 estados da
federação. Neste momento, ela se articula para, através das redes sociais da
internet, coletar as centenas de milhares de assinaturas necessárias para
refundar a ARENA. No Facebook, a ideia de refundar a ARENA já conta com mais de
400 apoiadores. Cibele disse que tem uma lista com o nome de 70 pessoas que
querem aparecer como fundadores da nova (ou velha, não sei) ARENA.
A reportagem da Folha de São
Paulo perguntou a Cibele sobre o envolvimento da antiga (ou nova, não sei)
ARENA em crimes políticos contra opositores do regime militar. Ela não respondeu, e disse que houve, no
regime militar, "coisas boas". Disse, também, que “partido faz
política, elege representantes, e que o que esses representantes fizeram é
outra coisa”.
Não, não é outra coisa, cara
Cibele. Os arenistas defendiam os interesses do ditador de plantão. Não era
incomum um deputado, da ARENA, ir à tribuna da Câmara Federal para negar que
opositores do regime estivessem sendo torturados e aniquilados pelo país afora.
Cibele oferece uma resposta
genérica para não ter que explorar a parte espinhosa da pergunta. Não faz
sentido fundar (ou refundar) um partido que serviu a uma ditadura militarizada.
Eu não sei se vivemos numa democracia, mas com certeza não vivemos mais num
Estado ditatorial.
Faz sentido recriar um partido
para agradar a uma pequena fatia do eleitorado? Temos, no Brasil, 52 partidos
legalmente constituídos. Deve haver um que agrade ao perfil conservador e
nacionalista da jovem roqueira gótica Cibele.
Talvez Cibele Baginski não saiba qual era o papel da ARENA durante os
piores momentos da repressão política. Talvez, ela nem seja consciente do que
representa hoje ter sido membro da ARENA. Ser da ARENA significava estar ao
lado do governo militar que torturava e matava aqueles que faziam oposição ao
regime. Significava (ainda significa) ser contra todo e qualquer tipo de
mudança.
Mas, Cibele não parece ser
alienada, pelo contrário é muito bem articulada e sabe expressar bem suas opiniões.
Ela parece ter bem claro o que pretende. Ou seja, ela quer fundar um partido de
extrema-direita, antidemocrático, para, a partir dele, influir no cenário
político nacional.