Friedrich Nietzsche foi
um filósofo alemão que viveu na segunda metade do século XIX. Dentre outras
coisas, ele se dedicou a discutir sobre o que é a verdade. Foi assim que ele
pronunciou a famosa frase: “A verdadeira
questão é: quanta verdade consigo suportar?” Em sua obra “Sobre a verdade e
a mentira no sentido extra moral”, Nietzsche questionou: “mas, como ainda
continuamos a perseguir o que seja a verdade, se ela não seria apenas nossa
teimosia em sustentar conveniências pessoais ou coletivas?”. Nietzsche morreu sem
responder o que seria, então, a verdade. Se Nietzsche, que era Nietzsche, não
conseguiu encontrar uma resposta satisfatória para o que é verdade, o que dirá
nós, brasileiros, que mal conseguimos diferenciar verdades de mentiras.
Desde que a Comissão Nacional da Verdade foi instituída, em maio de
2012, que a pergunta que não quer calar é “o quanto de verdade estamos
dispostos a suportar?”. Dito de outra forma, o que faremos com nossas verdades?
Como lidaremos com as verdades que se tem descoberto através do trabalho da CNV
e das comissões estaduais? As verdades estam vindo à tona. A questão é: para
quê e para quem elas estam saindo dos arquivos e das memórias? Alguns meses
atrás, o tenente-coronel reformado Paulo Malhães, que foi agente do Centro de
Informações do Exército durante a ditadura militar, confessou ter torturado
presos políticos e ter participado de operações que faziam corpos sumirem.
Malhães tornou verdade o que tínhamos como suspeitas ou hipóteses.
Alguns dias depois de seu depoimento, Malhães foi assassinado. Membros da
Comissão Estadual da Verdade
carioca suspeitam que o que houve foi à famosa “queima de arquivo”. O fato é
que Malhães teve importante papel como agente da repressão politica durante a ditadura
militar. Malhães era detentor de muitas verdades, de informações e fatos que
ocorreram enquanto o governo militar se dedicava a reprimir seus inimigos. Eu
não sou adepto das teorias conspiratórias, mas também não acredito em
coincidências e em explicações baratas. Ao que tudo indica, Malhães foi queimado
por ter se tornado um arquivo que falava demais.
Parece crível que Malhães tenha sido silenciado a mando de quem não
suportava mais ver suas verdades vindo à tona. Pior, foi que seu
“silenciamento” serviu como uma espécie de recado para aqueles que ainda
pretendem contar suas verdades. Na segunda-feira, a CNV publicou o depoimento
do capitão reformado da Aeronáutica, Álvaro Moreira. Ele dá conta do corpo de
Stuart Edgar Angel, desaparecido em maio de 1971, e que era membro do MR-8, um
grupo guerrilheiro que lutava contra a ditadura. Segundo Moreira, o corpo de
Stuart Angel, que era filho da famosa estilista Zuzu Angel, também morta por
agentes da repressão, “foi enterrado na cabeceira da pista da Base Aérea de
Santa Cruz, na zona oeste do Rio de Janeiro”.
Moreira afirmou que ouviu do sargento José do Nascimento Cabral, já
morto, a forma como o corpo de Stuart Angel foi enterrado. Cabral era
controlador de voo, na Base Aérea de Santa Cruz, e estava de plantão na noite do
macabro enterro. Cabral relatou que recebeu um grupo de oficiais comandados
pelo brigadeiro José Paulo Burnier, também falecido, que lhe ordenou que a
pista fosse fechada para pousos e decolagens. Da torre, Cabral assistiu o
enterro do corpo de Stuart. A CNV quer investigar e não descarta fazer escavações
no local em busca dos restos mortais de Stuart. A jornalista Hildegard Angel,
irmã de Stuart, disse que "enfim tenho informações objetivas sobre o
paradeiro dos restos mortais do meu irmão".
Hildegard Angel disse ainda que “O que eu espero que eles (os
militares) revelem a verdade e deem paz as famílias". A jornalista serve
como porta voz das famílias que, passados cerca de 40 anos, ainda não puderam
ter acesso a suas verdades. Na verdade, elas não devem esperar confissões
oficiais de culpas. O que, de fato, elas esperam é que os corpos de seus
parentes sejam finalmente encontrados para que se possa, por exemplo, se ter
acesso a uma certidão de óbito. Enquanto as verdades lutam para vir à tona, o
MPF ofereceu denuncia contra cinco militares reformados do Exército pelo
homicídio e ocultação do cadáver do ex-deputado Rubens Paiva. O dado relevante
disso é que se está buscando fazer justiça.
Mas, importa vermos que o MPF não limita sua atuação por causa da
Lei da Anistia de 1979. Os procuradores afirmam que os crimes não prescreveram
e não podem ser incluídos na Lei da Anistia porque se deram em uma situação de
estado de exceção. Eles dizem que tínhamos uma situação de sistemático e generalizado
ataque contra a população civil por um sistema semiclandestino de repressão
política. O MPF afirma que os crimes podem ser tipificados como de lesa-pátria.
O fato é que as verdades vieram à tona, mesmo que muitos não as queiram ouvir
por não quererem que suas ilusões sejam destruídas, como diria Nietzsche. Já
temos muitas verdades expostas. A questão é: com quantas delas conseguiremos
conviver?
AQUI É O
POLITICANDO, COM GILBERGUES SANTOS, PARA A CAMPINA FM.
Nenhum comentário:
Postar um comentário