Um evento como a
Copa do Mundo serve para muitas coisas boas e outras tantas ruins. As situações
de extrema dificuldade, ocorridas numa disputa onde o jogador tem que provar
que é bom em apenas um jogo, revelam o caráter das pessoas. Vejam o caso do
atacante da seleção de Portugal, Christiano Ronaldo, que retirou do seu braço a
faixa de capitão de seu time, depois que a seleção alemã fez o terceiro gol
naquela fenomenal goleada aplicada em nossos patrícios europeus. Era como se
Christiano Ronaldo estivesse dizendo: “eu não tenho nada haver com isso, não
sou responsável por isso”. O que se espera do capitão, de um time de futebol, é
que ele lidere seu time nas vitórias e, principalmente, nas adversidades.
Na linguagem da “boleirada”, i.e., dos jogadores de futebol, o CR7,
literalmente, pipocou. Já Iker Casillas, goleiro da seleção espanhola, mostrou
todo seu caráter quando assumiu responsabilidades diante do naufrágio precoce
do seu time na Copa do Mundo. Mas, em termos de caráter, altivez e dignidade
quem deu uma demonstração impecável foi Givanildo Vieira de Souza. O caro
ouvinte sabe quem é esse jogador? Ele é o Hulk, o camisa sete, atacante da
seleção brasileira e do Zenit São Petersburgo. Como todos sabem, Hulk é
paraibano, de Campina Grande. A história dele é como a de qualquer outro
nordestino que precisa sair de casa, e de sua cidade, bem cedo em busca de
melhores condições de vida para si mesmo e para sua família.
A primeira vez que ouvi falar em Hulk ele jogava no Vitória da Bahia. Com
apenas 18 anos, foi para o Japão. Em 2008, se transferiu para o Porto de
Portugal. Na temporada 2010-11 ele foi o artilheiro do Campeonato Português com
36 gols. Hulk é um dos “obreiros” do Felipão. Com funções específicas na
seleção, ele não tem como aparecer mais e melhor. É que ninguém está autorizado
a brilhar mais do que Neymar Jr. Aliás, este é um que ainda precisa demonstrar
seu caráter fora de campo. No domingo, 15/06, a Seleção Brasileira se preparava
para viajar do Rio de Janeiro até Fortaleza onde jogaria com o México na
terça-feira. Hulk foi escalado para a entrevista coletiva. É que ele havia
abandonado o treino por sentir dores.
Hulk foi para a entrevista visivelmente preocupado, pois ainda não sabia a
extensão dos danos que terminaram por tirá-lo do 2º jogo. Aliás, a comissão
técnica bem que poderia ter poupado o jogador de enfrentar uma coletiva numa
situação daquelas. Tudo poderia ser resolvido com um comunicado oficial do
médico da seleção. Mas, é que existe o tal protocolo FIFA que toda a humanidade
parece ser obrigada a seguir. Na entrevista, foi aquele bombardeio de perguntas
sobre as condições físicas de Hulk. Ele ia administrando a situação, dando
respostas óbvias para perguntas irritantemente redundantes que só pessoas, que
nada sabem de futebol, insistem em fazer sobre futebol. Eis, então, que um
jornalista que quis ser diferente. Foi o primeiro erro dele.
O jornalista, que não foi identificado, perguntou a Hulk: “Qual é o diferencial do povo nordestino?
Porque ele é tido como engraçado, principalmente o cearense?”. Antes mesmo
que Hulk pudesse responder, o jornalista emendou o preconceito explícito. Disse
ele: “Eu pergunto por que é que o povo
nordestino é tão diferente, por que é tão engraçado? É o sotaque que faz ele
ser engraçado para o resto do país?”. Eu estava assistindo a entrevista ao
vivo e, confesso, fiquei furioso com a pergunta cretina. Mas, Hulk foi de uma
elegância a toda prova. Ele ficou visivelmente irritado, mas soube se
comportar. Fosse um Romário, um Rivaldo, ou mesmo o próprio Felipão, teria
saído no braço com o estulto jornalista que pensa que nosso sotaque é uma
piada.
Eu tinha uma discreta admiração por Hulk, mais pela personalidade que ele
apresenta em campo, do que propriamente pelo futebol dele na seleção. Mas, com
a resposta que ele deu ao tal jornalista, eu passei a admirá-lo bem mais. Ao
contrário do CR7, Hulk não tirou a faixa do braço. Ele foi direto ao ponto e
disse: “Eu não levo por esse lado. Até
porque nós não fazemos graça pra ninguém. O povo nordestino é diferente porque
a Seleção não joga sempre lá”. Eu vibrei com a resposta. Parecia que ele
estava fazendo um gol. Na verdade, ele fez, sim, um gol de placa, pois além de
todos os preconceitos que sofremos ainda temos que lidar com essa mania imbecil
de nos tratarem como os bobos da corte da nação brasileira.
Sabem por que o jornalista quis saber por que somos engraçados,
principalmente os cearenses? Primeiro, porque ele deve desconhecer que Chico
Anysio era cearense e que criou este filão do humorismo seguido por muita
gente. O jornalista acha nosso sotaque engraçado por puro bairrismo. Ele usou o
sotaque, mas poderia ter colocado qualquer outra coisa. O que importava era atirar mais uma vez o
preconceito que, infelizmente, muitos nordestinos contribuem para que
permaneça. Ajudaria bastante se nordestinos famosos não aceitassem o papel de
bobos da corte nos programas de televisão, por exemplo. Seria muito bom que
reafirmássemos que não fazemos graça, que não somos palhaços, para quem quer
que seja. Eu estou até pensando em fazer uma camisa com os seguintes dizeres:
“SOU NORDESTINO, MAS NÃO SOU ENGRAÇADO”.
AQUI É O
POLITICANDO, COM GILBERGUES SANTOS, PARA A CAMPINA FM.
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