Hoje eu vou falar da teoria do fio desencapado. Por essa teoria o
Brasil seria comparado a uma grande sala, onde de um lado haveria um vazamento
de água e do outro haveria vários fios de alta tensão desencapados. Nesta sala,
se encontrariam pessoas dispersas pelos lugares ainda não atingidos pela água.
Elas, claro, se manteriam afastadas dos fios desencapados. Por motivos que não
se sabe bem, essas pessoas nunca tentariam resolver os problemas existentes na
sala. Talvez a passividade possa ser explicada pelo medo. É que, em dois
momentos diferentes, duas pessoas morreram ao tentar, heroicamente, concertas
os fios desencapados e acabar com os vazamentos de água.
Mas, o fato é que as pessoas não tentavam acabar de vez com o
vazamento de água. Limitavam-se a tentar secar o chão com rodos, panos e vassouras.
Também, não queriam acabar com o
eminente perigo representado pelos fios desencapados. Vez por outra alguém
sugeria que se tentasse isolar os fios. Mas, vinha a inevitável pergunta: como
fazê-lo sem levar um choque? Havia um eletricista na sala, mas ele alegava que
estava sem ferramentas adequadas para realizar a tarefa. Ele sempre lembrava
que, devido aos vazamentos, estava com os pés encharcados.
Também havia na sala um encanador, mas este só aceitava consertar o
vazamento mediante pagamento. Havia um empreiteiro na sala. Ele se propôs recolher
contribuições dos presentes para que se pagasse o encanador. Mas, como ele
queria uma comissão de 30% do valor recolhido, os outros rejeitaram a proposta.
Havia, ainda, a possibilidade de abandonar a sala Brasil. Mas, a porta havia
sido trancada pelo lado de fora e a janela não abria, pois estava enferrujada.
Teve até um que se propôs a resolver todos os problemas, desde que os outros o
elegessem para isso. Durante algum tempo até se tentou resolver os problemas da
sala Brasil, mas eles eram tantos e tão complexos que as pessoas foram se
acomodando. Preferiram se especializar em criar formas para conviver com os
problemas, ao invés de tentar resolvê-los.
Essa sala chama-se Brasil por motivos óbvios. Fruto de nosso
passado escravocrata e do fato de termos sido colonizados preferimos encontrar
formas de conviver bem com os problemas ao invés de tentar resolvê-los em
definitivo. Ao invés de concertar o vazamento e embutir o fio, buscamos um
jeito criativo de conviver com os problemas. Inventamos o “jeitinho brasileiro”
- uma forma bem nossa de remedar aquilo que não sabemos como ou que não
queremos resolver.
Acostumamo-nos a esperar tudo do Estado que nos colonizou. Aliás, o
colonizado é aquele que não sabe ter iniciativa própria. Preferimos viver com a
corrupção ao invés de criar mecanismos de controle que impeçam que o Estado
continue sendo assalto. Ao invés de fazermos uma séria reforma política,
preferimos remendar nosso ordenamento jurídico com coisas sem sentido como a
tentativa de controlar a livre expressão do cidadão pela internet. Preferimos
fazer estradas de péssima qualidade para, anualmente, fazermos as tais
operações “tapa buracos". É que nós não queremos aprender como se fazem
boas rodovias para durar anos a fio. É que isso dá muito trabalho.
Preferimos gastar dinheiro
construindo presídios de segurança máxima ao invés de investirmos em educação,
saúde e moradia. Achamos que é mais fácil deixar o cidadão a mingua e depois
trancafia-lo num presidio quando ele se revoltar. Preferimos investir em
programas assistencialistas a promover uma política de crescimento com
desenvolvimento social. Nós ainda não entendemos o que vem a ser o Estado de
bem estar social. Preferimos o Estado que distribui migalhas.
Preferimos distribuir peixes, nunca ensinar a pescá-los. Um país
que baseia seu desenvolvimento numa economia de consumo diz muito do que é.
Preferimos esperar as águas virem, arrasarem as cidades, para fazermos algo que
é sempre um paliativo. Preferimos
deixar meliantes soltos em nossos estádios de futebol, promovendo a barbárie
que vimos ontem, para só então nos revoltarmos. Uma revolta que não leva a
nada, pois achamos que uma branda punição ao time de futebol resolverá tudo.
Não é a toa
que criamos aquele ditado que tão bem explica quem somos. Eu falo da história
de que o brasileiro só coloca a tranca na porta depois que o ladrão entra na
casa para lhe roubar seus bens. Enfim, preferimos ficar dentro desta sala
chamada Brasil cercados por vazamentos de água e fios desencapados com a
sensação de que a qualquer momento a água vai chegar aos fios causando um curto
circuito daqueles.
AQUI É O POLITICANDO, COM
GILBERGUES SANTOS, PARA A CAMPINA FM.
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