segunda-feira, 30 de junho de 2014

MAS, AFINAL, QUEM É O INIMIGO?


Nos tempos da Guerra Fria, quando vivíamos sob o tacão de uma ditadura, imperavam a Doutrina e a Lei de Segurança Nacional. Na época, o mundo era dividido em dois grandes blocos – o capitalista, do lado ocidental, e o comunista, do lado oriental. A Doutrina de Segurança Nacional foi elaborada nos EUA, no final da década de 40 do século XX. O presidente Harry Truman defendia que o chamado “mundo livre” necessitava de mecanismos que pudessem conter o avanço comunista pelas Américas. No Brasil, o Gal. Golbery do Couto e Silva elaborou, após o golpe de 64, a tese de que havia um inimigo interno, agindo sob influências externas, que deveria ser combatido. Para ele, focos de perturbação social deveriam ser militarmente atingidos.

Recentemente, quando da aprovação da Lei Geral da Copa, pelo Congresso Nacional, o Ministério da Defesa regulamentou como as Forças Armadas devem agir caso sejam convocadas, pela presidência da República, para atuar em distúrbios sociais e políticos. Causou estranheza que o Ministério tenha incluído, no rol das chamadas “forças oponentes”, movimentos e organizações político-sociais. O estranhamento cresce quando se vê o que e quem compõem essa lista de oponentes do Estado brasileiro. A lista é composta por organizações criminosas, traficantes de drogas, contrabandistas de armas e grupos armados. O PCC, organização criminosa que atua fora e dentro de presídios de São Paulo, encabeça a lista dos oponentes do regime em que vivemos.

O que se sabe é que a nomenclatura “forças oponentes” foi criada para que se pudesse enquadrar manifestantes políticos que vão, ou iam, as ruas protestar contra, por exemplo, a realização da Copa da FIFA e os transportes públicos. A questão, aqui, é porque um instrumento coercitivo, nitidamente inspirado na Doutrina de Segurança Nacional dos tempos da ditadura militar, enquadra num mesmo patamar o traficante de drogas e o manifestante político? Vivemos em uma democracia, frágil, mas uma democracia, que continua a se utilizar dos mecanismos de controle social e político, tão bem explorados nos tempos do regime ditatorial que prendia, torturava e assassinava seus opositores. A questão é: por quê?

Foi a partir da MINUSTAH, a Missão das Nações Unidas para a estabilização do Haiti, que o Ministério da Defesa regulou o uso das Forças Armadas nas chamadas Operações de Garantia da Lei e da Ordem, ou GLO. A GLO começou a ser posta em prática a partir de 2010 com as ações de pacificação do Complexo do Alemão, no Rio de Janeiro. Na Copa das Confederações ela foi praticada, pois entre junho e julho de 2013 vivíamos o auge das manifestações políticas. A ideia de aplicar a GLO no combate as “forças oponentes” não é, como já vimos, uma novidade. Partindo de premissas existentes há tanto tempo se aplica um método de combate renovado na prática, mas que se mantém fiel ao seu antigo modelo.

 
O plano de Garantia da Lei e da Ordem foi revisto para prever manifestações e conturbações politico, sociais e criminosas na Copa do Mundo. Apesar de que, não foi necessário, pois todo mundo quer assistir a Copa, inclusive a marginalidade organizada. A GLO prevê que militares federais atuem, como última alternativa, em caso de incapacidade das polícias, a pedido dos governadores e por ordem da presidência da República. E eles devem atuar limitados a um determinado local e com tempo definido. Nas operações, unidades das polícias do Exército, da Marinha e da Aeronáutica, além dos fuzileiros navais, devem agir usando armas não letais. A título de comparação, nos Jogos Olímpicos de Londres, em 2012, houve o aquartelamento de tropas.

A ideia era que as tropas fossem utilizadas em caso de ataques terroristas que pusessem em risco a vida de atletas e chefes de Estado. O governo inglês nunca cogitou a possibilidade de colocar tropas federais para combater manifestações de ordem política. No Brasil, o governo coloca problemas sociais, políticos e criminais na vala comum da segurança pública e, ainda aplica sobre ela, a metodologia da Doutrina de Segurança Nacional se baseando no plano de Garantia da Lei e da Ordem. O professor Expedito Bastos, pesquisador de assuntos militares da Universidade Federal de Juiz de Fora, disse que a GLO é tão somente um material padrão do Ministério da Defesa para normatizar a utilização das Forças Armadas em operações.

O professor Bastos confirma que a Garantia da Lei e da Ordem é fruto das experiências no Haiti. Ele diz que não vê nada de excepcional na GLO e que o papel constitucional das Forças Armadas está respaldado na resolução do Ministério da Defesa. Mas, o diretor executivo da Anistia Internacional no Brasil, Átila Roque, discorda e afirma que o texto é "vago, arbitrário e potencialmente danoso à democracia". Atila lembra o perigo de se criminalizar questões políticas e sociais. O fato é que não importa o que esteja acontecendo nas ruas, o método para conter os conflitos será sempre o mesmo. Podem ser estudantes fazendo manifestações, com quebra-quebra, pode ser o PCC atacando a polícia, a GLO será usada da mesma forma. A questão não é se devemos ou não combater este ou aquele problema. A questão é como vamos fazê-lo. O fato, é que o Estado brasileiro não conseguiu, ainda hoje, definir quem são seus reais inimigos. Daí se aplica a GLO seja no estudante seja no traficante.

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sexta-feira, 27 de junho de 2014

MAS, AFINAL, ONDE ESTÁ FULECO?


Os deuses do futebol nos agraciaram com o que já está sendo considerada uma das melhores Copas do Mundo desde a primeira em 1930. É que eles estam nos recompensando por tudo que tivemos que aturar para termos essa Copa no Brasil. Eu falo das maravilhosas partidas que já tivemos. Jogos como aquele entre Uruguai e Itália, para ver quem iria para as 8ª de final, ou a carnificina que a Holanda aplicou sobre a Espanha, nos enchem de esperança de que há, sim, salvação para o futebol. Eu sei que não temos que nos conformar, mas tem valido a pena deixar os problemas fora das arenas e aproveitar um espetáculo que só mesmo o futebol é capaz de proporcionar. Claro, a mim não cabe discutir o jogo em si.

Mas, devo analisar o que está no entorno da Copa. Tenho visto muitas coisas interessantes, sejam boas, sejam ruins. Os acontecimentos da abertura da Copa, com os xingamentos a presidente Dilma, ainda devem ser melhor analisados. O comportamento das torcidas é algo que devemos atentar. Mas, chama à atenção as ausências ilustres. Em todas as outras copas do mundo, se viam pessoas famosas, do esporte, da música, da política, espalhadas pelos estádios prestigiando os jogos. Quem não lembra de Mick Jagger, vocalista dos Rolling Stones, assistindo aos jogos das copas da Alemanha e da África? Na Copa passada, o presidente da FIFA, Joseph Blatter, assistiu a quase todos os jogos sempre em locais de fácil exposição.

Nelson Mandela, mesmo debilitado, foi assistir alguns poucos jogos. Mas, aqui no Brasil as autoridades e os dirigentes do futebol sumiram da Copa. Pior, até a mascote FULECO não é vista pelas arenas. O que será que está acontecendo? Na África, Blatter fazia questão de aparecer nos telões. Aqui, no Brasil, se esconde deliberadamente. Até agora, ele só assistiu a dois jogos: o primeiro, entre Brasil e Croácias, quando foi sonoramente vaiado, e depois ele foi a Brasília ver Suíça e Equador. Porque Blatter não vai aos jogos? Elementar, ele não quer mais ser vaiado e muito menos ser mandado tomar providencias, naquele distante lugar, tal qual fez aquela gente estulta e grosseira com a Presidente Dilma.

A impressão que tenho é que os brasileiros resolveram punir os políticos e os diretores da FIFA com uma espécie de proibição. É como se os eleitores estivessem dizendo: “depois de tudo que vocês aprontaram, não são merecedores de assistirem aos jogos”. As manifestações, a violência, a desorganização e nossa horrorosa mania de vaiar quem quer que seja, afugentaram as autoridades internacionais. Niclas Ericson, diretor de TV da FIFA, relatou o receio de mostrar imagens desagradáveis para o mundo todo. Na copa de 2010, a mascote Zakumi estava presente em tudo. A cada nova cerimonia, que abria os jogos, lá estava Zakumi. A mascote acompanhava os jogadores, de todas as nações, até o centro do gramado e de lá só sai para que o jogo pudesse iniciar.


No Brasil, ao contrário, mal se vê FULECO. É bem verdade, que os brasileiros não se encantaram muito pela mascote. Também, com esse nome, não dava mesmo para criar alguma empatia. Mas, existe uma explicação para o sumiço do FULECO. Délia Fisher, chefe de imprensa da FIFA, disse que FULECO está, sim, nas arenas e que ele sempre aparece antes dos jogadores entrarem em campo para a fase de aquecimento. Mas, ela frisou que é preciso estar bem atento a TV para que se possa vê-lo. Eu fico a me perguntar se com 34 câmeras espalhadas, em cada um das 12 arenas, seria mesmo preciso ficar atento. Além do mais, a mascote FULECO não é tão discreta assim que possa passar despercebida. De fato, a questão é comercial.

Em 2012, o tatu-bola foi anunciado, por Jérôme Valcke, para ser bem mais do que a mascote da Copa. A ideia era que ele fosse um legado, um símbolo, da luta pela preservação de uma das espécies, de nossa fauna, ameaçadas de extinção. Valcke anunciou que a FIFA destinaria recursos para financiar projetos voltados para a preservação da natureza. O discurso era politica e ecologicamente acima de qualquer suspeita, mas na prática ele era tão vazio quanto às promessas dos tais legados sociais. Poucos dias antes da Copa começar, se soube que a FIFA não destinou um centavo sequer para preservar um tatu-bola que fosse. Foi por isso que FULECO sumiu das arenas. Por questões contratuais, a FIFA teria que pagar para usar um símbolo nosso.

Havia sido acordado que a ONG Caatinga, que propôs o tatu-bola como mascote, teria seus projetos preservacionistas financiados pela FIFA. De última hora, a FIFA tentou um acordo, ou melhor, tentou dar um “cala-boca” na ONG e no governo brasileiro. Segundo Rodrigo Castro, da ONG Caatinga, a FIFA fez uma proposta indecorosa. A entidade, que lucrou US$ 2,4 bilhões nesses 4 anos de preparação da Copa, ofereceu R$ 300 mil que seriam pagos em 10 anos. Foi por isso que FULECO sumiu. Assim é a Copa da FIFA. Nos campos, temos um desfile de emoções. Fora deles, não temos legados dos quais possamos nos orgulhar. Nem a mascote, que poderíamos guardar de lembrança, quer aparecer. Sem FULECO, sem legados, teremos mesmo que nos contentar com um bom futebol. É só o que nos cabe nessa história toda.
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quinta-feira, 26 de junho de 2014

SOBRE ALIANÇAS E TRAIÇÕES.


Em um episódio de “A vida como ela é”, o escritor Nelson Rodrigues afirmou que “só o verdadeiro inimigo nunca trai”. Já o filósofo italiano Nicolau Maquiavel aconselhava que, na política, deve se cuidar do aliado tanto quanto se cuida do adversário. Hoje, a política paraibana gira em torno de alianças, traições e relações entre aliados e adversários. Aliás, a evolução dos fatos nos mostra que a diferença entre ser partidário e ser rival é a mesma que existe entre o encarnado e o vermelho, i.e., nenhuma. Acompanhando os fatos eu diria que é melhor ter um ou dois adversário na mão do que vários aliados voando. Na pequena e heroica Paraíba, o aliado de hoje poderá, deverá, ser o adversário de amanhã, sendo a recíproca absolutamente verdadeira.

Contando com hoje, 26 de junho, e com boa parte do próximo dia 30, ficam faltando cerca de 110 horas para que atores e partidos políticos definam suas coligações, visando às eleições majoritárias e proporcionais de outubro. Até o próximo dia 30, todo minuto será útil. PSB, PSDB e PMDB, os três grandes partidos envolvidos no processo, ainda não definiram claramente seus candidatos a governador, vice-governador, senador, além dos deputados estaduais e federais. Vamos por partes. Primeiros às raras certezas. Ricardo Coutinho e Cássio Cunha Lima são candidatos ao governo do Estado, mesmo que tenhamos que considerar se o senador Cássio é ou não elegível. Mas, deixemos essa questão um pouco mais para adiante.

Os partidos ainda dispõem, como se estivessem em um leilão, de vagas para as eleições majoritárias e proporcionais. A questão é quem vai dar o maior lance. Aliás, as vagas para deputado federal devem servir de prêmio de consolação para muitos. Vejam o caso do vice-governador Rômulo Gouveia que muito lutou para ser candidato ao senado, mas que deve terminar desistindo para que o PSB, de Ricardo Coutinho, possa ampliar seu arco de alianças com outros partidos. Rômulo sairá desgastado desse processo, pois deixou o grupo liderado por Cássio, ao qual sempre pertenceu, e hoje já é tratado como traidor. Rômulo ficou do lado de Ricardo, após o fim da aliança entre PSDB e PSB, e esperava reciprocidade.

Ele queria que Ricardo agisse como aliado, mas neste caso, como em tantos outros, o governado mais parece um adversário. Para aumentar as dimensões de seu palanque, tem tratado aliados como adversários e rivais como se fossem velhos amigos. Aliás, não só ele. Na Paraíba, os políticos podem vir a ser amáveis aliados ou fervorosos adversários dependendo do que se ofereça, que o digam Wilson Santiago, José Maranhão, Aguinaldo Ribeiro, Wellington Roberto, Leonardo Gadelha, etc, etc, etc. O fato é que o PSB precisou dispor as vagas para senador e vice-governador para atrair o PMDB. Rômulo, então, sobrou na curva. Deverá ter que se contentar com uma postulação à Câmara Federal ou, pior, refazer o caminho de volta ao grupo cassista.

No PSDB não é diferente. Cícero Lucena viu seu partido se despir da fantasia de aliado. Para atrair um partido de peso, como PTB, PSC, PP ou mesmo PMDB, Cássio e seu grupo passaram a tratar Cícero como adversário.  Aliás, Cícero foi o primeiro a sobrar na curva. Se ele conseguir se candidatar a deputado federal deve se dar por bastante satisfeito. O mais interessante desse processo é mesmo o papel do PMDB e de seu, ainda, pré-candidato a governador Veneziano Vital. Todos os movimentos políticos do momento passam pela mãe de todas as decisões que é se o PMDB terá ou não candidatura própria ao governo do Estado. PSB e PSDB trabalham incansavelmente para atrair o PMDB para suas composições.


 Ao PMDB tem se oferecido de tudo. Tanto Ricardo como Cássio aceitam que o PMDB indique nomes para o senado e/ou para vice-governadoria. Aqui não importa apenas ter o PMDB, trata-se de impedir que o PMDB vá para o lado do real adversário. Neste caso alguém está blefando, pois lideranças do PSDB e do PSB apontam para a possibilidade de composição com o PMDB. Sempre lembrando que quem se aliar ao PMDB leva o PT. É uma promoção: pague por um e leve dois.  Mas, para que isso tudo aconteça é preciso combinar com os russos que neste momento atendem pelo nome de família Vital do Rêgo. A batalha neste momento é fazer Veneziano desistir de sua postulação ao governo.

A pré-candidatura de Veneziano sofre ataques especulativos de todos os lados, inclusive de setores do próprio PMDB. Neste sentido, o PT tem feito esforços sobre humanos, pois quer continuar junto com o PMDB, mas sem a candidatura de Veneziano. Neste jogo interessa ver como os atores políticos estam dispostos a tudo, tudo mesmo, para viabilizarem a melhor composição possível. Neste jogo unir ou afastar, aliar ou trair, são as faces de uma mesma moeda. A ética a ser seguida é a da traição e/ou da união sem que existam claras definições dos significados desses conceitos. Os políticos paraibanos fizeram uma mudança no dicionário e tratam união e traição como se fossem sinônimos. Aqui, ter um aliado significa quase nada até que se bata o martelo no final do dia 30 de junho.

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quarta-feira, 25 de junho de 2014

QUANDO MAIS É MENOS.

No final de maio, atores e partidos políticos tiveram um susto daqueles. É que uma decisão do TSE havia redefinido a distribuição do número de deputados federais e estaduais. Num período eleitoral, uma decisão dessas poderia mudar muita coisa. A resolução do TSE confirmava a Resolução 23.389/2013 que redefiniu a distribuição do número de deputados federais por Estado. Como consequência direta a composição das Assembléias Legislativas também mudaria em 13 dos 27 estados brasileiros. Na verdade, o TSE estava tão somente tornando sem efeito o Decreto Legislativo nº 424/2013, aprovado pelo Congresso Nacional. O que os ministros do TSE queriam era, tão somente, por fim às eternas tentativas de se redefinir bancadas.

Essa decisão faria com que Alagoas, Espírito Santo, Paraná, Pernambuco, Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul perdessem uma vaga na Câmara dos Deputados a partir das eleições de outubro. A Paraíba e o Piauí perderiam, cada um, dois parlamentares. O problema, que assustou atores e partidos políticos, é que a redefinição das bancadas alteraria a correlação de forças políticas nos Estados. A diminuição de vagas no parlamento tornaria o jogo político eleitoral mais concorrido ainda. Como não poderia deixar de ser, os insatisfeitos recorreram da decisão no STF. Numa rara demonstração de união, políticos de vários partidos reuniram forças e foram ao STF. A ideia era deixar tudo como estava. É que os políticos tem pavor de mudanças.

Indo ao STF, os políticos paraibanos evitariam acirramentos e lutas acima de suas forças. Ele não queria ter que lutar por quantidade ainda menor de vagas. O fato é que os políticos pouco se preocupam com a qualidade da representação. O caro ouvinte já deve saber que eu não trato dessa questão por estar preocupado com a quantidade de representantes que temos no parlamento. Ao contrário dos políticos, não acho que quanto mais deputados tivermos, melhor seremos representados. Se quantidade fosse a única garantia para uma boa representação, o Estado de São Paulo seria o mais bem representado com seus 70 deputados federais. Já estados como Acre, Amapá, Sergipe e Roraima seriam mal representados com seus 8 deputados.

Mas, o STF preferiu trilhar o caminho mais fácil. Ao invés de contribuir para que o debate se dê em torno da qualidade da representação, que estamos tão longe de ter, os ministros do STF se apegaram aos formalismos simplistas da lei.  A impressão que tenho é que o STF não quis entrar em mais uma peleja contra os atores e partidos políticos mais tradicionais desse país. O fato é que a maioria dos Ministros do STF derrubou a decisão do TSE. Não deixa de ser interessante ver que as duas cortes discordaram. Uma delas, inclusive, tomou as dores do poder legislativo. É como se o STF e o TSE estivessem disputando para ver quem estabelece a melhor relação com o poder legislativo.


A decisão da Suprema Corte estabeleceu que tudo deve ficar como está. A solicitação da Assembleia Legislativa do Amazonas, para que se recalculasse o número de vagas que cada estado tem na Câmara dos Deputados, foi deixada de lado pelos formalismos da lei. A Ministra Rosa Weber, relatora da ação que reviu a decisão, baseou sua argumentação no fato de que o TSE teria invadido a competência legislativa do Congresso ao revisar a quantidade de representantes que cada Estado tem no parlamento. Interessa ver que os ministros do STF não gostaram de ver o TSE invadir a seara decisória do parlamento, mesmo que eles venham fazendo exatamente isso há tanto tempo. Ou não é isso que acontece quando o STF faz as reformas políticas que o legislativo tanto resiste em aprovar?

Os ministros Rosa Weber, Teori Zavascki, Luiz Fux, Marco Aurélio, Celso de Mello e Joaquim Barbosa concordaram que a legislação não delega poderes ao TSE para mudar o tamanho das bancadas. Já o ministro Gilmar Mendes, voto vencido nesta e em tantas outras votações, defendeu a resolução do TSE. Para ele, a corte eleitoral teria, sim, poderes para promover a atualização das cadeiras no parlamento, fundamentada na Constituição Federal. Apenas os ministros Luís Roberto Barroso e Dias Toffoli seguiram a tese do TSE, defendida por Gilmar Mendes. Porém, soa estranho que duas instâncias do judiciário não se entendam sobre uma mesma matéria.

Soa estranha a perspectiva do STF que insiste em nos surpreender. A mesma corte que mandou os mensaleiros para a cadeia é a que insiste em manter o tamanho das bancadas estaduais no Congresso Nacional. Ao desfazer a decisão do TSE, o STF está, na verdade, contribuindo para a manutenção de velhos privilégios e para que as mesmas estruturas de poder sigam se mantendo em suas ilhas de poder.  Se o STF tivesse mantido a redução das bancadas poderia ter dado uma valiosa contribuição para que se estabelecesse de fato o debate sobre a qualidade da representação em detrimento da quantidade de deputados. Mas, os ministros só parecem preocupados com suas próprias qualidades.

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terça-feira, 24 de junho de 2014

FIDELIX, O NANICO DO AEROTREM.


No Brasil, eleição majoritária que se prese tem que ter candidatos nanicos. Sem eles a eleição fica monótona. Quem não lembra do histriônico Enéas que em apenas 16 segundos dizia o que muitos não dizem em 10 minutos. Nas eleições presidenciais desse ano deveremos ter algo em torno de oito candidatos nanicos. Com essa COLUNA, inauguro uma série onde analisarei algumas dessas postulações considerando que o papel delas não é chegar ao 2º turno. Um dos nanicos é Levy Fidelix, do PRTB. Como a maioria dos nanicos, Fidelix só tem uma proposta. Seu mote é o "aerotrem", um veiculo de superfície que resolveria todos os problemas de mobilidade urbana do País.

Ter uma única proposta descompromete quem não pensa em vencer de muitas responsabilidades. Fidelix é um otimista. Esta será a 13ª vez que ele enfrentará as urnas. Em 2010 ele foi candidato a presidente e teve exatos 57.960 votos, ficando em 7º lugar. Fidelix parece gostar de ser nanico. Ele já foi candidato a todos os cargos que temos - de vereador a senador da República e de prefeito a presidente. Em todas as eleições majoritárias que disputou ele nunca teve mais do que 1% dos votos válidos. Levy Fidelix é adepto das teorias conspiratórias. Ele diz que seus fracos desempenhos se devem a um complô que faz com ele seja roubado nas urnas e nas pesquisas. Ele se vê perseguido pela imprensa e acha que muitos políticos se apropriam de suas ideias.

É por isso que ele personaliza suas propostas no “aerotrem”. Tendo uma única proposta, fica mais fácil de comprovar que ela é exclusiva de sua candidatura, mesmo que saibamos que a questão da mobilidade urbana será tema central nas eleições. Fidelix deve ser um dos poucos candidatos desta eleição com um perfil ideológico bem definido. Ele é um homem de direita. Inclusive, ele deve contar com o apoio do Partido Militar Brasileiro (PMB), que ainda não tem o registro junto ao TSE. Em entrevistas, ele tem dito que vai encampar bandeiras "da direita". Fidelix repete sempre que será, nas eleições, o verdadeiro e único candidato da direita. Uma de suas frases de efeito é: “Eu vou endireitar o Brasil e combater a presidente Dilma Rousseff".

Para que não restem dúvidas sobre seu posicionamento político-ideológico, Fidelix promete defender, no seu guia eleitoral, o movimento civil-militar de 1964, que instalou uma ditadura no Brasil por longos 21 anos. O candidato do PRTB nem acha que tivemos um golpe e uma ditadura. Para ele, o movimento de 1964 foi uma revolução e o período, dos governos militares, foi o melhor momento que tivemos em termos de desenvolvimento econômico. Se apresentar como o único candidato de e da direita, defendendo coisas como a “revolução de 1964” é, também, uma estratégia de campanha. Fidelix deve ter percebido o crescimento das ideias conservadoras em vários setores da sociedade.

Ele assistiu as manifestações, em março desse ano, a favor do golpe civil-militar e deve ter percebido que ali haveria um filão de votos a serem explorados. Ao dizer que vai endireitar o Brasil, Fidelix está falando para esse perfil do eleitorado brasileiro. Quando Fidelix diz que vai combater Dilma Rousseff está mirando aquela raivosa faixa do eleitorado de São Paulo que acha que xingar a presidente, num evento como a abertura da Copa da FIFA, é solução para alguma coisa. Mas, Fidelix e seu partido também têm aquele lado pragmático e fisiológico da política brasileira. Eles acham que o discurso conservador contribuirá para que elejam pelo menos dez deputados federais. Atualmente, o PRTB conta com apenas dois deputados.


 Fidelix diz que, com ao menos 10 deputados, será possível barganhar um ministério no próximo governo, seja qual for o presidente. Ele apenas não explica como fará para conduzir essa barganha caso Dilma Rousseff, que ele tanto combate, seja reeleita. Levy não foge a vala comum de afirmar que o principal problema na política é a corrupção dos grandes partidos. Inclusive, ele participou do movimento “cansei”, em julho de 2007, que a classe média alta de São Paulo (a mesma que xingou a presidente Dilma) organizou contra a corrupção. Fidelix já se cansou da corrupção, mas não vê problema alguma que corruptos contumazes pertençam ao seu partido. Fichas-sujas de grande porte como o ex-senador Luiz Estêvão e o ex-governador do Distrito Federal Joaquim Roriz são filiados ao PRTB.

Fidelix tem muito amor próprio. Como Pelé, ele se refere a si mesmo como se fosse alguém superior. Ele diz coisas como: “O anel viário em São Paulo foi ideia do Levy Fidelix em 1994” ou “O Levy Fidelix é quem mais contribui com ideias para este país”. Uma expressão que revela a megalomania de Fidelix é: “Marco Polo não inventou a pólvora, ele a trouxe da China para o mundo ocidental. Eu não inventei o aerotrem, eu apenas trouxe a ideia do exterior para o Brasil”. Fidelix se diz afinado as ideias de centro-direita, inclusive ele acredita bastante no lema ordem e progresso. Assim, caro ouvinte, se prepare, pois se ele for eleito presidente da República, em outubro, teremos uma nova proclamação da República.
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segunda-feira, 23 de junho de 2014

OU NORDESTINO, MAS NÃO SSOU ENGRAÇADO!


Um evento como a Copa do Mundo serve para muitas coisas boas e outras tantas ruins. As situações de extrema dificuldade, ocorridas numa disputa onde o jogador tem que provar que é bom em apenas um jogo, revelam o caráter das pessoas. Vejam o caso do atacante da seleção de Portugal, Christiano Ronaldo, que retirou do seu braço a faixa de capitão de seu time, depois que a seleção alemã fez o terceiro gol naquela fenomenal goleada aplicada em nossos patrícios europeus. Era como se Christiano Ronaldo estivesse dizendo: “eu não tenho nada haver com isso, não sou responsável por isso”. O que se espera do capitão, de um time de futebol, é que ele lidere seu time nas vitórias e, principalmente, nas adversidades.

Na linguagem da “boleirada”, i.e., dos jogadores de futebol, o CR7, literalmente, pipocou. Já Iker Casillas, goleiro da seleção espanhola, mostrou todo seu caráter quando assumiu responsabilidades diante do naufrágio precoce do seu time na Copa do Mundo. Mas, em termos de caráter, altivez e dignidade quem deu uma demonstração impecável foi Givanildo Vieira de Souza. O caro ouvinte sabe quem é esse jogador? Ele é o Hulk, o camisa sete, atacante da seleção brasileira e do Zenit São Petersburgo. Como todos sabem, Hulk é paraibano, de Campina Grande. A história dele é como a de qualquer outro nordestino que precisa sair de casa, e de sua cidade, bem cedo em busca de melhores condições de vida para si mesmo e para sua família.

A primeira vez que ouvi falar em Hulk ele jogava no Vitória da Bahia. Com apenas 18 anos, foi para o Japão. Em 2008, se transferiu para o Porto de Portugal. Na temporada 2010-11 ele foi o artilheiro do Campeonato Português com 36 gols. Hulk é um dos “obreiros” do Felipão. Com funções específicas na seleção, ele não tem como aparecer mais e melhor. É que ninguém está autorizado a brilhar mais do que Neymar Jr. Aliás, este é um que ainda precisa demonstrar seu caráter fora de campo. No domingo, 15/06, a Seleção Brasileira se preparava para viajar do Rio de Janeiro até Fortaleza onde jogaria com o México na terça-feira. Hulk foi escalado para a entrevista coletiva. É que ele havia abandonado o treino por sentir dores.

Hulk foi para a entrevista visivelmente preocupado, pois ainda não sabia a extensão dos danos que terminaram por tirá-lo do 2º jogo. Aliás, a comissão técnica bem que poderia ter poupado o jogador de enfrentar uma coletiva numa situação daquelas. Tudo poderia ser resolvido com um comunicado oficial do médico da seleção. Mas, é que existe o tal protocolo FIFA que toda a humanidade parece ser obrigada a seguir. Na entrevista, foi aquele bombardeio de perguntas sobre as condições físicas de Hulk. Ele ia administrando a situação, dando respostas óbvias para perguntas irritantemente redundantes que só pessoas, que nada sabem de futebol, insistem em fazer sobre futebol. Eis, então, que um jornalista que quis ser diferente. Foi o primeiro erro dele.

O jornalista, que não foi identificado, perguntou a Hulk: “Qual é o diferencial do povo nordestino? Porque ele é tido como engraçado, principalmente o cearense?”. Antes mesmo que Hulk pudesse responder, o jornalista emendou o preconceito explícito. Disse ele: “Eu pergunto por que é que o povo nordestino é tão diferente, por que é tão engraçado? É o sotaque que faz ele ser engraçado para o resto do país?”. Eu estava assistindo a entrevista ao vivo e, confesso, fiquei furioso com a pergunta cretina. Mas, Hulk foi de uma elegância a toda prova. Ele ficou visivelmente irritado, mas soube se comportar. Fosse um Romário, um Rivaldo, ou mesmo o próprio Felipão, teria saído no braço com o estulto jornalista que pensa que nosso sotaque é uma piada.


Eu tinha uma discreta admiração por Hulk, mais pela personalidade que ele apresenta em campo, do que propriamente pelo futebol dele na seleção. Mas, com a resposta que ele deu ao tal jornalista, eu passei a admirá-lo bem mais. Ao contrário do CR7, Hulk não tirou a faixa do braço. Ele foi direto ao ponto e disse: “Eu não levo por esse lado. Até porque nós não fazemos graça pra ninguém. O povo nordestino é diferente porque a Seleção não joga sempre lá”. Eu vibrei com a resposta. Parecia que ele estava fazendo um gol. Na verdade, ele fez, sim, um gol de placa, pois além de todos os preconceitos que sofremos ainda temos que lidar com essa mania imbecil de nos tratarem como os bobos da corte da nação brasileira.

Sabem por que o jornalista quis saber por que somos engraçados, principalmente os cearenses? Primeiro, porque ele deve desconhecer que Chico Anysio era cearense e que criou este filão do humorismo seguido por muita gente. O jornalista acha nosso sotaque engraçado por puro bairrismo. Ele usou o sotaque, mas poderia ter colocado qualquer outra coisa.  O que importava era atirar mais uma vez o preconceito que, infelizmente, muitos nordestinos contribuem para que permaneça. Ajudaria bastante se nordestinos famosos não aceitassem o papel de bobos da corte nos programas de televisão, por exemplo. Seria muito bom que reafirmássemos que não fazemos graça, que não somos palhaços, para quem quer que seja. Eu estou até pensando em fazer uma camisa com os seguintes dizeres: “SOU NORDESTINO, MAS NÃO SOU ENGRAÇADO”.
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sexta-feira, 20 de junho de 2014

MAS, AFINAL, CHICO É CHICO.



Ontem, 19 de junho, aquele que foi considerado, por Millôr Fernandes, a única unanimidade nacional completou 70 anos de vida e 50 anos de carreira artística.  Chico Buarque chega aos 70 anos tão lúcido, produtivo e criativo como a 30 ou 40 anos atrás. Eu até discordo de Millôr Fernandes. Chico Buarque não é uma unanimidade nacional, até porque, como diria Nelson Rodrigues, toda unanimidade é burra. Chico é um clássico da musica, da literatura, da política e, porque não, do futebol. O caro ouvinte sabe o que é um clássico? O clássico é o que consegue ser atemporal, sem ser anacrônico, que agrada gerações sem precisar mudar sua essência. Um clássico consegue pairar acima das opiniões. Enfim, clássico é algo que fica.

Clássico é aquilo que reencontramos depois de muito tempo para rever, reinterpretar e redimensionar para o momento em que vivemos. O clássico cabe em muitos presentes e não só naquele em que foi feito. Eu tenho muitos clássicos, e um deles é Chico Buarque. Talvez por medo de vulgarizar ou por algum tipo de elitismo intelectual que, confesso, termino tendo, eu não escuto com frequência as músicas de Chico Buarque. Já algum tempo, tenho lido muito as obras de Chico e tenho lido muito sobre ele. Uma das melhores formas de revisitar esse clássico da música e da literatura brasileira é através da série de DVD´s que, de forma um tanto quanto pretensiosa, quer contar vários aspectos da vida e da carreira de Chico Buarque.

Cada DVD aborda Chico Buarque e um tema. Então temos, “Chico e o samba”; “Chico e a política”; “Chico e as mulheres”; “Chico e o futebol”; “Chico e o teatro”; “Chico e Tom Jobim” e por aí vai. Aliás, foi Tom Jobim que disse que Chico é o sucessor de Noel Rosa. E eu diria mais: além de sucessor, ele é o continuador de tudo aquilo que Noel não pode fazer por ter morrido tão jovem. Chico reencarna e representa Pixinguinha, Lupicínio Rodrigues, Nelson Cavaquinho, Cartola, Ari Barroso, Dorival Caymmi, etc, etc, etc. Chico Buarque foi formado na tradição do virtuosismo letrístico e musical. Foi Chico que sistematizou, ou adequou, a tradição do samba, de todos esses compositores, ao que se convencionou chamar de Música Popular Brasileira (MPB).


Chico foi fundamental para a MPB, pois soube recolher elementos no que de melhor tivemos na música, desde os chorões e Chiquinha Gonzaga, passando por Villa Lobos, até Vinícius de Morais e o próprio Tom Jobim. Chico soube converter isso tudo numa produção inovadora e absolutamente bem estruturada. Foi ele que inaugurou um novo tipo de arte musical, na década de 60, ancorado na estética bossa-novista que ainda está por ser definida. Chico se autodefine, num desses DVDs, como um letrista. E é isso mesmo! Chico é, por tudo que consegue representar e por ele mesmo, o maior letrista da MPB. Ele é um caçador de palavras, um arqueólogo dos grandes achados lingüísticos.

Ninguém como ele para, com as palavras certas, dizer as coisas certas. Na música “Tanta Amar”, Chico diz: “amo tanto e de tanto amar, acho que ela é bonita”. Ou seja, não importa o que seja a mulher, ele a ama e todas as questões se encerram ali. Em “O meu amor”, ele diz “desfruta do meu corpo, como se o meu corpo fosse a sua casa”. Vejam como se diz tudo sobre uma relação sexual com palavras tão simples. Isso é fácil? Claro que não. Por isso, que só mesmo um Chico Buarque para fazê-lo. Chico foge do óbvio e nos força a conhecer as coisas. Quem mais usaria gelosia ao invés do usual janela? Foi Chico que me ensinou a usar corretamente um dicionário ao dizer que se divertia em buscar sinônimos num dicionário chamado “Caldas Aulete”.

E pouco importa os que tentaram desqualificá-lo por sua acentuada e autoreconhecida desafinação. Mesmo sendo desafinado, Chico sabe como ninguém construir belas canções, onde letra e música se entrelaçam de um jeito que até parece ser fácil fazer. Hoje, relendo a obra de Chico, consigo entende mais e melhor sua importância política. Muito antes de a ecologia virar moda, nos discursos fáceis de uma intelectualidade politicamente correta, Chico já praticava o ativismo verde. O caro ouvinte pode, por exemplo, ouvir a música “Os homens vão chegar”, onde Chico diz aos passarinhos para tomarem cuidado com os desatinos do homem em relação à natureza. Em “Bye, Bye, Brasil” Chico denuncia a devastação da floresta amazônica.

Talvez, já se tenha dito tudo sobre Chico. Talvez eu esteja sendo redundante. O fato, é que escrevo para significar a importância de Chico Buarque e de sua obra para a cultura nacional. Já que tanto falamos de golpe e ditadura por que não ouvir músicas como “Vai Passar”, “Cálice” e “Roda Viva”. E que tal ouvir Chico falando dos sentimentos em “Olhos nos Olhos”, “Tanto Amar”, “Carolina”, “Trocando em Miúdos”? É por isso tudo que eu “prescrevo” o clássico Chico Buarque como um remédio para os nossos dias. Parodiando o próprio, eu indico: beba Chico, cheire Chico, fume Chico, use Chico, injete Chico na veia; não tem contra indicação. Pode se viciar nele, só vai fazer bem a você, caro ouvinte, como faz a mim a mais de 30 anos.

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quinta-feira, 19 de junho de 2014

AFINAL, QUEM É A NOIVA DESSA ELEIÇÃO?


O ex-prefeito de Campina Grande e pré-candidato ao governo do Estado pelo PMDB, Veneziano Vital, deu uma declaração no mínimo curiosa. Quando se esperava que ele falasse sobre sua postulação ao governo, veio uma fala sobre as eleições de 2016. Se referindo as próximas eleições municipais, Veneziano afirmou que: “terei um candidato a prefeito para ganhar em Campina Grande”. Depois, ele disse que: “vamos ganhar sem maiores esforços, pois o que existe é uma nova arrumação”.  Mas, que “nova arrumação” seria essa? Porque Veneziano já está falando em 2016? Ele não deveria estar focado nas eleições deste ano? Ou será que ele intuiu que sua postulação, ao governo, é inviável e, por isso mesmo, já estaria (re)planejando sua ação?

A resposta para essas questões é sim e não. Sim, Veneziano não está pensando exclusivamente nas eleições de agora. É que para os atores e partidos políticos eleição é um meio de vida, eles vivem em função disso. Eles tratam as eleições como tratamos os serviços domésticos. É aquela história de mal acabar o almoço e já estar pensando no jantar. Os políticos pensam as eleições em bloco, pois os acordos são feitos para contemplarem interesses presentes e futuros. É muito comum um partido aceitar um cargo menor, numa eleição, para poder ter um cargo maior em outra. É a história de dar dois pequenos passos atrás, num momento, para dar um grande passo depois, em outro momento.

Vejam a complexidade da escolha do candidato a vice na chapa de Ricardo Coutinho. É que se ele for reeleito terá que renunciar, em abril de 2018, se quiser se candidatar a outro cargo. O vice de hoje, poderá ser o governador de amanhã e disputar sua reeleição. O vice-governador Rômulo Gouveia pleiteia sua candidatura ao senado baseado no argumento de que já deu muitos pequenos passos para trás e que agora é a sua vez de dar aquele grande passo para frente. Dessa maneira, Veneziano parece estar costurando um grande acordo que envolve as eleições atuais e as eleições municipais de 2016. Talvez, ele tenha intuído que suas chances, nesta eleição, estão bem abaixo das expectativas geradas.

Dessa forma, se estaria fazendo um acordo em que Veneziano, e o PMDB, dariam seu apoio a uma das candidaturas ao governo (eu falo de Ricardo Coutinho ou Cássio Cunha Lima) e em troca receberiam total apoio em 2016 nas eleições municipais. Assim, Veneziano teria uma saída honrosa, para os dilemas de sua atual postulação, e ainda iria para as eleições de 2016 com chances acima de tudo e de todos. A “nova arrumação”, a que Veneziano se refere, deve ser a reorganização das forças políticas. O fato é que a prefeitura do segundo maior colégio eleitoral da Paraíba, Campina Grande, está sim disposta pelas mesas de negociação política. Campina poderia, por exemplo, servir como uma espécie de prêmio de consolação de luxo.


Não deixa de ser atrativo, para uma força política como o PMDB, a retirada estratégica de uma candidatura fadada ao fracasso, em troca da formação de uma vitaminada coligação visando a prefeitura da cidade que resolve os dilemas eleitorais da Paraíba. Mas, ao contrário de Veneziano, eu não tenho porque me preocupar, não agora, com as eleições de 2016. As variáveis eleitorais de agora já são complexas demais para o analista político. Convém, momentaneamente, separar os processos eleitorais. Por ora, o que mais chama atenção do analista é a aparente contradição de uma candidatura que, mesmo não reunindo capital eleitoral suficiente para ir ao 2º turno, exerce alto poder de atração sobre as postulações que estam nos dois primeiros lugares.

Faltam apenas 12 dias para que se encerre o prazo, que os partidos políticos tem, para definirem suas candidaturas majoritárias e proporcionais. Faltam menos de duas semanas para que saibamos como ficaram as composições eleitorais. Neste momento, a mãe de todas as decisões gira em torno do PMDB. Se Veneziano Vital for mesmo candidato, ao governo, a eleição vai inevitavelmente para o 2º turno. Lá, o cacife eleitoral do PMDB será tão alto que só se poderá cobri-lo nas eleições de 2016. Se, do contrário, o PMDB resolve compor já neste 1º turno o jogo vira totalmente. Se a tal “nova arrumação”, que Veneziano se referiu, for uma composição ou com o grupo de Ricardo Coutinho ou com o de Cássio Cunha Lima o caminho da disputa será refeito.

Hoje, a postulação de Veneziano é cobiçada tal qual a noiva virginal a espera do nobre varão que a levará ao altar. Ricardo e Cássio estam disputando o apoio do PMDB como dois gladiadores que sabem que a diferença entre ganhar ou perder é a própria vida. Hoje, Veneziano, e seu PMDB, exercem na política eleitoral paraibana o papel do pêndulo – para onde ele pender deve ir, também, a solução do dilema eleitoral 2014. Veneziano já conquistou significativa vitória ao conseguir se colocar neste patamar. Mas, nada é tão simples. Lidamos com variáveis e interesses difusos que podem impedir uma solução do tipo duas grandes candidaturas servindo de polo de atração para tantas outras. Pelo andar da carruagem, só teremos fortes emoções no distante 2º turno.
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quarta-feira, 18 de junho de 2014

AS COMADRES DA POLÍTICA.


Na maioria dos países da Europa, e nos EUA também, o ex-presidente é, assim como o presidente, uma instituição nacional. Nas democracias consolidadas, o ex-presidente se torna uma espécie de conselheiro das grandes questões nacionais e internacionais. Nos EUA, depois de cumprir aquele ciclo de dois mandatos, o presidente se retira do dia-a-dia da política. Em geral, um ex-presidente dos EUA cria uma fundação que, dentre outras coisas, tem a função de cuidar do seu legado político. O ex-presidente Bill Cliton se retirou da vida pública, quando encerrou seu segundo mandato, em janeiro de 2001. Com os atentados terroristas, de setembro de 2001, ele participou das mobilizações e das campanhas e depois voltou a cuidar de sua fundação.

Na França e na Alemanha um ex-presidente só opina sobre uma questão política se ela for realmente relevante. E tem mais, ele só opina se, e somente se, houver certa mobilização social para que ele emita um juízo, uma deliberação ou mesmo uma crença. Em alguns países, como o Chile, o ex-presidente tem o cargo de senador vitalício. Mas, isso não lhe dá o direito de atuar na seara política. É que como ele não é eleito, não pode dispor de uma cadeira no parlamento. Neste caso, o cargo é bem mais um ritual. Já no Brasil, o presidente só se torna ex-presidente depois que, literalmente, morre. Vejam o caso de José Sarney e Fernando Collor que atuam no Congresso Nacional há bastante tempo. Collor nem lembra que já sofreu um impeachment.

José Sarney vem sendo a eminência, nem um pouco parda, do governo federal desde que deixou a presidência em março de 1990. Sarney nunca deixou de ser o condestável, ou primeiro dignitário, dessa República pouco republicana em que vivemos. Para nós, uma vez presidente, sempre presidente. Costumamos aceitar de bom grado que o ex-presidente carregue pela vida afora o título honorífico de presidente. É como se os votos, que ele uma vez recebeu, valessem pela vida toda. Juscelino Kubitschek foi sempre chamado como tal. Os oradores que discursaram, a beira de seu caixão, o chamavam de presidente. Os ditadores que cassaram os direitos políticos, que prenderam e enviaram JK ao exílio nunca deixaram de trata-lo de presidente.

Conta-se que, ao renunciar à presidência da República, Jânio Quadros deixou Brasília e foi para São Paulo. Por via das dúvidas, levou consigo a faixa presidencial, i.e., ele renunciava ao ônus do cargo, mas não ao bônus do titulo. Inclusive, enquanto foi prefeito de São Paulo, na 2ª metade da década de 1980, Jânio Quadro pedia para ser tratado pelo cargo maior que ocupou. Era hilário ver o prefeito de São Paulo sendo chamado de presidente. Mas, em matéria de políticos, que carregam as pompas e circunstância da presidência, nada se compara a FHC e Luiz Inácio Lula da Silva. Não é de hoje que FHC e Lula brigam, como dois noveleiros, para ver quem foi o melhor presidente.

Vez por outra eles agem como se seus partidos não existissem ou como se o país fosse governado por uma junta de três presidentes. FHC e Lula se comportam como se ainda fossem presidentes, mesmo que sem as responsabilidades da presidente Dilma. No início da semana, eles mais pareciam duas comadres, que vez por outra brigam por não terem nada melhor para fazer. Tudo começou com um discurso de FHC na convenção nacional do PSDB, que oficializou a candidatura de Aécio Neves. FHC disse que os xingamentos à Dilma, na abertura da Copa, eram inaceitáveis e partiu para o ataque. Disse ele: "Não queremos mais corruptos, ladrões que ficam empulhando”. Ele ainda disse que Lula "usa palavras feias, o que não é educativo".

Lula acusou o golpe e devolveu na mesma moeda. Ele disse que: “Vi FHC falar, com a maior desfaçatez para que se acabe com a corrupção. Ele devia dizer quem estabeleceu a maior promiscuidade quando começou a comprar voto para a reeleição”. FHC devolveu: “eu não acusei ninguém quando falei em ver corruptos longe, não era preciso vestir a carapuça”. Lula rebateu que o PT é “atacado por ter governado melhor que a elite" e que FHC “não aprendeu a ter sentimentos na faculdade”. Lula chegou mesmo a dizer que a "perseguição ao PT é similar à que levou Getúlio Vargas ao suicídio”. E foi por aí. Os dois ex-presidentes ficaram matraqueando enquanto seus partidos se articulam para as eleições e a Copa do Mundo pega fogo.


Interessa ver que no PSDB e no PT existem os que dizem que FHC e Lula mais atrapalham do que ajudam quando resolvem defender seus candidatos e partidos. O problema é que eles se batem em torno de suas biografias e legados. O fato é que eles não se importam com a política que lhes rodeia. Lula atua o tempo todo para retornar ao governo com as eleições de 2018. FHC sabe que não tem mais essa oportunidade, mas não abre mão de ser, como Sarney, um condestável da República. FHC e Lula agem como se a faixa presidencial ainda lhes pertencesse. Para eles, o cargo, que um dia ocuparam, lhes foi dado pela providência divina até o fim dos dias. A ironia disso tudo é que quanto mais eles brigam, mais parecidos ficam.

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