O voto nulo está
para as eleições assim como os anéis estam para Saturno. Eles estam lá, sabemos
que eles existem, mas ninguém sabe ao certo como eles são, quantos são e para
que servem. O voto nulo existe de fato, mas, afinal, para que é mesmo que ele
serve? Nas eleições municipais de 2012 recebi pedidos para explicar uma série
de questões sobre o voto nulo e o voto em branco. A tirar pela quantidade de
pedidos que recebi, desde o mês de março, as dúvidas e os mitos sobre esses
votos persistem. Propositadamente, deixei para abordar a questão na semana que
antecede a eleição do 1º turno. É que as pesquisas nos mostram que algo em
torno de 50% dos eleitores ainda não sabem em quem vão votar para deputado
estadual, federal e senador.
Longe de mim apontar caminhos para os indecisos, pois eu mesmo sigo
indeciso sobre não em quem votar, mas sobre o porque de votar. Com todas as
deficiências de nosso sistema eleitoral e representativo, poderia o voto nulo
ser uma opção para o eleitor? Já muito me perguntaram o que acontecerá se 50%,
ou mais, dos eleitores anularem o voto numa determinada eleição. Muitos
eleitores supõem que, se isto acontecer, a eleição tem que ser anulada e que um
novo pleito tem que ser convocado. Também se costuma supor que os candidatos
dessa eleição anulada não poderão concorrer em um novo pleito. Mas, a mãe de
todas as dúvidas é sobre as diferenças entre o voto em branco e o voto nulo.
Vamos começar pelo mais simples.
A diferença básica entre o voto em branco e o voto nulo é que se o voto em
branco significa que qualquer candidato serve, o voto nulo expressa que nenhum
candidato serve. O voto em branco não vai para nenhum candidato, mesmo que seja
válido. Inclusive, o voto em branco serve para compor o coeficiente eleitoral.
Já o voto nulo expressa o desejo do eleitor de que ninguém seja eleito. O voto
em branco caracteriza a passividade do eleitor. O voto nulo pode ser sinônimo
de rebeldia e de protesto. Eu acho oportuno fazer este tipo de coluna para
remar contra a maré. É que as redes sociais, principalmente o Facebook, estam
povoadas de mitos e lendas. Não é de hoje que campanhas, pretensamente
conscientizadoras, giram pela internet.
Vi um banner que me preocupou, pois seu objetivo parecia ser o da
deseducação política. Em cores bem vivas, ele trazia os seguintes dizeres: “Aprenda a votar nulo. Com 51% de votos
nulos outra eleição é convocada com outros candidatos”. O banner ainda
dizia que “os antigos candidatos seriam
proibidos de entrar no novo pleito”. O tal banner até ensinava o que o
eleitor deveria fazer para anular o voto quando estivesse bem em frente à urna
eletrônica. Como se diz nas redes sociais, isso é fake, ou seja, é falso.
Parece-me que quem produziu este banner priorizou o que gostaria que viesse a
acontecer, não o que está presente em nosso ordenamento jurídico.
É até compreensível que se ache que se mais de 50% dos eleitores anularem
o voto se obrigará a encerrar a eleição e a convocar um novo pleito. O problema
não é só de ignorância política, isso acontece por uma interpretação errônea da
legislação. No artigo 224 do código eleitoral, se diz que “se a nulidade atingir mais da metade dos votos do país nas eleições, o
tribunal marcará dia para nova eleição". Mas, uma interpretação do
TSE, confirmada pelo STF, pontuou a questão. Ficou claro que uma eleição só
pode ser invalidada se, e somente se, os votos forem anulados por meio
fraudulento. Se 30, 50 ou até 70 por cento dos eleitores anularem seus votos
não acontece rigorosamente nada.
O que sempre prevalecerá é a escolha dos que votaram em candidatos. O fato
é que anular quer dizer cancelar, eliminar, invalidar. Quando o eleitor anula
seu voto, está informando ao sistema eleitoral que está retirando sua opinião
da eleição. Ao anular o voto, o eleitor está dando espaço para que qualquer
tipo de candidato vença a eleição. Eu explico. Quanto mais votos nulos uma
eleição tiver, menos votos válidos serão necessários para que um candidato
atinja o coeficiente eleitoral e possa ser eleito. Por esse raciocínio é melhor
votar em um candidato ou legenda minimamente confiáveis para não facilitar a
vida de políticos com perfis questionáveis? Sim, é isso mesmo. De fato essa é
outra imperfeição do nosso sistema eleitoral. Dessa forma, tecnicamente
falando, o voto nulo não é muito diferente do voto em branco. Mas, e com tudo
isso, o voto nulo pode assumir uma postura ideológica e se tornar um mecanismo
institucional de protesto?
Os anarquistas votavam nulo por não reconhecerem a autoridade legitima nos
poderes constituídos. Eles votavam nulo para repudiar o Estado, suas leis e os governantes.
Certa ou errada, essa atitude revelava a outra face das democracias modernas. O
ato de não querer escolher e protestar demonstra que o ato de anular o voto é
sim um direito que o eleitor tem. Se 50% dos eleitores anularem seu voto não
acontece nada, mas não deixaria de ser algo digo de nota num sistema politico
tão frágil como o nosso. Imaginem se em uma cidade como Campina Grande metade
dos eleitores anulassem seu voto. Seriam 138.000 eleitores dizendo não ao
sistema eleitoral. Isso exporia as feridas de nossa sensível democracia. Quem
sabe se só assim, então, não teríamos uma verdadeira reforma política?
AQUI É O
POLITICANDO, COM GILBERGUES SANTOS, PARA A CAMPINA FM.
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